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Decreto coloca CAC sob responsabilidade da PF e reduz limite de armas por atirador

O presidente Lula lançou o Programa de Ação na Segurança, que objetiva o controle de armas e mudanças na legislação

FOTO: Marcelo Camargo/Agência Brasil
O presidente Lula lançou o Programa de Ação na Segurança, que objetiva o controle de armas e mudanças na legislação FOTO: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Raquel Lopes e Marianna Holanda/Folhapress

 

O presidente Lula (PT) assinou nesta sexta-feira (21) um decreto que cria mais restrições para o acesso a armas no país, revertendo a política de crescente flexibilização observada ao longo da gestão de Jair Bolsonaro (PL).

O decreto passa para a PF (Polícia Federal) a responsabilidade sobre a fiscalização dos chamados CACs (caçadores, atiradores e colecionadores). Até então, essa atribuição ficava com o Exército.

Como a Folha de S.Paulo antecipou, a mudança estava sendo estudada por membros do governo diante da leitura de que o Exército falhou na fiscalização de CACs e de que haveria mais controle na PF.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, afirmou que haverá um prazo de 180 dias para a migração progressiva de competências para a PF, mediante acordo de cooperação. A ideia é migrar para a PF todos os procedimentos referentes a CACs.

“Quando concluirmos a transição afirmo a todos e todas que vamos ampliar e muito a fiscalização de clubes de tiros e de CACs. Isso inclusive é uma determinação do TCU [Tribunal de Constas da União]. Infelizmente, existem os bons e os maus, como aconteceu com clubes de tiro. Existe muita atividade ilegal disfarçada”, disse o ministro.

O Exército chegou a publicar durante a semana em seu site um aviso informando que os CACs passariam a ser de responsabilidade da PF e que os serviços a partir dali estariam bloqueados. O texto foi excluído em seguida.

O anúncio antes da publicação do decreto gerou confusão e contestação de CACs. O Exército disse, em nota, “que o aviso a respeito do tema foi publicado de forma equivocada”. “Tão logo verificado o erro, a página foi retirada do ar”, disse o Exército.

Outra mudança é a significativa redução do limite de armas por pessoa. Sob Bolsonaro, um atirador podia ter até 60 unidades (sendo 30 classificadas como de uso restrito das forças de segurança e Forças Armadas). Agora, o número cai para 16 (sendo 4 de uso restrito).

Dino afirmou que vai haver também um programa de recompra de armas, que ainda precisa ser regulado neste ano com uma nova normativa. No entanto, antecipou que deve ter valores atrativos para incentivar a devolução por parte da população.

Além disso, o decreto traz medidas que criam dificuldades para quem decidir continuar com as armas, como o encurtamento do prazo de renovação de registro.

Até o momento, a pasta trabalha com a política de entrega voluntária. Dino, entretanto, não descarta que no futuro possa haver uma estratégia coercitiva a depender dos indicadores de violência.

A pessoa que já tenha um fuzil, mesmo que hoje não possa mais adquirir, como os atiradores de nível 1 e nível 2, poderá usar essa arma e terá que se adequar ao novo número de munições.

Pelo decreto, os CACs e o cidadão comum poderão ficar com as armas já adquiridas. Essa é uma sinalização para a bancada da bala, que tinha esse como um dos principais pleitos. Inclusive, antes de o decreto sair do Ministério da Justiça e Segurança Pública e ir para o Planalto, deputados foram chamados na pasta para serem informados sobre esse e outros pontos.

Outro acordo do governo com a bancada também antecipado pela Folha de S.Paulo foi de voltar ao número de armas que era antes do governo Bolsonaro. A intenção era não apertar nem liberar demais o quantitativo de armas aos CACs.

Na avaliação de Dino, esse é um decreto ponderado em que todos os atores envolvidos no tema foram ouvidos, reduzindo o número de armas, limitando a expansão de clubes de tiro e fortalecendo a fiscalização.

Segundo Dino, o decreto vai evitar que armas sejam desviadas do mercado legal para o ilegal. Na sua visão, o armamentismo irresponsável fortaleceu as facções criminosas no Brasil.

“Armas nas mãos certas, e não armas nas mãos das pessoas que perpetuam feminicídio. O senhor [Lula] está salvando a vida de milhares de mulheres brasileiras, de crianças, de adolescentes do Brasil”, disse Dino.

Bruno Langeani, gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, diz que o decreto definitivo melhora em muito a qualidade das regras de acesso à armas e munições no Brasil e fecha uma série de brechas criadas por Bolsonaro que estavam sendo exploradas pela criminalidade, sem impedir o acesso da arma para a defesa e outras atividades.

“É um grande passo a ser comemorado, mas que precisará ser acompanhado de maior capacidade de fiscalização destas categorias, em especial dos CACs. E da solução de problemas históricos, como a unificação de bancos de dados para consulta e rastreamento em investigações policiais”, destacou.

Roberto Uchôa, especialista do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, considerou as mudanças positivas, principalmente na restrição dos calibres 9 mm e .40. Quando o governo Bolsonaro tornou essas armas de uso permitido, a 9 mm se tornou a arma mais vendida ao cidadão comum e aos CACs.

“É muito positivo também que os CACs voltem a ser divididos em níveis, isso mostra que o governo não está perseguindo os CACs, quem pratica o esporte. O governo quer privilegiar e dar segurança para esse pessoal, impedindo que pessoas que se registrem como CACs somente em busca das armas, prejudicando o esporte”, disse.

O decreto faz parte de um pacote de segurança anunciado que inclui a criação de um plano para combate a crimes na Amazônia com R$ 2 bilhões de investimento.

Parte do plano é voltado à Amazônia, com recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP). De acordo com o texto, ele contemplará os nove estados da Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Roraima, Rondônia e Tocantins).

Os recursos serão para “o enfrentamento aos crimes na região, especialmente crimes ambientais e conexos”.

De acordo com o ministério, haverá ainda a implementação de 28 bases terrestres e seis fluviais para combater crimes ambientais e infrações correlatas, somando 34 novas bases integradas de segurança (PF, PRF e Forças Estaduais).

Há a previsão ainda da implementação de Companhia de Operações Ambientais da Força Nacional de Segurança Pública, com sede em Manaus, e a estruturação e aparelhamento do Centro de Cooperação Policial Internacional da PF, também na capital.