Cintia Magno
O convite chegou inesperado enquanto o estudante Luiz Felipe Gurjão Baía, 15 anos, vivia mais um dia comum em casa, no distrito de Mosqueiro, em Belém. Até aquele momento, o que o jovem aluno do primeiro ano do ensino médio menos imaginou é que aquele chamado para dar uma passada na escola o levaria a contribuir com a ciência mundial, na descoberta de mais um possível asteroide ainda desconhecido.
Ao lado dos colegas que, assim como ele, integram a equipe de estudantes da Escola Estadual Honorato Filgueiras que participam do projeto científico, Luiz abraçou a oportunidade nunca imaginada de se tornar um caçador de asteroides.
A enorme repercussão que a descoberta gerou nos veículos de comunicação e nas redes sociais desde o anúncio do feito, no último dia 03 de julho, ainda vem sendo assimilada pela equipe da escola Honorato Filgueiras, em Mosqueiro.
A repercussão não é à toa, não é todo mundo que pode dizer que participa, diretamente do interior do Brasil, de um projeto desenvolvido pela NASA. Intitulado ‘Caça Asteroides’, o programa é fruto de uma parceria entre o International Astronomical Search Collaboration (IASC/NASA Partner) e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI).
Mais do que a alegria por ter conseguido exercer a astronomia na prática e ainda identificar um asteroide inédito, Luiz Felipe destaca a sensação boa de levar o nome de Mosqueiro, distrito onde nasceu e cresceu, para o mundo.
“Não somos só nós, são várias pessoas no mundo inteiro participando desse projeto e de todas essas pessoas nós conseguimos, com muito esforço e dedicação, achar um asteroide”, considera. “Eu nasci aqui, cresci aqui, construí grandes amizades aqui em Mosqueiro e eu vejo que algumas pessoas não nos levam muito a sério por sermos do Pará, mas, para quem desacreditou de nós, estamos aqui agora”.
O ponto em que a equipe da escola Honorato Filgueiras se encontra agora foi possível depois que todos os seis alunos que integram o projeto passaram por um treinamento realizado, à distância, pelo MCTI. Foi ainda durante a primeira semana de análise dos pacotes de imagens enviados pela NASA que os estudantes perceberam os sinais de um possível novo asteroide.
“Eu estava analisando e vi um corpo se mexendo, se deslocando. Aí, juntamente com os meus colegas, nós analisamos e decidimos marcar e enviar o relatório. Tempos depois recebemos a notícia de que era um asteroide, realmente, e que ele estava nas preliminares do programa”, lembra Luiz Felipe que, por ter sido o estudante que identificou o possível asteroide, no futuro poderá ter a oportunidade de escolher o nome definitivo do novo corpo celeste. Por enquanto, o nome asteroide é identificado inicialmente como “LUI0005”.
Além do apoio da própria escola, dos colegas de equipe e do professor, outro incentivo foi fundamental para que o estudante embarcasse na missão de caçar asteroides, o de sua família. Mãe de Luiz Felipe, a atendente de loja Carla Patrícia Gurjão, 39 anos, nunca imaginou que o filho participaria de um projeto desse tipo ali mesmo, no distrito onde moram, mas não hesitou em apoiá-lo.
“Ele me falou que estava num grupo para fazer uma caça a asteroides e a gente deu muito apoio, com certeza. Daí depois ele me falou que tinha achado o asteroide e nem ele, nem a gente imaginava que seria toda essa repercussão”, lembra a mãe, orgulhosa. “Ele falava para mim ‘eu vou lhe dar muito orgulho’ e eu dizia que não, ‘vocês já são os meus orgulhos, mas eu sei que você vai me dar ainda mais’. É um orgulho muito grande para nós, pais”.
O sentimento de orgulho pelo trabalho desenvolvido em equipe também é experimentado pela estudante Paula Vitória, 16 anos, outra aluna que faz parte do projeto ‘Caça Asteroides’ na escola Honorato Filgueiras. Mais do que uma conquista para a equipe, Paula acredita que o feito é uma conquista do ensino público.
“Sou daqui, nasci em Mosqueiro e eu fico orgulhosa porque, hoje em dia, as pessoas não valorizam o ensino da escola pública e a gente está aqui para mostrar que, sim, o ensino de escola pública pode levar a gente a lugares grandiosos”, considera. “Eu comecei a ter interesse pela astronomia no ano passado e agora tenho mais afirmações de que, sim, eu me identifiquei com essa área”.
Também interessada pela área, a estudante Rakel Bentes, 15 anos, ainda tenta assimilar a repercussão conquistada com a pesquisa realizada por ela e seus colegas.
“Quando o professor chegou com esse projeto, a gente aceitou participar porque a gente já tinha participado de outros projetos dele nessa área de ciências antes. Então, fizemos o treinamento, começamos a analisar as imagens e quando a gente achou, foi uma surpresa enorme, a gente ficou muito feliz pela equipe, pelo professor que incentiva a gente sempre. É uma sensação muito boa levar o nome de Mosqueiro. A gente não esperava e, do nada, a gente já está com essa visibilidade tão alta para a escola e a escola também nos apoiando. É muito bom”.
Participação no programa é gratuita e aberta a escolas e astrônomos amadores
Para que possam participar do programa ‘Caça Asteroides’, realizado pela NASA em parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), as escolas, instituições, clubes de ciência e astrônomos amadores precisam ficar atento aos editais de abertura de inscrições disponibilizados pelo ministério. As inscrições são totalmente gratuitas.
Líder da equipe de caçadores de asteroides da Escola Estadual Honorato Filgueiras, o professor de química Hélio Nascimento explica que a inscrição da escola foi realizada em março deste ano e que a própria confirmação da participação no programa já foi uma grande conquista. “São apenas 3 mil vagas no Brasil inteiro e nós fizemos as nossas inscrições no mês de março e conseguimos no mês de maio a confirmação da nossa participação. A nossa campanha foi a campanha de número 16”.
O professor explica que durante o ano todo acontecem diversas campanhas, períodos de três semanas em que os alunos ficam dentro do laboratório fazendo as análises a partir de uma plataforma do IASC/NASA Partner, responsável por fornecer aos participantes do projeto as imagens captadas por um telescópio de 1.8 metros pertencente à Universidade do Havaí. A partir daí, as imagens devem ser analisadas pelos participantes, através do software Astrometrica, para que eles possam identificar e enviar os relatórios dos possíveis asteroides ou objetos próximos à Terra.
“Eu, como líder, só tenho a função de ensinar e incentivar. A caçada quem faz são os alunos, são eles que analisam os pacotes de imagem, são os alunos que fazem os relatórios”, explica o professor.
“Nós tivemos três semanas para fazer as observações, mas o interessante é que toda semana a gente envia um relatório e toda sexta-feira sai uma lista com possíveis achados de asteroides inéditos e, para a nossa alegria, na primeira semana de participação a gente conseguiu incluir o nome do aluno Luiz Felipe Gurjão Baía como um dos asteroides achados. O asteroide foi nomeado provisoriamente de ‘LUI0005’ e essa descoberta foi para análise do MCTI, já está no banco de dados da NASA, e a gente está aguardando agora um processo longo, que é o processo de verificação e ratificação, onde eles vão passar um bom período fazendo as análises desse material e, aí sim, o aluno vai ter a possibilidade de nomear esse asteroide novo. Ele poderá dar o nome dele, da família, da escola, do Mosqueiro, o aluno tem a possibilidade de nomear como ele quiser”.
Hélio aponta que o processo de verificação e ratificação, realizado pelo MCTI e pela NASA, dura de dois a cinco anos. Mesmo antes disso, a descoberta do asteroide pela equipe de alunos do primeiro ano do ensino médio já enche a escola de orgulho.
“Para a gente já é uma é um orgulho muito grande ter encontrado esse asteroide, ter participado do evento e para nós foi um teste porque não conhecíamos o programa, então, nos inscrevemos para tentar aprender sobre ele e acabamos, graças a Deus, nesse meio tempo, encontrando o asteroide e os alunos se sobressaindo”, considera. “Para muita gente é algo utópico, mas se a gente conseguir ter um planejamento, uma organização, a gente consegue se inscrever em projetos de ciência e tecnologia como esses, existem outros vários interessantíssimos também na área da astronomia. A gente pode fazer, sim, a escola pública trabalhar com projetos voltados a essa área. A gente pode trabalhar com inovação, a gente pode trabalhar com ciência, a gente pode trabalhar com tecnologia também na escola pública”.