Atualidades

Pesquisa realizada no Pará ganha prêmio internacional nos EUA

Pesquisa realizada no Pará ganha prêmio internacional nos EUA

Com o aval da UFPA e da USP, o estudo avaliou como dois métodos de prevenção à trombose e à embolia influenciam no edema e na perda sanguínea relacionados a uma cirurgia de grande porte no joelho. A pesquisa inédita recebeu em 2022, no Congresso Brasileiro de Ortopedia, em Florianópolis, o prêmio de Melhor Pesquisa Clínica da Ortopedia Brasileira.

Este ano, concorreu com pesquisas do mundo todo e conquistou o Prêmio Paolo Aglietti de Melhor Pesquisa Mundial sobre Artroplastia do Joelho, no Congresso Mundial de Cirurgia do Joelho, realizado em Boston, pela ISAKOS. O líder da pesquisa é o professor da Faculdade de Medicina da UFPA, Dr. João Alberto Maradei Pereira, que nos conta mais sobre este importante estudo na entrevista a seguir.

Por Iva Muniz

TODA – Qual o diferencial desta pesquisa para que tenha se destacado entre as demais?

DR. João A.M.P – Acredito que seja o fato de abordar algo muito frequente na ortopedia, que é a prevenção que precisamos fazer contra a trombose e a embolia, duas complicações sérias, que podem ocorrer em uma cirurgia ortopédica de grande porte. A pesquisa avaliou dois métodos de prevenção: a medicação com anticoagulante e a prevenção mecânica, que é o uso de uma meia pneumática de compressão sequencial sobre o inchaço da perna (edema) e a perda sanguínea. A pesquisa se destaca por abordar uma situação do dia a dia, e usou uma metodologia muito boa: um ensaio clínico randomizado, que é considerado a evidência científica de mais alta excelência.

TODA – Qual a importância dessa avaliação feita pela pesquisa?

DR. João A.M.P – A cirurgia, chamada de artroplastia total do joelho, é cada vez mais realizada no mundo todo, devido ao envelhecimento da população. Os problemas de desgaste das articulações, chamados de artrose, quando não resolvidos de forma não cirúrgica, acabam evoluindo para a necessidade de realizarmos essa cirurgia. E nela pode ocorrer o tromboembolismo, que é grave. Tanto a trombose venosa profunda (entupimento dos vasos da perna, que provoca o inchaço) como a embolia, que é ainda pior, porque um coágulo formado na perna migra para o pulmão, podendo levar à morte. É um quadro raro, mas como é uma cirurgia feita com frequência, um caso desse pode ocorrer.

TODA – E qual foi a conclusão da pesquisa?

DR. João A.M.P – Ela mostrou que o uso da meia resulta em menos inchaço da perna e menor perda sanguínea do paciente. Ou seja, em um grupo de pacientes em que se puder optar entre a medicação ou a meia, dizemos que a meia traz melhor resultado. Mas é importante ressaltar duas coisas. Primeiro que não são todos os pacientes que podemos utilizar somente a meia como forma de prevenção. Se ele tiver histórico de já ter tido trombose ou embolia, precisará tomar a medicação. Segundo, esta meia não é aquela de compressão graduada que se utiliza frequentemente para tratar varizes, é uma que se acopla a um aparelhinho portátil que a insufla em três câmaras de ar.

TODA – Quantos pacientes participaram do estudo?

DR. João A.M.P – Foram 150 pacientes que passaram por essa cirurgia no período de 2019 a 2021. Todos do SUS. A maior parte deles, entre 60 e 70 anos de idade e, com mais frequência, mulheres. Todos podiam tomar tanto a medicação de forma isolada ou usar a meia de forma isolada. Formamos dois grupos de pacientes bastante uniformes, todos operados pela mesma equipe no Hospital Maradei, e que apresentavam o mesmo quadro. Utilizamos os dois métodos citados. Do ponto de vista da metodologia científica, foi um trabalho muito bem elaborado e, por focar em um tema do dia a dia de ortopedistas de vários lugares do mundo, chamou atenção da comunidade científica internacional.

TODA – Qual o papel da UFPA e USP nessa pesquisa?

DR. João A.M.P – Para a pesquisa ser realizada, ela precisou ser avaliada por um comitê de ética, formado por diversos pesquisadores. Esse comitê analisa se a pesquisa trará algum risco para o paciente e se pode ser aprovada sob o ponto de vista ético. Ela foi aprovada tanto pelo comitê de ética do Hospital das Clínicas da USP, como pelo comitê de ética do Instituto de Ciências da Saúde da UFPA. Com esse convênio das duas universidades, a pesquisa foi viabilizada.

TODA – Como o senhor recebeu esse reconhecimento?

DR. João A.M.P – Ele me encheu de orgulho e me deixou muito feliz. A pesquisa foi considerada a melhor no congresso mundial que é o mais importante da nossa especialidade de cirurgia no joelho. E concorreu com trabalhos muito bem feitos de instituições renomadas do mundo inteiro. E a nossa foi realizada totalmente no Pará, com pacientes do SUS. E receber esse prêmio mostra que o trabalho feito em nosso Estado é de muito valor, que merece destaque tanto por ser cientificamente bem feito, como por evidenciar que o SUS também oferece tratamento com alto nível de excelência.

TODA – Então, o SUS também se destaca nesse estudo?

DR. João A.M.P – Sim. Muitas vezes ouvimos somente sobre as falhas e deficiências do SUS. Claro que ele precisa ser melhorado. O subfinanciamento é um problema. Mas existe um SUS bem trabalhado, que oferece um serviço de excelência a muitos pacientes. E o reconhecimento dessa pesquisa, ao meu ver, também é a valorização do SUS. E a gente precisa apoiá-lo, e não apenas quando o assunto é vacina. O SUS vai além das vacinas. É assistência diária à população. E é possível prestar um serviço de qualidade para todos por meio dele. Se você tem um filho acostumado a tirar 9, 10 e, um dia, ele tira 5, você vai querer saber o que aconteceu, porque sabe que pode ser diferente. Da mesma forma, se a população passar a acreditar que o SUS pode ser muito bom, com certeza ele vai melhorar. Porque a sociedade, em geral, não se contentará mais com serviços de má qualidade, passará a cobrar mais, exigir qualidade. E, com a cobrança da população, o sistema melhora. Isso é fato.