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Governo Lula publica reparação pela homenagem de Bolsonaro a torturador

O repressor, Sebastião Curió Rodrigues de Moura, conhecido como Major Curió, confessou em biografia publicada pouco antes de sua morte, que torturou e executou pelo menos 41 jovens
O repressor, Sebastião Curió Rodrigues de Moura, conhecido como Major Curió, confessou em biografia publicada pouco antes de sua morte, que torturou e executou pelo menos 41 jovens

Luiza  Mello

Uma reparação histórica às famílias dos integrantes da Guerrilha do Araguaia, que foram vítimas de uma das ações mais cruéis exercidas pelo regime militar, instaurado em 1964 com o golpe de 31 de março. Entre 1967 e 1974, um grupo de jovens estudantes universitários, vinculados ao PC do B, na época Partido Comunista do Brasil, deram início a uma ação revolucionária às margens do Rio Araguaia, no Sudoeste do Pará.

O repressor, Sebastião Curió Rodrigues de Moura, conhecido como Major Curió, confessou em biografia publicada pouco antes de sua morte, que torturou e executou pelo menos 41 desses jovens guerrilheiros, que já estavam presos e, portanto, sem direito à defesa. Em postagem, o ex-presidente Jair Bolsonaro considerou o assassino confesso um “herói do Brasil”.

Ontem, atendendo a decisão da 8ª Vara Cível Federal de São Paulo, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República publicou em todas as suas contas oficiais nas redes sociais, direito de resposta de familiares das vítimas. “É com satisfação que fazemos esta reparação histórica”, publicou a Secom em nota distribuída à imprensa.

Os fatos que antecederam a decisão da 8ª Vara Cível Federal de São Paulo aconteceram em 4 de maio de 2020, quando o então presidente recebeu Curió em audiência formal no Palácio do Planalto. No dia seguinte, as publicações nas redes oficiais do governo brasileiro tratavam o major como herói.

Logo após a publicação, familiares das vítimas do Major Curió entraram com uma contra a União e contra o Sebastião Rodrigues Moura, exigindo na Justiça o direito de resposta.

“A gestão Bolsonaro recorreu e protelou, em vão, ao cumprimento da justa decisão. O Brasil, na celebração de eleições democráticas, escolheu retornar ao respeito às instituições, ao cumprimento da lei e à construção de um país mais justo para todos os brasileiros. Agora, 2023, é tempo de justiça e reparação”, informa a nota da Secom.

“O Governo Federal tem total concordância com a ordem judicial que determinou o restabelecimento da verdade e dignidade das vítimas ao determinar a publicação do desagravo”, texto reproduzido na sequência: “O governo brasileiro, na atuação contra a guerrilha do Araguaia, violou os Direitos Humanos, praticou torturas e homicídios, sendo condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por tais fatos. Um dos participantes destas violações foi o Major Curió e, portanto, nunca poderá ser chamado de herói. A Secom retifica a divulgação ilegal que fez sobre o tema, em respeito ao direito à verdade e à memória”.

Para a Comunicação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de desinformar sobre eventos históricos de amplo conhecimento e “tratar como honroso o momento mais repulsivo da história recente do país, a postagem que motivou ação judicial, realizada na gestão de Jair Bolsonaro, tratava como ‘herói do Brasil’ o homem que ordenou a prisão, tortura e execução de cidadãos brasileiros que defendiam a democracia durante o regime militar, em especial os que atuaram na guerrilha do Araguaia, na região de Tocantins, Pará e Maranhão. Não é herói. Nada justifica a tortura, a mais covarde das violências”, ressaltou a nota.

Curió, que passou para a reserva como coronel do Exército, foi denunciado pelo Ministério Público Federal por crimes de homicídio e de ocultação de cadáveres cometidos durante o combate à guerrilha no sudoeste do Pará. Em 2009, ao jornal “O Estado de S. Paulo”, Curió afirmou que o Exército executou 41 pessoas na região do Rio Araguaia.

Segundo o Ministério Público, Curió e os militares subordinados a ele chegaram a matar pessoas que já estavam rendidas e, portanto, sem oferecer resistência. A estimativa é que Curió e seus comandados tenham executado pelo menos 67 pessoas na região.

“[Os crimes] foram comprovadamente cometidos no contexto de um ataque sistemático e generalizado contra a população civil brasileira, promovido com o objetivo de assegurar a manutenção do poder usurpado em 1964, por meio da violência”, afirma o Ministério Público Federal.

Ainda durante o regime militar, em 1980, Curió foi designado para ser interventor do garimpo de Serra Pelada. Em 1982 foi eleito deputado federal pelo Pará. Em 2000, foi eleito prefeito de Curionópolis, município criado a partir do desdobramento de Marabá e que abrigou grande parte dos garimpeiros da região. Sebastião Curió morreu aos 87 anos, em 17 de agosto do ano passado.