JOSÉ MARQUES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria nesta terça-feira (6) para rejeitar uma denúncia que a corte já havia aceitado contra o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
Apesar de ser incomum o Supremo rejeitar uma denúncia já aceita, o tribunal também fez isso em 2021 em outro caso que envolvia Lira, o do chamado “Quadrilhão do PP”.
Votaram desta forma os ministros André Mendonça, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes –que modificou o seu voto anterior– e Luiz Fux.
A ação que o Supremo julgou nesta terça era uma das principais pendências judiciais de Lira, que havia completado mais de dois anos e meio de tramitação paralisada após pedido de vista (mais tempo para análise) do ministro Dias Toffoli.
O Supremo já tinha maioria contra Lira, mas os ministros atenderam permitiram que André Mendonça apresentasse um novo voto em substituição ao do seu antecessor, o ministro aposentado Marco Aurélio Mello, o que beneficiou o presidente da Câmara.
O argumento da corte é que mudanças legislativas influenciam na ação contra o presidente da Câmara e que a própria PGR (Procuradoria-Geral da República) desistiu da denúncia. Por isso, Mendonça poderia votar no caso.
Lira foi acusado de corrupção pela PGR (Procuradoria-Geral da República), após um ex-assessor ter sido flagrado transportando R$ 106,4 mil em dinheiro vivo, recebeu aval do Supremo em 2019, mas o processo pouco andou desde então.
O caso é oriundo da Operação Lava Jato e voltou à corte suprema em meio a uma crise entre o presidente da Câmara e o Palácio do Planalto.
A denúncia contra Lira foi aceita pelos ministros do STF em 2019, mas a defesa apresentou um recurso contra a medida chamado de embargos declaratórios. Houve maioria em 2020 para a rejeição desses embargos, mas Toffoli, então, fez o pedido de vista antes do encerramento formal dessa fase.
Em abril passado, a PGR, já sob o comando de Augusto Aras, voltou atrás e pediu ao STF a rejeição da denúncia que ela mesma havia apresentado contra o presidente da Câmara.
A vice-procuradora geral da República Lindôra Araújo pediu a retirada da denúncia citando a ausência de justa causa, com ressalva em hipótese de surgimento de novas provas.
Lindôra citou como argumento a nova legislação do pacote anticrime, sancionada em 2019, e o novo entendimento do STF sobre a insuficiência, para sustentar a abertura de ação penal, de depoimentos de delatores os quais não estejam acompanhados de elementos de comprovação.
A defesa do deputado Arthur Lira também afirmou ao Supremo que a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral tinha por base apenas a palavra de um delator e apresentava inconsistências e fragilidades demonstradas ao tribunal.
“Após o recebimento da denúncia, a lei foi alterada, e o processo não pode mais ser aberto com base apenas na narrativa do delator. Esse é um dos fundamentos do recurso apresentado”, disse o advogado Pierpaolo Bottini, que defende o presidente da Câmara.
A lei citada é o chamado pacote anticrime, sancionado no fim de 2019.
Já haviam votado contra o recurso de Lira os ministros Marco Aurélio Mello (aposentado), Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes. Mas o voto de Mendonça, em substituição do de Marco Aurélio, e o de Alexandre de Moraes modificaram o placar.
Na denúncia contra Lira, a então procuradora-geral da República Raquel Dodge pediu a condenação de Lira por corrupção passiva, delito com pena prevista de até 12 anos de prisão. A peça também incluía o crime de lavagem de dinheiro, mas os ministros tinham rejeitaram esse enquadramento.
A apreensão do dinheiro com o então assessor parlamentar Jaymerson Gomes de Amorim ocorreu em fevereiro de 2012, quando ele tentou embarcar em um voo no Aeroporto de Congonhas transportando a quantia nas roupas e junto ao corpo.
A passagem aérea tinha sido comprada com o cartão de crédito de Lira e, de acordo com a investigação, os dois trocaram mensagens e telefonemas no dia do episódio.
A Procuradoria-Geral concluiu que o dinheiro transportado pelo assessor consistia em um pagamento feito a Lira por Francisco Colombo, então presidente da estatal CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos), para se manter no cargo.
À época, a companhia integrava a hierarquia do Ministério das Cidades, comandado pelo PP no governo Dilma Rousseff (PT).
O Ministério Público usa na acusação, entre outros indícios, depoimentos de delação do doleiro Alberto Youssef, pivô da Operação Lava Jato, para estabelecer o elo do dirigente da CBTU com Lira. Francisco Colombo morreu em 2014.
Um dos elementos da acusação são registros de dezenas de visitas do então presidente da estatal ao escritório de Youssef em São Paulo. Lira também frequentava a sede das empresas do doleiro.
A denúncia também afirma que há registro de chamadas frequentes entre o deputado e o então dirigente da CBTU na época da apreensão do dinheiro.
O Ministério Público diz ainda que o assessor, ao ser flagrado, “titubeou e não apresentou justa causa para a expressiva quantidade de dinheiro” que levava. Ele retornaria a Brasília em voo menos de duas horas depois da chegada a São Paulo.
De acordo com a denúncia, o então funcionário da Câmara deu explicações contraditórias, primeiro dizendo desconhecer Lira e a compra por meio do cartão de crédito e posteriormente afirmando que adquiriu as passagens sem o conhecimento do deputado.