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Macron encontra Raoni após derrotas de indígenas no Brasil

O encontro com Raoni aconteceu no Palácio do Eliseu, sede do governo francês em Paris, apenas alguns dias após duas derrotas terem sido impostas ao movimento indígena e ambientalista pelo Congresso brasileiro, sob forte pressão da bancada ruralista.
O encontro com Raoni aconteceu no Palácio do Eliseu, sede do governo francês em Paris, apenas alguns dias após duas derrotas terem sido impostas ao movimento indígena e ambientalista pelo Congresso brasileiro, sob forte pressão da bancada ruralista.

FERNANDA MENA

TOULOUSE, FRANÇA (FOLHAPRESS) – “Estamos atentos ao que nos diz cacique Raoni há 18 dias da Cúpula de Paris para um Novo Pacto Financeiro Global de que o mundo precisa”, escreveu numa rede social o presidente da França, Emmanuel Macron, após encontro neste domingo (4) com o cacique Raoni Metuktire, ícone da luta por direitos dos povos indígenas brasileiros.

A Cúpula de Paris para um Novo Pacto Financeiro Global, proposta por Macron, acontece no final de junho na capital francesa e vai discutir modelos de financiamento contra a pobreza e para a proteção da natureza como formas de mitigar ou reverter as mudanças climáticas.

Raoni representou a população indígena do Brasil na cerimônia de posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quando subiu a rampa do Palácio do Planalto ao lado do líder eleito para lhe passar a faixa presidencial.

“Preservar as florestas tropicais, garantir o respeito aos direitos dos povos indígenas, esse é o trabalho da sua vida, sua luta pela humanidade”, tuitou Macron após a reunião com a liderança brasileira.

O encontro com Raoni aconteceu no Palácio do Eliseu, sede do governo francês em Paris, apenas alguns dias após duas derrotas terem sido impostas ao movimento indígena e ambientalista pelo Congresso brasileiro, sob forte pressão da bancada ruralista.

As medidas podem comprometer ainda mais o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, que o presidente Lula prometeu concluir ainda em 2023, mas que vive uma série de impasses, como condicionantes ambientais requeridas pelos europeus.

Na semana passada, a Câmara e Senado aprovaram a medida provisória da Esplanada dos Ministérios, que esvaziou o Ministério dos Povos Indígenas, liderado por Sonia Guajajara (PSOL), e o Ministério do Meio Ambiente e da Mudança do Clima, comandado por Marina Silva (Rede).

A MP retirou do recém-nascido ministério dedicado aos povos originários a prerrogativa de demarcação de terras indígenas, que passou para o âmbito do Ministério da Justiça.

Depois, na mesma semana, a Câmara dos Deputados aprovou o PL 490, projeto de lei que instituiu o marco temporal para as demarcações de terras indígenas. O projeto foi eleito como prioridade pela bancada ruralista no Congresso Nacional e determina que as terras indígenas devem se restringir às áreas ocupadas pelos povos na data da promulgação da Constituição Federal de 1988.

A tese é ponto central da luta dos movimentos indígenas, que argumentam que, de acordo com a Constituição, esses povos têm direito a seus territórios originais sem os limites de uma data determinada.

As medidas incendiaram os ânimos de ambientalistas, antes apaziguados pelos compromissos assumidos por Lula com a proteção do meio ambiente e dos povos indígenas.

“O cacique Raoni tem muita consciência do que não é bom para a nossa gente, e sabe que o marco temporal é genocídio indígena e desrespeito total à nossa história”, afirma Watatakalu Yawalapiti, que integra a comitiva do cacique.

“Sim, nós fizemos o L e não estamos arrependidos de termos feito campanha para o Lula”, diz a liderança feminina da Associação Terra Indígena Xingu que é cofundadora da Articulação Nacional de Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga).

“Sabíamos que a luta não pararia porque Lula ganhou, e que o Congresso ainda estaria dominado por ruralistas, que sempre defenderam leis contra os povos indígenas.”
Watatakalu conta que a comitiva indígena passou por Portugal, Alemanha, Suíça, Bélgica e França e que cancelou a segunda parte de sua turnê, na Austrália, por causa da aprovação do PL 490. “Vamos voltar para o Brasil por causa disso”, conta.

“A gente está conversando com empresas e com governos que compram os produtos do Brasil. A gente está falando que o Brasil desmata, contamina e mata os povos indígenas em nome da produção que é vendida para eles e que, portanto, eles é que terão de dar limites a essa produção”, explica.

Para Watatakalu, “a gente precisa mexer no bolso dos ruralistas”. “E eles precisam entender que [seus negócios] dependem de outros países e que esses outros países precisam da floresta para manter o ar que respiramos”, avalia ela.

“Vamos falar sobre isso com Macron. Queremos apoios concretos. Negociações de comércio precisam mudar e ter regras. A influência dos europeus conta muito no nosso país.”
O presidente francês já havia se reunido com Raoni em maio de 2019, quando o convidou para participar da reunião do G7, sob presidência da França, em Biarritz, em agosto do mesmo ano.

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.