Pará

Violência nas escolas: o que fazer para mudar esse quadro?

Denúncias sobre ameaças de ataques podem ser feitas ao canal Escola Segura, criado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foto: Bruno Santos/Folhapress
Denúncias sobre ameaças de ataques podem ser feitas ao canal Escola Segura, criado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foto: Bruno Santos/Folhapress

Luiz Flávio

O crescimento de atentados nas escolas brasileiras verificado nos últimos anos e que resultou na morte de alunos e professores, exige um complexo trabalho envolvendo vários atores como forma de prevenir esse tipo de ocorrência, que choca pela brutalidade e violência.

O primeiro passo é o monitoramento constante do ambiente cibernético, onde está enraizado o discurso de ódio. O segundo – e não menos importante – é a criação de políticas públicas para controlar a circulação de armas que foi incentivada nos 4 anos da gestão de Jair Bolsonaro.

Aliado a isso, também se faz necessário criar mecanismos para combater o discurso misógino e preconceituoso que permeia o cotidiano de muitos jovens brasileiros. São ações fundamentais, segundo especialistas, para que a segurança pública consiga combater e frear essas ocorrências.

O tema veio à tona novamente essa semana com dois casos de repercussão nacional e local. O primeiro ocorreu na última segunda-feira (27), quando um adolescente de 13 anos esfaqueou 4 professoras e um aluno dentro da Escola Estadual Thomazia Montoro, na Vila Sônia, na zona oeste de São Paulo. A professora Elisabeth Tenreiro, de 71 anos, foi esfaqueada pelas costas e não resistiu.

O adolescente que praticou o crime é aluno do 8º ano do Ensino Fundamental na escola e anunciou o ataque em um post em rede social, onde escreveu ter aguardado pelo momento a “vida inteira” e que esperava matar pelo menos uma pessoa. O alvo principal do autor do ataque era um estudante com quem teria brigado na semana passada, mas esse colega não estava no local. A professora Elisabeth teria sido uma das pessoas que agiram para separar os estudantes durante o conflito.

O segundo caso ocorreu na Região Metropolitana de Belém na tarde da última quinta-feira, quando um aluno também foi esfaqueado por outro de 17 anos dentro da sala de aula da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professora Palmira Gabriel, localizado na avenida Augusto Montenegro, bairro do Tenoné.

Um aluno foi esfaqueado por outro de 17 anos dentro da sala de aula da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professora Palmira Gabriel. Foto: Ricardo Amanajás / Diario do Pará

 

Segundo uma testemunha, a vítima teria jogado bolas de papel em um colega de classe, que revidou deferindo-lhe três facadas. Policiais Militares apreenderam a mochila do suspeito com duas facas e uma machadinha. A vítima foi levada para um hospital, com facadas no rosto, mão e abdômen. O esfaqueador foi encaminhado para a Divisão de Atendimento ao Adolescente (Data), da Polícia Civil.

QUESTÕES

Júlia Neves de Albuquerque Maranhão, psicóloga especialista no atendimento a crianças e adolescentes, observa que o Brasil vem registrando um aumento de situações ligadas a saúde mental entre os adolescentes e jovens, envolvendo questões socioemocionais e um enfraquecimento do laço social ocasionado pelo aumento das relações mediadas pela esfera virtual.

“Somado a isso temos um maior compartilhamento e acessos a informações nas redes sociais, em fórum privados ou até mesmo na deep web. Todos esses fatores, juntos, podem possibilitar e até aumentar essas ocorrências de eventos violentos dentro das escolas”, explica.

Ela diz que o adolescente emite sinais quando está precisando de ajuda, entre os quais o aumento do isolamento social, excessiva busca pelos eletrônicos, irritabilidade, discurso com linguagem violenta, mudança brusca de comportamento.

“Relatos sobre bullying são sinais que acendem um alerta e precisam de atenção, tanto dos pais como da escola. Claro que não é qualquer alteração, nesse sentido que aponta que o adolescente será responsável por ataques violentos, mas já sinalizam que esse adolescente pode estar precisando de ajuda”, coloca.

 

Presença da família é fundamental para prevenção

É fundamental manter o diálogo com esse adolescente, dando possibilidade de fala e de se expressar, seja na escola, na relação com os pais e na comunidade em geral. “Na construção dessa relação com o adolescente, esses sinais de alerta ficam mais evidentes. Porém, vale ressaltar, que essas falas precisam ser validadas e levadas a sério, não podemos achar que é ‘besteira’. Relatos de bullying, machistas, racistas, LGBTfóbicos, e principalmente que remetem a atentados já ocorridos anteriormente são sinais de alerta e precisam de atenção especializada”.

Para enfrentar esse cenário, aponta a psicóloga, é necessária a junção de forças, envolvendo vários atores: família, escola, comunidade e políticas públicas que possibilitem acesso a atendimento especializado no serviço de saúde, formação dos professores, psicólogos presentes nas escolas, investimento na educação e outras ferramentas que diminuam as disparidades sócio emocionais.

Júlia ressalta a importância da presença efetiva da família – principalmente dos pais – na vida do adolescente, não só no monitoramento das redes sociais, que é importante, mas não é tudo. “Existem fóruns virtuais privados que podem passar desapercebidos. O mais relevante seria a construção de uma relação baseada no diálogo, onde esses cenários possam ser discutidos, colocados pelos adolescentes e os sinais percebidos pelos pais”.

A especialista defende que decretos que facilitem a aquisição e porte de armas e discursos relacionados a violência ou que facilitem a violência, como machismo, racismo, LGBTfobia, “podem contribuir para esse cenário que estamos vivendo, pois podem instigar um discurso de superioridade que muitas vezes levam a comportamentos violentos”

Ataques e massacres em escolas não seguem uma lógica da criminalidade comum de fato, mas os responsáveis por esses espaços podem observar sinais claros que são expressos pelos jovens e adolescentes. “A utilização de ações de inteligência policial podem ser mais uma ferramenta para contribuir na prevenção, porém não é a única ferramenta de prevenção. Precisamos de ações conjuntas”, completa.

 

Estado toma série de medidas de segurança

Na última sexta-feira as secretarias de Estado de Educação (Seduc) e Segurança Pública (Segup) anunciaram uma série de medidas para garantir a segurança na rede de ensino estadual. Entre as medidas está o aumento do efetivo da Companhia Independente de Policiamento Escolar (Cipoe), e da companhia em batalhão.

Também será implementado o videomonitoramento nas unidades educacionais; contratação de mais psicólogos e assistentes sociais e a criação de um botão de emergência para diretores de escola, além de um sistema onde a inteligência da Segurança Pública terá acesso ao histórico de toda a vida escolar dos alunos.

Seduc e Segup firmarão um termo de cooperação para a elaboração de um plano piloto a ser implantado em 10 escolas do estado para ouvir as comunidades e forças de segurança com a finalidade pedagógica. Haverá ainda a criação de um gabinete de segurança dentro da Seduc e da criação do botão “Alerta Pará da Educação”, a exemplo do Alerta Pará que serve para mulheres que possuem medidas restritivas e que podem acionar a polícia via aplicativo quando em situação de agressão iminente.

O governador Helder Barbalho (MDB) deve enviar para a Assembleia Legislativa (Alepa) nos próximos dias um projeto de lei para autorizar a reconvocação de PMs que estão na reserva para atuar no Cipoe, mas antes passando por um treinamento específico, e ainda outro projeto para transformar a Companhia Independente em um batalhão, o que vai dar mais robustez à entidade policial.

A Seduc fará ainda a organização de normas em relação a regimento escolar, abrangendo revisão de protocolos de segurança, melhoraria da convivência nas escolas, combate a bullying, além da elaboração de manual de procedimentos de segurança para ser publicado em 40, 50 dias; além de parceria com grêmios estudantis.