Em 1987, Clive Barker já era um escritor consagrado entre os fãs do terror, por trazer tramas densas, cheias de gore e body horror, explorando os limites do corpo de maneira visceral. Naquele ano, ele decidiu ir para trás das câmeras e adaptar para o cinema uma de suas obras mais conhecidas: “Hellraiser”, sobre um grupo de demônios interdimensionais, os cenobitas, que perseguem quem ambiciona a vida eterna, com dor e torturas inimagináveis. Trata-se de uma história com alegorias fortes sobre a luxúria, ganância e a morte, carregada de tons sadomasoquistas.
Rapidamente, o filme se tornou cultuado durante o boom dos VHS e a popularização dos videocassetes, com os cartazes chamando a atenção para o principal cenobita: Pinhead, que acabou entrando para o panteão dos grandes vilões da cultura pop e do gênero horror. Em suma, é um trabalho bem dirigido e apelativo de Barker, que se apoia na equipe de maquiagem e de efeitos especiais para criar mortes brutais e as criaturas, que nascem das torturas do inferno do filme, cheio de calabouços sujos, correntes e roupas de couro.
O trabalho acabou se tornando uma franquia caça-níquel, onde nenhum dos seis filmes (sim!), chegou nem perto da competência e importância do primeiro. Eis que, ano passado, o canal Hulu decidiu fazer uma refilmagem, atualizando a história, repaginando os cenobitas (Pinhead agora é uma figura andrógina, vivida pela atriz Jamie Clayton), e dando a direção a David Bruckner. Salta aos olhos, de primeira, o design primoroso das criaturas. Sem CGIs (pelo menos nessa parte), a maquiagem merecia maior reconhecimento nas premiações, sendo uma pena que o cinema de horror sofra tanto preconceito da indústria.
Investindo em espaços abertos e uma fotografia mais clara, a releitura de Bruckner abre mão da atmosfera claustrofóbica do original, usando algumas poucas cenas em corredores escuros e calabouços, dando um tom mais mítico, digamos, ao círculo infernal. A trama também é atualizada. Agora, temos uma jovem drogada que acidentalmente condena o irmão ao inferno e decide tentar salvá-lo desvendando a “Caixa de Lemarchand”, que guarda os portões para o inferno. Mas não esperem muito do elenco quase desconhecido…
Ignorando os diálogos risíveis e uma construção narrativa bem inferior ao original, vale a experiência, como disse, pela composição dos cenobitas, a trilha sonora climática e a direção de Bruckner, que não compromete e consegue estabelecer o possível início de uma nova franquia de maneira competente. O primeiro “Hellraiser” está disponível no Prime Vídeo. O atual, para aluguel nas plataformas digitais. Para quem não se choca fácil com filmes difíceis, valem as dicas.