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DIA DA MULHER: Lília Melo, do Cine TF, e outras artistas destacam mulheres inspiradoras

Para educadora Lília Melo, maior referência é mesmo a mãe, Raimunda Barbosa, também professora. FOTO: ACERVO PESSOAL
Para educadora Lília Melo, maior referência é mesmo a mãe, Raimunda Barbosa, também professora. FOTO: ACERVO PESSOAL

 

Jornadas de vidas reais inspiram personalidades femininas paraenses neste Dia Internacional da Mulher. Elza Soares, Conceição Evaristo, Carolina Maria de Jesus e nomes da filosofia, como Lélia Gonzalez e Bell Hooks, são grandes referências femininas para o mundo todo. Existem ainda, aquelas mulheres que, a partir de suas experiências de vida e histórias de superação, protagonizaram importantes espaços para outras mulheres.

Reconhecida por suas iniciativas na educação, a professora paraense Lília Melo recebeu diversos prêmios, como o de Melhor Professora do Brasil (2018), conferido pelo Ministério da Educação (MEC), e foi reconhecida como uma das 50 melhores educadoras do mundo pelo Global Teacher Prize 2020, considerado o Prêmio Nobel da Educação, concedido a cada ano pela Fundação Varkey, que trabalha pela melhoria da educação para crianças em situação de vulnerabilidade.

Dentre os projetos idealizados pela educadora, se destaca o Cineclube TF, pelo qual a linguagem audiovisual é utilizada como principal forma de ecoar a realidade do bairro da Terra Firme, em Belém. Em sua vida, Lília considera uma lista de mulheres influentes, desde a própria irmã, Lana Melo, mestra em educação, até nomes consagrados no mundo, como o da pensagora Angela Davis.

Dessa lista, no entanto, Lília Melo, diz que sua maior referência feminina é a própria mãe, a educadora aposentada Raimunda Barbosa. “A minha mãe é o grande exemplo de que investimento em conhecimento escolarizado acompanhado à leitura de mundo, à expertise do dia a dia, faz com que sejamos um indivíduo completo, potencialmente transformador. Ela me repassou todos os ensinamentos que pode, dentro das linguagens e leituras que alcançou, uma linguagem própria da Raimunda, que nem sempre teve tanto carinho, mas que essencialmente sempre foi com muito afeto, com a compreensão do jeito dela do que é amar”, afirma a professora.

Raimunda Barbosa, segundo a filha, renunciou à própria vida para abrir caminhos para as duas filhas, Lília e Lana Melo. “Ela é e sempre será um grande exemplo de educação e de mulher, de transformação, de comprometimento social. Eu não conheço uma pessoa mais ética do que a minha mãe, ela é capaz de abdicar de coisas que quer para proporcionar para o outro. E da concepção que ela teve, ela sempre foi uma grande feminista, em sua essência e conduta. Essa mulher é minha grande inspiração. Ela, que aniversaria na véspera do Dia Internacional da Mulher, é a minha maior referência de mulher e eu a amo”, declara-se a filha.

 

Priscila Duque evoca força de Conceição Evaristo e Elza Soares

Das margens do rio Tocantins, saíram duas grandes inspirações femininas para a produtora cultural, jornalista e vocalista do grupo de carimbó Cobra Venenosa, Priscila Duque – sua avó e a própria mãe. “Ribeirinha cametaense, extrativista, amassadeira de açaí. A minha avó é uma mulher que me inspira por trazer esse imaginário amazônico, que eu trago de família e por tê-la na maior parte da minha vida como uma mãe. Outra mulher forte é a minha mãe, uma mulher simples, mas que tem uma sabedoria absurda, uma sensibilidade para viver e enfrentar as adversidades”, conta.

Na arte, outra grande mulher, a cantora Elza Soares foi quem serviu-lhe de guia. “Elza Soares foi uma grande inspiração. Quando comecei a brincar de tocar, declamar e cantar, foi o período que eu ouvia muito Elza Soares, mulher do fim do mundo. Lembro-me bem de engasgar e chorar, cantando Elza Soares, ‘me deixem cantar até o fim, eu vou cantar’. Ela coloca que a voz dela era para dizer o que não diziam, para levar a luta das mulheres negras, nós, que estamos na base da sociedade. Elza Soares foi muita força para mim”, destaca a artista.

Outra grande referência para ela é a escritora Conceição Evaristo e sua contribuição na literatura com as “escrevivências”. “Artisticamente, eu nunca me encontrei enquanto escritora e poeta em nenhuma estética pré-estabelecida. Não escrevia com rima, não conseguia associar a minha escrita à determinada escola literária. Mas, nos últimos anos, foi um tempo que a poesia chamada ‘slam’, uma poesia de resistência, ganhou mais espaço. Ainda assim, eu estava no carimbó, então, não podia me dizer em um lugar desse tipo de poesia, apesar dos temas serem próximos”, explica.

Ao vivenciar a literatura de Conceição Evaristo, inclusive a partir de um encontro pessoal com a escritora no ano de 2019, ela diz que começou a mergulhar naquela escrita. “Conceição Evaristo fala das ‘escrevivências’, das mulheres negras que se tornam escritoras. Ela fala ainda desse processo literário, em que a escrita dela é a própria vivência que se mistura nessa questão da estética, da poesia e da literatura. Hoje me vejo dentro do carimbó, inspirada também pela mestra Dona Nazaré do Ó, de Icoaraci, uma mestra que atua nas diferentes linguagens da cultura popular. É uma mestra que foi pesquisadora da educação que também faz carimbó”, conta ela, que também se inspira nas integrantes do grupo Sereias do Mar, primeiro grupo de mulheres do carimbó formado no estado do Pará, que fica em Marapanim, e que toca em seu repertório as músicas das mestras Bigica, Cristina e de todas as outras que compõem o grupo.

Zienhe Castro é fã de Eneida de Moraes e criou trilogia de filmes sobre a escritora FOTO: DIVULGAÇÃO

Eneida de Moraes é paixão e inspiração para cineasta Zienhe Castro

A cineasta paraense Zienhe Castro, nome destacado na produção audiovisual paraense, também tem uma numerosa lista de mulheres que a motivaram em sua carreira artística, entre nomes da literatura, da música e ativistas femininas. “Clarice Lispector, Cora Coralina, Lygia Fagundes Telles, Leila Diniz, Fernanda Montenegro, Laura Cardoso, Rita Lee, Fernanda Young, Chiquinha Gonzaga, Anita Malfatti, Lou Andreas-Salomé, Marie Curie, Frida Kahlo, Indira Ghandi, Dandara, que foi líder do quilombo dos Palmares, entre outras”, destaca.

“Mas não posso deixar de citar a minha mãe, Jacira Caramêz, filha caçula de uma família de agricultores espanhóis, que vieram fugidos da guerra civil espanhola para o Brasil na década de 1930 e depois migraram para a Amazônia. Apesar de ser uma mulher simples, sem formação acadêmica, que tinha apenas o curso colegial, era uma talentosa artesã, ceramista, quituteira, costureira, bordadeira, enfim, uma mulher com múltiplos talentos e habilidades”, ressalta Zienhe Castro, lembrando que o conselho da mãe era que os filhos seguissem na vida com coragem e determinação, sem abrir mão dos sonhos.

A escritora paraense Eneida de Moraes (1904-1971) também tem a admiração de Zienhe Castro. “Minha outra grande musa inspiradora, a mulher que me inspira na minha fase adulta, tanto profissional como pessoalmente, é a paraense Eneida de Moraes. Tenho um trabalho de pesquisa para o cinema há mais de 15 anos sobre a vida e obra dessa grande mulher.”

Inspirada na escritora, Zienhe desenvolveu o projeto da “Trilogia sobre Eneida”, iniciada com o curta “Promessa e Azul e Branco”, adaptação do conto homônimo de Eneida. “Este ano, quando ela completa 120 anos, estou na etapa de finalização do longa-documentário ‘Simplesmente Eneida’, e na etapa de desenvolvimento do terceiro tratamento de roteiro do longa-metragem de ficção ‘Cão da madrugada’, inspirado na vida e obra de Eneida de Moraes”, atualiza a cineasta, para quem Eneida é “incrível e inspiradora”.

“Costumo dizer que somos todas um pouco Eneida. Ela é parte da nossa história, da memória cultural paraense. Tem enorme relevância para o Pará e o Brasil. Eu amo e reverencio Eneida por ser uma mulher destemida, mulher do Norte, revolucionária, escritora, jornalista, cronista, militante política e cultural. Foi uma mulher do povo, da cultura, do Carnaval, do samba, da liberdade e do amor”.