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Devassa na Receita contra adversários de Bolsonaro deve acabar em demissão

Paulo Marinho teve seus dados fiscais copiados por Feitosa. Corregedor da Receita teria sofrido pressão para arquivar processo disciplinar contra Feitosa
Paulo Marinho teve seus dados fiscais copiados por Feitosa. Corregedor da Receita teria sofrido pressão para arquivar processo disciplinar contra Feitosa

Catia Seabra e Ranier Bragon/Folhapress

O acesso sem justificativa legal em 2019 a dados fiscais sigilosos de desafetos do clã Bolsonaro virou alvo de investigação do TCU (Tribunal de Contas da União) e deve resultar em demissão na Receita Federal pelo governo Lula (PT).

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), sinalizou a aliados nesta quarta-feira (1º) que tende a demitir do serviço público Ricardo Feitosa, ex-chefe da inteligência da Receita no governo Jair Bolsonaro (PL), caso confirmada a quebra de sigilo de rivais do ex-presidente da República.

Nessas conversas, Haddad ponderou que ainda analisará esse caso, que vai se assegurar estar comprovada a violação do sigilo e que Feitosa terá amplo direito de defesa.

O próprio corregedor da Receita fez a recomendação de demissão do servidor, mas a ordem final caberá a Haddad.

O caso do ex-chefe da inteligência do órgão foi revelado pela Folha de S.Paulo. A tendência de demissão foi publicada pelo jornal O Globo e confirmada pela reportagem.

Nesta quarta-feira (1), o TCU também abriu investigação, a pedido do Ministério Público junto ao órgão.

O caso está sob relatoria do ministro Walton Rodrigues e tem por objetivo “apurar possíveis irregularidades cometidas no âmbito da Secretaria da Receita Federal, ao realizar atividade no intuito de acessar indevidamente bancos de dados daquele órgão em busca de informações protegidas por sigilo, relativas a pessoas que seriam desafetos políticos do ex-presidente da República”.

Feitosa acessou e copiou em julho de 2019, primeiro ano da gestão de Jair Bolsonaro, dados fiscais sigilosos do chefe do Ministério Público do Rio e de desafetos do então presidente da República.

Não havia nenhuma investigação formal na Receita contra essas pessoas que justificasse as consultas. Foram acessados dados do coordenador das investigações sobre o suposto esquema das “rachadinhas” o então procurador-geral de Justiça do Rio Eduardo Gussem e de dois políticos que haviam rompido com a família presidencial, o empresário Paulo Marinho e o ex-ministro Gustavo Bebianno.

O então chefe da inteligência da Receita ficou no cargo apenas quatro meses.

Após a sua saída, a Receita realizou uma investigação que resultou na sugestão de sua suspensão, mas isso foi alterado posteriormente para demissão do serviço público decisão cuja aplicação ou não é de competência exclusiva do ministro da Fazenda.

Pelas regras da administração pública, os servidores agem mediante motivação, sempre respeitando o caráter constitucional de impessoalidade, o que tem o objetivo, entre outros, de evitar privilégios ou perseguições políticas utilizando a máquina pública.

Além disso, os dados dos contribuintes estão amparados pelo sigilo. Violações ou acessos sem motivação podem resultar em punição, sendo a demissão do serviço público a mais gravosa no âmbito administrativo.

Feitosa não respondeu diretamente às perguntas da reportagem, mas, em nota, sua defesa disse que ele exerceu diversos cargos de chefia em sua vida “sempre com seriedade, zelo, atenção ao interesse público e cumprimento estrito dos deveres legais, trabalhando no combate à prática de ilícitos tributários e exercendo seu poder-dever de atuar na inteligência fiscal”.

“Não promoveu a violação de dados fiscais e tributários e nenhuma forma de vazamento ou divulgação de informações, tendo todos os dados de inteligência mantidos sob a proteção do sigilo legal”, afirmou.

Como mostrou a Folha de S.Paulo nesta quarta, o corregedor da Receita Federal, João José Tafner, afirmou internamente ter sofrido no ano passado pressão do antigo comando do Fisco para arquivar processo disciplinar aberto contra o então chefe da inteligência do órgão.

A antiga direção da Receita nega qualquer ação nesse sentido e diz que não existe nas peças formais relativas ao caso menção a essa suposta pressão por arquivamento.