JOSÉ MARQUES E ITALO NOGUEIRA
BRASÍLIA, DF, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidiu nesta terça-feira (28) afastar do cargo o juiz Marcelo Bretas, responsável pela Operação Lava Jato no Rio de Janeiro, por supostas irregularidades na condução dos processos.
Em sessão sigilosa, o colegiado decidiu por unanimidade instaurar um PAD (processo administrativo disciplinar) contra o magistrado. Por 12 votos a 3, os conselheiros determinaram o afastamento até a conclusão das investigações.
Não foram analisados os casos que Bretas julgou, apenas a conduta dele como juiz criminal.
Os conselheiros analisaram em conjunto três reclamações feitas contra Bretas.
Duas têm como origem delações premiadas de advogados que relataram supostas negociações irregulares do magistrado na condução dos processos.
A terceira se refere a uma queixa do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), de suposta atuação política na eleição de 2018 em favor do ex-juiz Wilson Witzel, vitorioso daquela disputa e afastado dois anos depois do governo do estado.
O corregedor Luis Felipe Salomão, relator dos processos, votou pelo afastamento do magistrado até a conclusão do PAD (processo administrativo disciplinar) a ser instaurado. Ele foi acompanhado por outros onze conselheiros.
O conselheiro João Paulo Schoucair votou pela abertura do procedimento, mas sem o afastamento do magistrado. Ele foi acompanhado por outros dois conselheiros.
A decisão afasta Bretas da condução da 7ª Vara Federal Criminal, onde ainda estão alguns dos processos da Lava Jato fluminense. Eles serão conduzidos pela juíza-substituta da vara, Caroline Vieira até a conclusão do PAD, quando o CNJ analisará o destino do magistrado.
Bretas se tornou responsável pela Lava Jato fluminense na primeira instância em 2015, atuando em processos envolvendo corrupção na Eletrobras. Ele também assumiu os processos sobre o esquema de corrupção do ex-governador Sérgio Cabral, a quem mandou prender e condenou a mais de 400 anos de prisão em mais de 30 ações penais.
Os desdobramentos da investigação sobre Cabral levaram à prisão de uma série de empresários, como Eike Batista, e uma rede de mais de 50 doleiros.
Dentro de investigação sobre a estatal Eletronuclear, o magistrado também expediu em 2019 ordem determinando a prisão do ex-presidente Michel Temer (MDB), o que foi revertido posteriormente no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
O magistrado vem desde 2021 tendo sua atuação questionada em tribunais superiores. Diversos processos foram retirados de suas mãos por decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) com o entendimento de que a conexão entre eles não é suficiente para mantê-los obrigatoriamente sob responsabilidade do magistrado.
A superexposição ao lado de políticos também marcou a trajetória do magistrado. Imagens de Bretas junto ao então governador Witzel em jatinho, festas e no Maracanã se tornaram comuns. Ele chegou a ser punido pelo TRF-2 (Tribunal Regional Federal) por participar de uma inauguração de obra pública ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro e do então prefeito Marcelo Crivella (Republicanos).
Delações premiadas firmadas com a PGR (Procuradoria-Geral da República) também apontaram supostas irregularidades de Bretas na condução dos processos.
Uma das reclamações analisadas pelo CNJ se refere a uma representação feita pelo Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) com base em reportagem publicada pela Veja sobre a delação premiada do advogado Nythalmar Dias Ferreira Filho.
O advogado procurou a PGR após ser alvo de busca e apreensão numa investigação do Ministério Público Federal sob suspeita de tráfico de influência e venda de prestígio na captação de clientes.
Ele relatou supostos acordos feitos com o juiz antes do proferimento de sentenças com o envolvimento de procuradores. Um dos casos se refere à suposta negociação com Bretas e um procurador da força-tarefa fluminense sobre como a confissão do empresário Fernando Cavendish num interrogatório afetaria o acordo de delação ainda em debate.
Uma segunda representação analisada pelo CNJ se refere a uma correição feita pela Corregedoria do órgão na 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, comandada por Bretas.
A fiscalização foi motivada pela delação premiada do advogado José Antônio Fichtner, que afirma ter recebido ofertas de vantagens e pressão por parte de Nythalmar quando era alvo de investigação sob responsabilidade do magistrado.
A representação apresentada por Eduardo Paes questiona o fato de o magistrado ter marcado de forma seguida, durante a campanha eleitoral de 2018, interrogatórios de seu ex-secretário de Obras Alexandre Pinto, à época réu confesso da acusação de recebimento de propina na gestão Paes.
A quarta e última audiência foi realizada três dias antes do primeiro turno. Após três interrogatórios sem envolver Paes nos atos de corrupção, Pinto afirmou pela primeira vez que soube de acerto de propina por parte do prefeito, que nega a acusação.
“O prejuízo que daí resultou à campanha eleitoral do ora requerente é intuitivo, culminando mais tarde na eleição do sr. Wilson Witzel”, afirma a representação de Paes.
Após a eleição, Bretas exibiu sua relação próxima com Witzel o acompanhando de jatinho à posse de Jair Bolsonaro e frequentando o camarote do governo estadual no Maracanã.
Naquele ano, Paes também havia sido ouvido como testemunha no processo sobre o suposto pagamento de propina a membros do COI (Comitê Olímpico Internacional) para a escolha do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016.
Durante o ato, Bretas fez questionamentos sem relação com a ação penal, questionando o prefeito sobre suposto pagamento de propina ou caixa dois eleitoral a ele em obras do município para os Jogos.
“Estas evidências concretas adicionais tornam ainda mais consistente a demonstração de que o juiz lançou mão dos seus poderes jurisdicionais para perseguir e prejudicar Eduardo Paes e favorecer Wilson Witzel, agindo com parcialidade e em acintoso desprezo pela dignidade, honra e decoro das suas funções.”
A punição a Bretas se soma à já aplicada ao ex-coordenador da força-tarefa da Lava Jato fluminense, o procurador Eduardo El Hage, pelo CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).
O Conselho decidiu em dezembro suspender o procurador por 30 dias por supostamente ter divulgado dados sigilosos sobre uma investigação contra o ex-senador Romero Jucá, que era alvo de denúncia. Nesta terça, o CNMP iniciou o julgamento de um recurso de El Hage, interrompido por um pedido de vista.
A divulgação questionada pelo CNMP se deu por meio de uma nota oficial publicada no site do MPF e seguiu padrões adotados pela própria PGR. O resultado do julgamento colidiu com o relatório da Comissão Processante, que opinou pela improcedência da acusação.