Cintia Magno
Data em que ocorreu a primeira transmissão de um programa de rádio das Nações Unidas, o dia 13 de fevereiro é marcado pela celebração do Dia Mundial do Rádio. Instituída pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e celebrada desde 2011, a data comemorativa busca reforçar a importância do rádio como um veículo de baixo custo, popular e que pode alcançar as áreas mais remotas e as comunidades mais marginalizadas, a exemplo do papel social que as rádios comunitárias mantêm até hoje.
Ainda que a relação do rádio com os aspectos comerciais tenha se estreitado ao longo das décadas, a professora da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal do Pará (UFPA), Netília Seixas, lembra que quando a segunda emissora de rádio foi criada no Brasil, que inclusive durante muito tempo foi tida como a primeira, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, tinha uma finalidade educativa. Idealizada por Edgar Roquette-Pinto e Henrique Morize, a rádio era formada por programas que veiculavam não apenas música e notícias, mas também conteúdos relacionados à história do Brasil, literatura e ciência.
“O Roquette-Pinto era um educador, então ele tinha um propósito educativo com a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro e outras rádios foram criadas também com esse propósito no Brasil”, destaca.
A publicidade e o aspecto comercial, no rádio, só foram inseridos na década de 30, segundo a professora. “Quando a publicidade entrou no rádio foi que possibilitou que o rádio se sustentasse economicamente e, daí, pudesse crescer e ter os seus grupos de músicos, o seu staff de uma forma mais profissional porque antes era algo muito ocasional. Agora, o que ocorre é que as emissoras vão fazendo parte de grandes conglomerados, vão surgindo as questões de política, de interesses. Mas esse aspecto educativo nunca esteve ausente do rádio”, completa.
EXPANSÃO
Quando se considera esse aspecto dentro do contexto das chamadas rádios comunitárias, a professora considera que, de modo geral, a rádio comunitária, quando considerada a finalidade para a qual ela foi criada, é algo louvável e que precisaria ser realmente implementada.
“Nós precisamos ter condições e possibilidades de as comunidades que têm dificuldade de ter acesso a outros canais ou outras formas de expor a sua voz, possam ter esse espaço que seria o da rádio comunitária”, avalia. Para a professora, a sociedade está hoje em um momento histórico em que os direitos sociais estão sendo aviltados.
“As relações de mercado estão cobrando tanto que nós corremos o risco de voltar a períodos muito anteriores nas relações de direitos dos trabalhadores, então, precisamos ter cuidado em garantir que as pessoas, as comunidades, os grupos tenham espaço para apresentar a sua voz e eu vejo a rádio comunitária como uma possibilidade, um propósito nesse sentido. Pode ser algo muito idealista, mas temos exemplos que mostram que é possível”, finaliza.
Rádio ribeirinha mobiliza comunidades
Sediada na comunidade Porto Ceasa, à beira do Rio Guamá, a Rádio Ribeirinha Murukutu nasceu com um objetivo muito claro, o de transmitir conteúdo com o objetivo de comunicar, de organizar. Do bairro do Curió-Utinga, a rádio web está 24 horas no ar, todos os dias da semana, e tem alcance mundial.
“A Rádio Ribeirinha Murukutu é uma emissora do Instituto Idade Mídia – Comunicação para a cidadania, que é uma organização de comunicação popular e comunitária sediada em Belém. Na época, a ideia era de ser uma plataforma de cursos, palestras, oficinas, de formação teórica e habilitação técnica de agentes multiplicadores da comunicação popular, da comunicação comunitária, da comunicação educativa”, contextualiza o midiativista, educomunicador e coordenador do Instituto Idade Mídia, Angelo Madson Tupinambá.
“Quando o Instituto Idade Mídia tinha dez anos, nós criamos a nossa primeira rádio web, até porque a nossa origem é com as rádios comunitárias em sequência FM, principalmente a partir da Rádio Resistência FM no bairro do Marco”.
Por diferentes razões, Angelo lembra que decidiu migrar para a nova tecnologia de informação que ainda estava surgindo na época, que é o streaming, a rádio web, mas sempre com a intensão de manter as mesmas características e princípios elementares da comunicação popular alternativa e comunitária.
“A gente sabe o quanto a comunicação popular, alternativa e contra-hegemônica pode ser usada como uma ferramenta. Para a gente, o rádio é um instrumento de mobilização, de organização, de conscientização, de bases comunitárias, de comunidades não apenas territoriais, mas comunidades de afeto também”, considera.
“Para a gente do Instituto Idade Mídia e da Rádio Ribeirinha Murukutu, a nossa programação tem que ser um instrumento dessa mobilização, dessa educação em prol da transformação social. Então, muito embora as pessoas acreditem que o rádio esteja condenado, justamente porque ele é um veículo cego diante de um império de transmissões de imagens que vemos hoje, acreditamos que o rádio não chegou a uma situação limite, não as rádios comunitárias”.