O ministro Luís Roberto Barroso, 67 anos, anunciou nesta quinta, 9, sua saída do Supremo Tribunal Federal (STF), encerrando uma trajetória de mais de uma década na mais alta instância do Judiciário brasileiro. Presidente da Corte entre setembro de 2023 e setembro de 2025, Barroso foi nomeado em 2013 pela então presidenta Dilma Rousseff e poderia permanecer até 2033, quando completaria 75 anos, idade-limite para a aposentadoria compulsória. Optou, porém, por antecipar sua aposentadoria, decisão que vinha amadurecendo nos últimos meses.
FORMAÇÃO E CARREIRA ACADÊMICA
Natural de Vassouras (RJ), Barroso formou-se em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), onde também concluiu o doutorado em Direito Público e se tornou professor titular de Direito Constitucional — cadeira que ainda ocupa. Fez mestrado na Universidade de Yale e pós-doutorado em Harvard, nos Estados Unidos, além de atuar como professor visitante nas universidades de Poitiers (França), Breslávia (Polônia) e na Universidade de Brasília (UnB).
Reconhecido por seu perfil acadêmico e por defender uma linguagem jurídica mais clara e acessível, Barroso é autor de diversos livros e artigos publicados no Brasil e no exterior. Sua produção intelectual consolidou-o como uma das principais vozes do direito constitucional contemporâneo brasileiro.
ATUAÇÃO ANTES DO STF
Antes de chegar à Corte, Barroso construiu uma carreira sólida na advocacia e no serviço público. Foi procurador do Estado do Rio de Janeiro e atuou como advogado em casos de grande relevância nacional, como a liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias, a proibição do nepotismo no Poder Judiciário e a defesa do reconhecimento da união homoafetiva. Também defendeu o direito da gestante de interromper a gravidez em casos de feto anencéfalo, tema que marcou época na jurisprudência brasileira.
TRAJETÓRIA NO SUPREMO
Desde sua posse no STF, em 2013, Barroso se destacou como relator de processos de forte impacto político e social. Foi responsável por decisões que restringiram o foro privilegiado de parlamentares, pela decisão que suspendeu despejos durante a pandemia da Covid-19 e por medidas que autorizaram a instalação da CPI da Covid. Também conduziu o julgamento que tratou da execução imediata da pena de condenados pelo tribunal do júri e analisou recursos relacionados ao processo do Mensalão.
Entre as decisões de grande alcance social, Barroso relatou o caso que determinou a retirada de invasores de terras indígenas e o que questionou regras da Reforma da Previdência de 2019. Num gesto inédito, assinou voto conjunto com o ministro Gilmar Mendes que restabeleceu o piso nacional da enfermagem, com ressalvas sobre o financiamento pelas instâncias federativas.
GESTÃO NA PRESIDÊNCIA DO STF
Durante sua presidência, Barroso foi responsável por modernizar a comunicação da Corte e aproximar o Judiciário da sociedade. Lançou o Pacto Nacional pela Linguagem Simples, voltado à eliminação de jargões jurídicos e à democratização do acesso às decisões do tribunal. Também instituiu mudanças nos ritos de julgamento, dividindo as sessões em duas etapas — uma para sustentações orais e outra para votação —, a fim de aprimorar o debate e a transparência.
Seu mandato foi marcado ainda por iniciativas de diversidade, sustentabilidade e acessibilidade: o STF ampliou a contratação de profissionais com deficiência, adaptou suas estruturas físicas e digitais e investiu em ferramentas de inteligência artificial para otimizar processos internos.
CASOS EMBLEMÁTICOS E LEGADO
À frente da Corte, Barroso conduziu julgamentos de alta relevância social, como o que ampliou a responsabilidade das redes sociais sobre conteúdos publicados por usuários e o que reconheceu violações de direitos humanos no sistema prisional brasileiro. Também presidiu sessões que discutiram o porte de maconha para uso pessoal e as ações relacionadas aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas.
Sob sua liderança, a Primeira Turma do STF condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus ligados à trama golpista, consolidando um dos julgamentos mais simbólicos da história recente do tribunal.
FIM DE CICLO
Com sua saída, Barroso encerra uma fase de protagonismo intelectual e institucional no STF, marcada por firme defesa da Constituição, da democracia e dos direitos fundamentais. Sua trajetória deixa marcas profundas no Judiciário e abre uma nova disputa política em Brasília pela escolha de seu sucessor — um cargo que, como o próprio ministro disse em tom sereno e definitivo, “exige grandeza, serenidade e, sobretudo, fé nas instituições”.