O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarca em Belém nesta quinta-feira, dia 2, fica até o dia 3, e vai cumprir uma extensa agenda que inclui inaugurações na capital e no Marajó, além de visitas a obras que fazem parte do projeto de preparação para a COP30. Antes disso, ele concedeu entrevista exclusiva ao DIÁRIO, falando sobre a atuação do Congresso Nacional, a aproximação com Donald Trump e aproveitou para não apenas confirmar a vinda, mas demonstrar satisfação em estar no Pará faltando praticamente apenas um mês para a realização da 30ª edição da Conferência do Clima.
“A agenda está confirmadíssima, até porque sempre fico muito feliz quando visito o Pará e olho, de perto, como estão andando os programas e os investimentos federais que os paraenses tanto merecem”, conta Lula.
O primeiro evento é em Breves, onde ele, acompanhado do ministro da Educação, Camilo Santana, participa na quinta-feira, dia 2, às 11h, da inauguração da creche Afonso Brito. A creche, cuja obra iniciou em 2011, foi paralisada junto com outras mais de 100 obras na região.
Em seguida, o presidente segue para a orla de Breves, onde participa da cerimônia de entrega do Ministério da Educação. Na ocasião, será anunciada a retomada das obras que fazem parte do projeto FNDE Chegando Junto, do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
“O Arquipélago do Marajó, com mais de meio milhão de habitantes, sofreu muito com o descaso nos últimos anos e agora estamos conseguindo reverter esta situação”, justifica.
De acordo com o governo federal, apenas naquela região, o MEC já concluiu as obras de 43 escolas, creches e outras unidades de ensino que estavam paradas há anos quando iniciamos nosso mandato. Outras 72, também retomadas, estão em diferentes estágios de recuperação e construção.
Em Belém, na parte da tarde, a comitiva visita o Porto Futuro II, no qual está o Museu das Amazônias, que foi construído com recursos do governo federal e abriga a última exposição de Sebastião Salgado, falecido em maio último. E, na sexta-feira, dia 3, além de visitar o Parque da Cidade, o principal palco da COP30, eles conferem as obras de urbanização e drenagem do Canal da União.
Em seguida, Lula vai à inauguração do Parque Linear da Nova Doca, onde ele deve fazer um balanço de todos os investimentos federais que a cidade e sua região metropolitana estão recebendo para a conferência. Confira a entrevista:
DIÁRIO
Faltando pouco mais de um mês para a COP30 em Belém, qual é a sua avaliação do estágio atual de toda a preparação para o evento? O senhor percebe mudança no tom com que a imprensa vem falando sobre a cidade-sede? O que o senhor pode falar sobre a campanha difamatória da qual Belém foi vítima nesse cenário?
LULA
Belém estará pronta para receber, em novembro, o maior evento climático do planeta. As obras estão avançadas, muitas em fase final. Cerca de R$ 4,2 bilhões do governo federal estão sendo investidos em mobilidade, saneamento, parques urbanos, drenagem de canais, reforma de mercados e terminais hidroviários. Isso vai melhorar a vida de meio milhão de pessoas e se tornar um legado para os paraenses após o evento. Além disso, temos mapeados mais de 53 mil leitos de hospedagem, o que é suficiente para atender o número de participantes esperados.
Acompanho as críticas que a cidade vem recebendo, e vejo que elas são parecidas com as que ocorrem quando qualquer grande evento internacional é feito em cidades do Sul Global. Mas estes encontros não podem ficar restritos aos países mais ricos, e tem muita gente que fala da Amazônia sem nem mesmo conhecê-la. Por isso mesmo, fiz questão de que o evento fosse sediado em Belém, para que todos presenciem não só a riqueza desta região, mas também sua vida real, seus problemas e seus desafios.
E quero lembrar que, quando preparamos as cúpulas do G20 e do BRICS no Brasil, recebemos muitos elogios, de vários países do mundo, ao fim dos eventos. Com a COP30, não será diferente. Quem visitar Belém vai conhecer um povo extraordinário e uma cidade viva, acolhedora e preparada. O que queremos é que o encontro seja lembrado não só como a mais importante conferência climática da história, mas também como o momento em que o Brasil e a Amazônia mostraram ao planeta que são parte essencial da solução dos temas mais urgentes que estão colocados para o mundo.
DIÁRIO
O senhor tem dito que o Minha Casa, Minha Vida é um dos programas de maior impacto social do governo, e a região Norte tem sido bastante contemplada pela política de Estado. É uma reparação para com os nortistas que o senhor colocou como meta neste mandato?
LULA
Desde o início de meu mandato, o Minha Casa, Minha Vida já contratou ou retomou as obras de 88,7 mil moradias para as pessoas que vivem na região Norte, com investimentos de R$ 10,7 bilhões. E seguiremos expandindo esses números, pois as famílias merecem realizar o sonho da casa própria: é ela que dá segurança para uma vida mais digna, livre do aluguel, e permite a todos se planejar para ter ainda mais. Ao mesmo tempo, fazer moradias gera empregos, movimenta toda a cadeia da indústria da construção e traz desenvolvimento econômico para a região.
É importante dizer que estamos investindo em diversas frentes. Há cerca de um mês, estive em Manaus, onde acompanhei o lançamento de cabos de uma rede de fibra óptica de 12 mil km que levará Internet de qualidade a toda a região. Estamos trabalhando fortemente com o Novo PAC que, apenas no Pará, terá investimentos diretos de R$ 31,6 bilhões. Estamos cuidando da população: na região Norte como um todo, mais do que dobramos o número de profissionais do Mais Médicos, que passaram de 1,8 mil para 4 mil. E também pensando no futuro, com a criação de 13 novos campi de Institutos Federais nos sete estados da região, para que os jovens tenham melhores oportunidades no mercado de trabalho. Mercado, aliás, que está aquecido: nunca tivemos tanta gente trabalhando no Brasil, com os menores índices de desemprego da história.
DIÁRIO
Presidente, o senhor acaba de vetar mudanças na Lei da Ficha Limpa que poderiam beneficiar políticos condenados e inelegíveis, em mais uma tentativa do Congresso Nacional de criar instrumentos de autoproteção. Como o senhor vê a atuação da Câmara e do Senado em relação ao papel que justifica a existência do parlamento — defender os interesses da população em primeiro lugar — como um todo?
LULA
Se olharmos toda a atuação do Congresso desde que fui eleito, vamos ver que, nos momentos mais importantes, ele aprovou aquilo que o povo precisa. Garantiu que, na transição, tivéssemos os recursos para reconstruir as políticas e programas sociais que foram desmontadas no governo anterior. Aprovou a reforma tributária, que estava parada há mais de 40 anos. Fez as mudanças legais para retomarmos e ampliarmos o Mais Médicos, o Bolsa-Família e diversos outros programas que beneficiam diretamente a população. Há menos de um mês, aprovou a Lei que dá segurança às crianças e adolescentes nas redes digitais – algo que nosso governo defende com muita força, e que agora virou realidade. Ou seja, mesmo que meu partido não tenha nem 70 dos 513 deputados federais, estamos conseguindo, com muito diálogo, construir consensos para transformar o Brasil para melhor.
A verdade é que, mesmo quando há divergências, a vontade da população consegue prevalecer. Vimos isso há pouco, quando a chamada “PEC da Blindagem” foi rejeitada no Senado. O que a população espera do Congresso agora é que siga trazendo mudanças reais para quem vive do trabalho. Que aprove a Lei que zera o imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil e reduz a tributação de quem ganha até R$ 7.350. Que dê atenção às propostas como o Gás para Todos, que fornecerá botijões, de graça, para 15 milhões de famílias. São pontos aos quais nossos parlamentares, tenho certeza, darão toda a atenção necessária.
DIÁRIO
Presidente, desde que o Brasil assumiu compromissos climáticos mais ambiciosos, há críticas de que o desmatamento ainda persiste em diversas regiões amazônicas. Que medidas concretas sua gestão irá adotar até novembro para reduzir esse desmatamento e garantir a credibilidade brasileira na COP30?
LULA
Em dois anos e meio, reduzimos pela metade o desmatamento na Amazônia. Tanto o Ibama como o ICMBio, que haviam sido deixados de lado nos anos anteriores, voltaram a ter capacidade de ação, e dobraram o número de fiscalizações. Aprovamos recursos de R$ 850 milhões do Fundo Amazônia para reprimir as derrubadas ilegais na região. Voltamos a aplicar com muito rigor a lei contra aqueles que cometem crimes ambientais. E contratamos mais de 4,3 mil brigadistas para combater incêndios – a maior contratação da história.
Com uma série de recursos e financiamentos voltados à economia verde, estamos demonstrando que é possível, sim, proteger a natureza e, ao mesmo tempo, melhorar o padrão de vida dos habitantes da Amazônia. É o caso do Programa União com Municípios, que prevê investimento total de R$ 785 milhões para promover o desenvolvimento sustentável. Dos 81 municípios que podem ser beneficiados, 70 já aderiram ao programa. Além disso, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre – ou TFFF – que lançaremos na COP30, vai financiar iniciativas sustentáveis não apenas na Amazônia, mas também em muitos outros países que desejam manter suas florestas em pé.
Mas não é só de nossas florestas que podemos nos orgulhar. O Brasil está muito à frente quando falamos de energia renovável: 88% de nossa eletricidade vem de fontes limpas, contra 32% da média global. Produzimos e usamos etanol e biodiesel como poucas outras nações e temos ampliado muito a geração de energia solar e eólica. Em resumo: quando o assunto é compromisso com o clima, o mundo tem muito a aprender conosco.
DIÁRIO
Depois de seu discurso na Assembleia Geral da ONU na semana passada, firme e em defesa da democracia, e que foi bem recebido em diversas frentes, acredita que está sacramentado o caminho diplomático para que seja revisto o tarifaço imposto pelo governo norte-americano — e que também já impacta a economia paraense?
LULA
Na Assembleia Geral mostramos ao mundo que o Brasil tem uma democracia sólida e uma soberania inegociável. Esses são pontos de partida para nossa relação com qualquer nação do planeta. E foi nesse contexto que, como todos puderam acompanhar, o presidente Trump se mostrou aberto para o diálogo. Nossas equipes diplomáticas estão no momento trabalhando para organizar essa conversa. Entendo que ela será uma boa oportunidade para mostrar ao presidente norte-americano que os dados reais de nossas relações comerciais mostram que o Brasil importa muito mais do que exporta para os Estados Unidos: nos últimos 15 anos, o superávit americano em bens e serviços chegou a US$ 410 bilhões. Já começamos a ver avanços, pois muito provavelmente nossos produtos de móveis e madeira terão tarifas reduzidas a partir de uma decisão que o governo norte-americano tomou nesta semana. No fundo, como costumo falar, o diálogo é sempre a melhor estratégia para podermos resolver os problemas, por mais difíceis que eles possam parecer. E é nesse sentido que estamos trabalhando.