
Quando o mês de setembro chega, a imagem de crianças nas ruas com sacolas cheias de doces logo remete a São Cosme e São Damião, santos celebrados tradicionalmente no dia 27.
Embora Cosme e Damião sejam conhecidos no catolicismo como irmãos gêmeos e
curandeiros, não há, segundo a doutrina da Igreja, uma relação direta com crianças ou
distribuição de doces. Essa prática nasceu da associação feita por africanos escravizados no
Brasil, como explica o professor Agnaldo Cuoco Portugal, do Departamento de Filosofia da
UnB.
Para cultuar seus orixás em meio à repressão religiosa imposta na época, os escravizados
associaram Cosme e Damião aos Ibejis, entidades gêmeas infantis do candomblé e da
umbanda, filhos de Xangô e Iansã.
“Naquela época, os escravos africanos não tinham a possibilidade de cultuar os seus orixás, as
suas divindades livremente. Eles tinham que fazer essa associação com alguns santos católicos, para não serem perseguidos. A tradição de dar doces tem a ver com esses dois orixás crianças que foram associados a Cosme e Damião”, explica o professor.
Entre fé e cultura popular
Essa fusão entre religiões ajudou a criar tradições que seguem vivas até hoje no Brasil. “A
religião tem um papel de raiz, de fonte de vários elementos da cultura. Permite a você marcar
o dia, por exemplo. Esse dia especial, que está ligado a tal coisa. Ou os lugares, tal lugar é
especial, é um templo, é uma catedral, é um terreiro, é uma casa de santo. Então, a religião
está ligada à cultura de diversas maneiras”, conclui Cuoco.
Em 1969, o Vaticano alterou a data oficial da celebração de São Cosme e São Damião para 26
de setembro, para não coincidir com o dia de São Vicente de Paulo. No entanto, a tradição
popular brasileira continua celebrando no dia 27, data em que as ruas ainda se enchem de
alegria, sacolas coloridas e doces para celebrar fé, cultura e resistência.
Fonte: Agência Brasil