A novela Vale Tudo reacendeu um debate delicado: o direito do paciente de recusar ou adiar um tratamento oncológico. Na trama, o personagem Afonso (Humberto Carrão) é diagnosticado com leucemia, mas opta por não iniciar o tratamento até encontrar um doador de medula compatível. A decisão provoca conflitos e expõe os dilemas entre esperança, autonomia e urgência médica.
Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o Brasil deve registrar cerca de 11.540 novos casos de leucemia por ano entre 2023 e 2025, com uma incidência média de 5,33 casos por 100 mil habitantes.
Reações distintas diante do diagnóstico
O psicólogo Tomás Machado, da Blue Clin, afirma que cada paciente reage de forma única ao receber o diagnóstico:
“Alguns se isolam, outros buscam apoio familiar. Não há um modelo certo de enfrentamento. O impacto emocional é profundo e individual.”
O oncologista Dr. Jorge Abissamra Filho, especialista em Oncologia Clínica, alerta para os riscos de atrasar a quimioterapia, mas reconhece que o acolhimento emocional é essencial:
“Cada dia de atraso pode significar progressão da doença. Ainda assim, o paciente precisa sentir que está sendo ouvido e respeitado.”
A trama também evidencia como o câncer afeta não apenas quem é diagnosticado, mas todo o círculo ao redor. Familiares de Afonso se dividem entre apoiar sua escolha e pressioná-lo a iniciar o tratamento imediatamente.
Autonomia e dignidade na escolha
Para a psicóloga Amanda Batista, a decisão de não iniciar o tratamento pode ser dolorosa para os familiares, mas deve ser respeitada:
“A dignidade do paciente está em poder escolher como enfrentar a doença. Não é fácil para quem está por perto, mas o protagonismo deve ser do paciente.”
O Dr. Abissamra acrescenta que a atitude de Afonso também pode refletir um mecanismo de autoproteção:
“É uma forma de manter algum controle em meio ao caos. Condicionar o tratamento à chance real de cura pode dar ao paciente a sensação de esperança, mesmo que clínica e emocionalmente isso seja perigoso.”
O desafio da escuta e do acolhimento
Especialistas concordam que a recusa de tratamento pode estar ligada ao medo da dor, perda de identidade, ou de tornar-se dependente, além do estigma do câncer como sentença de morte.
Em casos assim, o papel dos profissionais de saúde e da família é oferecer apoio emocional, sem julgamentos, e reafirmar que cuidar também é escutar. Se a recusa for definitiva, deve-se compreender que o paciente tem o direito de escolher seu caminho — com apoio, dignidade e humanidade.