MEIO AMBIENTE

Evento debate o futuro da Amazônia e as mudanças climáticas

Vivo Futuro ocorreu em São Paulo, para debater temas como ciência climática, Amazônia, ancestralidade, saúde mental e tecnologia

Encontro Futuro Vivo, organizado pela Vivo, ocorreu na última terça-feira (26), em São Paulo, para debater temas como ciência climática, Amazônia, ancestralidade, saúde mental, tecnologia e neurociência. Fotos: Cintia Magno
Encontro Futuro Vivo, organizado pela Vivo, ocorreu na última terça-feira (26), em São Paulo, para debater temas como ciência climática, Amazônia, ancestralidade, saúde mental, tecnologia e neurociência. Fotos: Cintia Magno

O nível de emergência climática que o mundo alcançou nos últimos anos confere àCOP30 a possibilidade de se tornar a mais importante de todas as conferências da ONU sobre mudanças climáticas já realizadas até então. A perspectiva é apontada pelo cientista climático Carlos Nobre, que se uniu a outros cientistas, pesquisadores e lideranças indígenas no Vivo na última terça-feira (26), em São Paulo, para debater temas como ciência climática, Amazônia, ancestralidade, saúde mental, tecnologia e neurociência.

Fundamental para o sistema climático da Terra, a Amazônia desempenha um papel fundamental na reciclagem da água e na produção de fluxos de umidade que se deslocam através das correntes de ar para formar nuvens e chuva em regiões distantes, inclusive fora da floresta e da bacia Amazônica. Não bastasse isso, a Amazônia ainda constitui a maior concentração de biodiversidade do planeta, com 13% das espécies descritas do mundo comprimidas em cerca de 0,5% da área total da superfície terrestre.

Na contramão de toda essa riqueza, o cenário apontado pela ciência há algum tempo é o de que esses serviços estão seriamente ameaçados pelas emergências climáticas já em curso. Mas é exatamente esse senso de urgência que pode levar à virada de chave necessária para transformar a realidade.

“Eu não tenho nenhuma dúvida que a COP 30 tem que ser a mais importante das 30 COPs porque nós estamos vivendo uma emergência climática muito grave. A ciência já vem dizendo isso há décadas, e agora em 2023, 2024 e começo de 2025, a temperatura subiu muito. Todos os eventos extremos cresceram exponencialmente no mundo inteiro”, alerta o pesquisador sênior do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP) e co-presidente do Painel Científico para a Amazônia, Carlos Nobre.

“A ciência mostrava que temos que chegar a 43% de redução de gases de efeito estufa e zerar o saldo de emissões até 2050. Se a gente for nessa direção, nós vamos passar de 2° C em 2050 e chegaremos a 3°C a 4°C em 2100. Isso é um ecocídio, nós temos que acelerar demais a redução de emissões. Precisamos fazer uma rapidíssima transição energética para longe dos combustíveis fósseis e, se isso acontecer, essa será a mais importante das 30 COPs”.

Durante o painel em que debateu com o cientista climático sueco e co-criador do conceito de limites planetários, Johan Rockström, Carlos Nobre também destacou que parte das soluções para o enfrentamento da crise climática pode vir da valorização da biodiversidade da Amazônia para a economia, sendo necessário escalonar esse uso que já é colocado em prática, por exemplo, pelas populações tradicionais.

“Nós não estamos fazendo o que as populações indígenas vêm fazendo há milhares de anos. Há milhares de anos eles começaram a usar mais de 2.300 produtos da biodiversidade amazônica, plantas medicinais, frutas”, destacou. “Há muitas décadas eles vêm mostrando que há maneiras de usar os produtos da biodiversidade na industrialização moderna. Há muitos bons exemplos disso”.

Saberes tradicionais

Quando se escolhe enfrentar os desafios pelo caminho das soluções baseadas na natureza, os saberes desenvolvidos há séculos pelos povos originários têm muito a ensinar ao modelo econômico atual.

Encontro Futuro Vivo e a Sabedoria Indígena

Ainda durante a programação do Encontro Futuro Vivo, que se concentrou no Teatro Vivo, em São Paulo, a líder indígena da etnia suruíe ativista ambiental Txai Suruí, a líder indígena Naywëni Yawanawá e a líder indígena da etnia wapichana e enviada Especial da COP30, Sinéia do Vale, puderam compartilhar um pouco da visão de mundo dos povos originários.

Primeira liderança feminina do povo yawanawá e guardiã do Nipei – a sabedoria das plantas sagradas – Naywëni Yawanawá contou parte da sua experiência com o cuidado das plantas sagradas e sobre os ensinamentos que seus antepassados lhe transmitiram, possibilitando que ela levasse adiante a missão que lhe foi conferida.

“A minha história conta que antigamente as árvores falavam. Com o tempo elas calaram, quem fala é só os espíritos através da cura. Elas se calaram porque o homem começou a destruir, derrubando”, refletiu, ao contar que os Yawanawá são um povo que tem a ‘medicina viva’.

“O que restou para os povos indígenas é o conhecimento de você entrar em conexão com o espírito e saber que aquela planta dá vida, ela faz tudo. Eu estou dizendo por elas porque elas não falam mais. Essa floresta tem vida, ela só não pode falar, mas ela pode usar cada um para dizer ‘vamos plantar mais, vamos dar vida e viver’. Porque se a floresta morre, nós também morremos”.

Não à toa, os saberes ancestrais cultivados entre os diferentes povos indígenas apontam para um conhecimento que pode não ser o que é formalmente ensinado nas salas de aula, mas que, independente disso, tem muito a ensinar sobre a melhor forma do homem se relacionar com a natureza, sem esquecer que ele é parte integrante dela.

Articuladora de pautas climáticas pelos povos originários, Sinéia do Vale destacou que as populações indígenas já vêm desenvolvendo suas próprias soluções para os impactos das mudanças climáticas antes mesmo das discussões acerca desse conceito se intensificarem. “Nós, os povos indígenas, já temos uma conectividade com a terra, com a água, com as árvores e com todo o ambiente que nós vivemos. E eu trago uma experiência que, em 2010, por exemplo, na região Serra da Lua todas as mandiocas cozinharam dentro da terra. Nós não estávamos falando esse nome, ainda, de mudança climática, mas a gente queria saber o que estava acontecendo?”, lembra.

“E ali nós começamos a fazer uns estudos, nós mesmos povos indígenas, como estávamos sendo afetados diretamente por essa questão da transformação do tempo. E a gente descobriu, construindo o primeiro plano de enfrentamento às mudanças climáticas feito por indígenas ali em Roraima, que nós estávamos sendo afetados pelo impacto das mudanças climáticas”.

Para registrar essas mudanças, as pessoas da comunidade deram início a uma espécie de calendário – hoje chamados calendários etno-ecológicos – onde anotavam o tempo de plantar e o tempo de colher. Com isso, observou-se que ao longo de 20 anos, tudo tinha mudado: a água tinha aquecido, vários peixes regionais tinham sumido.

“A gente veio numa perspectiva fazendo os nossos estudos com os nossos cientistas indígenas. Recentemente eu recebi um prêmio de cientista indígena, mas porque nós estamos trabalhando nas comunidades para trazer as vozes de quem está lá. Como nós podemos trazer as vozes para esses espaços, olhando para o que está acontecendo e como nós podemos trilhar um caminho de soluções, um caminho de dar resposta?”.

Outras discussões do Encontro Futuro Vivo

As discussões sobre como é possível buscar caminhos e respostas para o futuro acompanharam toda a programação que se seguiu ao longo do dia e discutiu os paradoxos da tecnologia com a ambientalista especialista em resíduos, Daniela Lerario; a pesquisadora em tecnologia responsável, Nina da Hora, e o advogado especialista em tecnologia, Caio Vieira Machado.

Em outro momento, um diálogo entre o líder Indígena e escritor Ailton Krenak e o neurocientista que é referência em pesquisa sobre sonhos e consciência, Sidarta Ribeiro, chamou a refletir sobre diferentes temas, incluindo o saber científico que vai além do produzido na academia, o modelo de desenvolvimento atual e as relações de trabalho quemoldam a vida moderna.

A programação contou, ainda, com uma apresentação da atriz Denise Fraga que refletiu sobre as conexões humanas diante de um mundo altamente mediado pelas tecnologias móveis, e com encerramento do músico Gilberto Gil.

Vivo anuncia compromisso de restaurar e proteger área na Amazônia até 2055

Em contagem regressiva para a COP30, a Vivo anunciou que irá investir na restauração e na proteção de uma área de 800 hectares de floresta amazônica pelos próximos 30 anos, promovendo o plantio de mais de 900 mil árvores, de 30 espécies nativas. O anúncio foi realizado durante a programação do Encontro Futuro Vivo, onde o CEO da Vivo, Christian Gebara, também destacou as iniciativas voltadas para a sustentabilidade que são adotadas pela empresa há longa data.

A região prevista para a concentração do projeto está localizada entre o oeste do estado do Maranhão e o leste do estado do Pará, uma área que passou por um processo mais acelerado de desmatamento entre os anos de 2000 e 2010. O objetivo da iniciativa é promover a conservação da biodiversidade, buscando reabilitar funções ecológicas, proteger espécies ameaçadas, como é o caso do macaco-caiarara, e fortalecer comunidades locais.

“Nós vamos cuidar e regenerar essa área durante 30 anos e, com certeza, recuperar parte importante das espécies, tanto da flora, quanto da fauna, e buscar desenvolver a bioeconomia, através do manuseio de sementes, de frutos e de outras propriedades que a gente possa trabalhar com as comunidades nessa localidade”.

Ainda que a iniciativa busque fortalecer a atuação da Vivo no contexto da COP 30, Christian Gebara lembrou que a trajetória da empresa em prol da sustentabilidade é antiga e muito anterior à confirmação de realização da conferência no Brasil. É o caso, por exemplo, de projetos como o Vivo Recicle, criado em 2006, e voltado à conscientização sobre o correto descarte de resíduos eletrônicos.

O Encontro Futuro Vivo teve a curadoria da Mandalah, consultoria global em inovação consciente.