No dia 1º de setembro começa a atuação da nova empresa de saneamento básico do Pará, que será responsável por substituir a Cosanpa nas áreas de abastecimento de água e coleta de esgoto em 99 cidades do Estado. A concessionária responsável pelo novo serviço será a Águas do Pará, pertencente à holding Aegea Saneamento, a maior empresa privada de saneamento do Brasil.
A Aegea convidou o Diário para acompanhar um dia de operações da companhia no Rio de Janeiro, onde mantém a concessionária Águas do Rio. Vencedora de dois blocos de concessão muito similares aos do Pará, desde 2021 o grupo controla a distribuição de água e coleta de esgoto em boa parte da capital carioca — nos bairros da Zona Sul, Norte e Centro — e também em duas áreas menores da Zona Oeste, região que majoritariamente é atendida por outra concessionária, a Rio+ Saneamento. Ao todo, a Aegea atende 124 bairros do Rio e 27 cidades da Região Metropolitana.
A Cedae, estatal fluminense que antes controlava a distribuição de água e coleta de esgoto, continua existindo, mas agora é responsável apenas pela captação e produção da água potável. Processo semelhante ocorrerá no Pará, com a Cosanpa.
No Rio, a Aegea — assim como as outras concessionárias — enfrentou desafios impostos por cada bloco de concessão, organizados pelo governo estadual de forma a equilibrar áreas mais problemáticas com setores mais estruturados. Na Zona Norte, por exemplo, a Águas do Rio realiza diversas intervenções para regularizar o acesso à água na comunidade da Mangueira.
As vielas estreitas, os pontos íngremes e a necessidade de diálogo com moradores e líderes comunitários são dificuldades que geram experiência para a empresa na busca pela universalização em áreas de vulnerabilidade social. “Nós operamos 565 comunidades na cidade do Rio de Janeiro. A Mangueira é uma delas. Então a gente viu que a obra de infraestrutura numa favela é muito mais complexa”, explica o CEO da Águas do Rio, Anselmo Leal – que já trabalhou no Pará, em Altamira, durante a instalação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
“O importante para conseguir entrar nesses territórios é que as pessoas entendam o valor. Aqui no Rio de Janeiro, o que a gente viu foi um desejo: quando conseguimos explicar, percebemos que eles sempre quiseram o mesmo serviço oferecido na Zona Sul. Diziam: ‘eu queria água igual a do Leblon, queria água igual a de Ipanema e nunca tive’. Então, temos visto que a população tem sido a primeira a se engajar nessa jornada”, afirma.
A empresa mantém programas e protocolos para promover as obras e incentivar a adimplência. A universalização do saneamento vai além da saúde pública. Segundo o diretor comercial da Aegea, Waldyr Bittencourt Júnior, a emissão de comprovantes de residência por meio da conta de água gera impacto social, pois permite que famílias de áreas carentes tenham acesso a crédito — antes dificultado pela ausência de documentos oficiais.
Waldyr destaca que uma das estratégias da empresa é manter a tarifa social. No Pará, ela será de R$ 36,00, com consumo limite de 20 m³ por mês, por residência. “Nas reuniões com as comunidades, a pergunta mais comum é: ‘no mês seguinte o valor vai aumentar?’. A nossa resposta é categórica, e eu tenho que dar a minha palavra: não vai aumentar, 36 não é 37 reais”, garante o executivo.
Ele também explica que o relacionamento com as comunidades precisa ser próximo. Para isso, em cada operação a Aegea instala o projeto “Vem com a Gente”, que funciona de forma itinerante para facilitar o atendimento aos clientes. Outro ponto ressaltado é a contratação de funcionários das próprias comunidades, o que gera empregos e fortalece os vínculos locais.
Experiência em Manaus
Desde 2018, a Aegea também opera a concessionária Águas de Manaus, considerada um divisor de águas dentro do grupo. Segundo Waldyr, mais de 100 mil palafitas já foram atendidas, e a construção de relacionamento com moradores de áreas vulneráveis mudou as estratégias da holding em relação à responsabilidade social e à adimplência.
Dados do Pará
O contrato de concessão da Aegea no Pará terá duração de 40 anos e prevê mais de R$ 15 bilhões em investimentos. Entre as metas, estão a universalização do abastecimento de água até 2033 na Região Metropolitana de Belém e a cobertura de 90% de esgoto até 2039 nos demais blocos. Ao todo, a empresa venceu 3 dos 4 blocos de concessão no leilão realizado em abril, na B3, em São Paulo.
A Vila da Barca, no Telégrafo, em Belém, será a primeira comunidade carente a receber os serviços da Águas do Pará. Estão previstas redes de água e esgoto adaptadas às palafitas, beneficiando mais de 1.400 residências até 2026. Serão implantados 2,3 km de rede de água elevada e 1,7 km de rede de esgoto, com hidrômetros individuais em cada casa. Mais de 200 empregos serão gerados no Estado nesta primeira fase, parte deles destinados aos próprios moradores da comunidade.
A situação do saneamento no Pará é um dos maiores desafios do Estado. Em 2022, cerca de 4 milhões de pessoas — metade da população — ainda não tinham acesso à água tratada. O tratamento de esgoto era de apenas 6,1%. Belém figura entre as capitais com os piores indicadores do país.
“O contrato do Pará é muito parecido com o do Rio de Janeiro, e já temos quatro anos de experiência nessa jornada. São desafios semelhantes, com uma regulação sólida. Acreditamos que o contrato foi muito bem modelado pelo BNDES, o que garante segurança para que o capital chegue e faça o investimento necessário. Acho que será uma história linda que começa agora no Pará”, completa Anselmo Leal.
A Aegea tem como controladora a Equipav, uma empresa familiar de investimentos, e como sócios minoritários a Itaúsa e o Fundo Soberano de Cingapura. Segundo a holding, a concessão permitirá desburocratizar os serviços antes feitos pela Cosanpa, com mais facilidade de acesso a mão de obra, recursos e maquinário.
Apesar de a Cosanpa ser uma empresa de economia mista, a maior parte das ações é controlada pelo Governo do Estado, que decidiu firmar o contrato de concessão devido aos problemas históricos de distribuição e coleta de esgoto. O Executivo estadual promete fortalecer os órgãos reguladores para fiscalizar a concessionária, evitar cobranças abusivas e garantir o cumprimento do contrato.