Uma nova vacina que estimula o sistema imunológico a atacar uma das mutações mais comuns que causam câncer se mostrou promissora na prevenção da recidiva de tumores de pâncreas e intestino, de acordo com um teste clínico inicial feito por pesquisadores da UCLA Health Jonsson Comprehensive Cancer Center e do hospital Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York. Esses cânceres estão entre os mais desafiadores de tratar.
O novo estudo, publicado na revista científica Nature Medicine, analisou a segurança e a eficácia de uma vacina direcionada aos linfonodos, que tem como alvo as mutações do gene KRAS. Essas mutações são encontradas em cerca de 25% dos tumores sólidos e causam cerca de 90% dos cânceres de pâncreas e 50% dos cânceres colorretais.
“O câncer de pâncreas é uma das doenças mais difíceis de tratar e, mesmo quando conseguimos retirar o tumor, o risco de ele voltar é muito alto”, diz o oncologista Breno Jeha Araújo, da Oncoclínicas, que não esteve envolvido no estudo, em comunicado. “O gene KRAS funciona como um condutor desses tumores. Uma vacina que treina o sistema imunológico para atacar células tumorais com essa mutação pode ser um divisor de águas”.
Ao contrário de outros tratamentos contra o câncer – incluindo vacinas que estão em desenvolvimento – que podem precisar ser personalizados para cada paciente com base em suas características e mutações específicas, a ELI-002 2P é uma vacina “pronta para uso”. Ela foi projetada para ser um produto padronizado que pode estimular o sistema imunológico a reconhecer e atacar células cancerígenas de uma forma geral, sem a necessidade do processo demorado e complexo de criar uma vacina exclusiva para cada paciente.
“Ter uma vacina pronta para uso tornaria mais fácil, rápido e barato tratar um número maior de pacientes”, afirma a médica oncologista e especialista em câncer de pâncreas Eileen O?Reilly, médica e uma das autoras do estudo. “Isso dá esperança para pessoas com câncer de pâncreas e colorretal que estavam sem tratamentos eficazes quando a doença retornar.”
A vacina foi testada em 25 pacientes – 20 com câncer de pâncreas e 5 com câncer de intestino – que apresentavam a mutação KRAS. Todos já haviam passado por cirurgia e quimioterapia, mas ainda permaneciam com alto risco de recidiva, visto que possuíam pequenas quantidades de células tumorais detectadas por exames de sangue, a chamada “doença residual mínima”.
“O direcionamento para o KRAS tem sido considerado há muito tempo um dos maiores desafios na terapia do câncer?, diz Wainberg. “Este estudo mostra que a vacina ELI-002 2P pode treinar o sistema imunológico de forma segura e eficaz para reconhecer e combater mutações causadoras de câncer. Ela oferece uma abordagem promissora para gerar respostas imunológicas precisas e duradouras sem a complexidade ou o custo de vacinas totalmente personalizadas.?
Cada paciente recebeu uma série de injeções com ELI-002 2P, que usa uma tecnologia anfifílica desenvolvida pela Elicio Therapeutics que ajuda a transportar antígenos diretamente para os gânglios linfáticos, onde as respostas imunológicas são ativadas.
Após um acompanhamento de quase 20 meses de acompanhamento, cerca de dois terços dos pacientes apresentaram a resposta imune desejada, o que significa que as células T que tinham como alvo as células cancerígenas com mutação KRAS foram ativadas e aumentaram em número e em tipo de células T, incluindo células T auxiliares CD4 e células T assassinas CD8. Talvez o achado mais significativo seja o fato de que os pacientes que apresentaram maior resposta de células T viveram mais e também apresentaram um período maior sem retorno da doença, conhecido como sobrevida livre de recidiva.
A sobrevida global média foi de quase 29 meses após a vacinação, e a sobrevida livre de recidiva média foi de mais de 15 meses. Ambos os fatores excedem a duração média esperada para pacientes com a doença.
“Este é um avanço empolgante para pacientes com cânceres induzidos por KRAS, particularmente câncer de pâncreas, onde a recorrência após o tratamento padrão é quase certa e as terapias eficazes são limitadas”, diz o primeiro autor do estudo, o médico Zev Wainberg, professor de medicina na Escola de Medicina David Geffen da UCLA e pesquisador do UCLA Health Jonsson Comprehensive Cancer Center, em comunicado. “Observamos que os pacientes que desenvolveram fortes respostas imunológicas à vacina permaneceram livres da doença e sobreviveram por muito mais tempo do que o esperado.”
Embora os resultados sejam positivos, os pesquisadores lembram que este é um estudo inicial e que novas fases, com mais participantes, serão necessárias para confirmar a eficácia e a segurança da vacina. Uma nova versão da vacina já está em avaliação em estudos internacionais. A equipe concluiu o recrutamento para um estudo de Fase 2 mais amplo da ELI-002 7P, uma versão de próxima geração da vacina que tem como alvo um conjunto mais amplo de mutações do KRAS.