Pará - O uso do analgésico paracetamol por mulheres durante a gestação está ligado a um maior risco de transtornos de neurodesenvolvimento nos filhos, como autismo e transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH). É o que concluíram pesquisadores americanos do Hospital Mount Sinai e das universidades da Califórnia, de Massachusetts Lowell e de Harvard, todas nos Estados Unidos.
A associação entre o medicamento e desfechos do tipo tem sido alvo de pesquisas há anos, entretanto os estudos encontraram resultados variados. Por isso, no novo artigo, publicado na revista científica BMC Environmental Health, os cientistas decidiram analisar 46 trabalhos sobre o tema, que englobaram dados colhidos de mais de 100 mil participantes em diferentes países.
Ao todo, a maioria dos estudos analisados, 27, encontraram uma relação positiva entre o uso do remédio e o aumento do risco de problemas do gênero nos filhos. Além disso, os autores observaram que as pesquisas de maior qualidade tiveram “mais probabilidade de evidenciar a ligação entre a exposição pré-natal ao paracetamol e o aumento dos riscos de autismo e TDAH”, diz Diddier Prada, professor de Medicina Ambiental e Ciências do Clima na Escola de Medicina Icahn do Mount Sinai, em nota.
Uma delas, publicada em fevereiro deste ano no periódico científico Nature Mental Health, acompanhou biomarcadores de paracetamol no sangue de 307 gestantes. Os filhos delas foram acompanhados por oito a dez anos após o nascimento. O risco de desenvolver TDAH na infância foi 3,15 vezes maior entre aqueles cujas mães utilizaram o medicamento na gravidez.
Outro trabalho, de 2019, publicado na revista JAMA Psychiatry por pesquisadores da Universidade John Hopkins, nos EUA, analisou amostras de sangue do cordão umbilical de 996 recém-nascidos e concluiu que aqueles com maior exposição paracetamol também tinham cerca de 3,62 vezes mais chances de serem diagnosticados com autismo na infância.
Os estudos não avaliam como isso acontece, porém, no novo artigo, os cientistas citam possíveis mecanismos biológicos que podem ajudar a esclarecer a maneira pela qual o remédio eleva esse risco. Segundo os pesquisadores, o paracetamol atravessa a barreira placentária e pode desencadear estresse oxidativo, alterar hormônios e causar mudanças epigenéticas (a expressão dos genes) que interferem no desenvolvimento cerebral fetal.
Prada explica que, “considerando o uso generalizado deste medicamento, mesmo um pequeno aumento no risco pode ter grandes implicações para a saúde pública”. Por isso, na revisão os autores defendem “medidas adequadas e imediatas para aconselhar mulheres grávidas a limitar o consumo de paracetamol a fim de proteger o neurodesenvolvimento de seus filhos”.
Eles pedem que diretrizes clínicas sejam atualizadas para incluir os riscos e benefícios do remédio e que mais pesquisas sejam conduzidas para confirmar os achados e identificar alternativas mais seguras para tratar a dor e a febre entre mulheres grávidas. Enquanto isso, o uso deve ser feito de forma cautelosa e sob supervisão médica.
“As mulheres grávidas não devem interromper o uso de medicamentos sem consultar seus médicos. Dor ou febre não tratadas também podem prejudicar o bebê. Nosso estudo destaca a importância de discutir a abordagem mais segura com os profissionais de saúde e considerar opções não medicamentosas sempre que possível”, diz Prada.
No ano passado, pesquisadores da Universidade de Nottingham descobriram que doses repetidas de paracetamol em pessoas com 65 anos ou mais podem levar a um risco aumentado de complicações gastrointestinais, cardiovasculares e renais.
Os cientistas envolvidos no estudo afirmaram que é preciso ter cuidado quando doses repetidas da droga são necessárias, principalmente, para condições dolorosas crônicas, como osteoartrite em idosos. O estudo foi liderado pelo professor Weiya Zhang, do Centro de Pesquisa Biomédica do NIHR, na Faculdade de Medicina da Universidade de Nottingham, no Reino Unido.