O diretor Bong Joon-Ho demorou seis anos para lançar o filme que seria o sucessor do cultuado “Parasita”, de 2019. Em meio à pandemia de Covid-19, o ganhador do Oscar de Melhor Filme se debruçou em uma ficção científica curiosa e quase desconhecida, baseada no livro de um escritor chamado Edward Ashton, sobre um trabalhador que é copiado toda vez que morre para ser usado como experimento científico e trabalhos perigosos.
“Mickey 17” (2025) tem alguns trunfos temáticos, de interpretação e construção estética, mas peca por um roteiro confuso, ritmo irregular e falta de direcionamento. O filme teve problemas de divulgação e distribuição, caindo no streaming da HBO pouco tempo depois de estrear com poucas salas de cinema. Algo estranho, em se tratando de uma produção com parte de uma equipe ganhadora do Oscar.
Mas basta alguns minutos de tela para entender em parte o receio da Warner com o filme, mesmo com os custos altos de produção (100 milhões de dólares). A história passa muito tempo situando o espectador dentro da premissa básica, do personagem título morrendo e revivendo, até se arrepender da decisão em meios às circunstâncias de um futuro onde as pessoas são meros joguetes para o capitalismo e fanatismos desenfreados.
Mesmo trazendo a estranheza e humor sádico já habituais do cinema de Joon-Ho, a obra perde força por cansar o espectador, pela atuação estranha de Robert Pattinson (que em alguns momentos segura o drama, mas em outros descamba para o “overact”) e a pouca relevância do resto do elenco, à exceção dos ótimos Mark Ruffalo e Toni Collette, um casal político e perigosamente religioso.
Na superfície, há críticas contundentes ao capitalismo ganancioso, o sentido da vida e o individualismo insensível na pós-modernidade, que se constrói em racismo e misoginia sob a capa de uma meritocracia ilusória. Mas Joon-Ho tem dificuldade de segurar suas ideias, como já ocorreu em outros trabalhos, como “Okja”, e tudo parece jogado para dar algum estofo à história.
Mesmo assim, trata-se de um diretor que sabe extrair humor de detalhes e construir planos elegantes. Se você conseguir passar da primeira hora, vai curtir a premissa, mesmo que seja apenas uma ficção científica sem muita ambição. Mas talvez seja isso mesmo que Joon-Ho quisesse, sendo um artista pouco afeito às ambições hollywoodianas.