DETALHES DA OPERAÇÃO

Fraudes, propina e contratos suspeitos: Justiça afasta prefeito de Ananindeua por 6 meses

Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) determinou o afastamento do prefeito, Daniel Santos (PSB).

Justiça bloqueia R$ 131 milhões de bens em investigação contra Daniel Santos
Justiça bloqueia R$ 131 milhões de bens em investigação contra Daniel Santos

O desembargador Pedro Pinheiro Sotero, do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA), determinou o afastamento do prefeito de Ananindeua, Daniel Santos (PSB), de suas funções por um período de seis meses. A medida é um desdobramento de uma investigação do Ministério Público do Pará (MPPA) que apura um suposto esquema de corrupção, fraude em licitações e lavagem de dinheiro envolvendo contratos que somam mais de R$ 115 milhões. O DIÁRIO teve acesso à decisão e petição do Ministério Público do Estado, que desencadeou nesta terça-feira, 5, a ‘operação Hades’, através do Centro Integrado de Investigação do Ministério Público do Estado do Pará (CI/MPPA), por delegação da Procuradoria-Geral de Justiça, com o apoio do Grupo de Atuação Especial de Inteligência e Segurança Institucional (GSI).

A peração Hades fundamenta-se em investigação realizada pelo MPPA com o objetivo de apurar a prática de crime de fraude ao caráter competitivo de procedimentos licitatórios, além de corrupção ativa e passiva de agentes públicos e empresários.

Além do prefeito, também foram afastados de seus cargos o Secretário Municipal de Saneamento e Infraestrutura, Paulo Roberto Cavalleiro de Macedo, e o membro da Comissão Permanente de Licitações, Manoel Palheta Fernandes. A decisão atende a um pedido do MPPA, que, em um relatório de mais de 300 páginas, detalha o envolvimento de oito pessoas físicas e oito empresas em um complexo esquema de desvio de verbas públicas.

Embora tenha negado os pedidos de prisão preventiva contra os investigados, o desembargador determinou o bloqueio de bens de todos os envolvidos, em valores que chegam a R$ 131,8 milhões para o prefeito e sua empresa, a Agropecuária J D EIRELI. A decisão também proíbe os investigados de deixarem o país, com a ordem de entrega de seus passaportes em 24 horas, e autorizou mandados de busca e apreensão nos endereços residenciais e comerciais dos suspeitos.

Esquema Investigado

Segundo a investigação do Ministério Público, o esquema era centrado no direcionamento de licitações da Prefeitura de Ananindeua, principalmente da Secretaria Municipal de Saneamento e Infraestrutura (SESAN) e da Secretaria Municipal de Saúde (SESAU), para favorecer um grupo de empresas.

As construtoras EDIFIKKA e DSL, ambas controladas pelo empresário Danillo da Silva Linhares, foram as principais beneficiárias, vencendo certames que, somados, ultrapassam R$ 115 milhões. As fraudes incluíam a inserção de cláusulas restritivas nos editais, como exigências ilegais de licenças e certidões, e a publicidade precária dos certames, o que dificultava o acesso de concorrentes e permitia à comissão de licitação saber previamente quem participaria.

O membro da comissão de licitação, Manoel Palheta Fernandes, é acusado de receber propina diretamente das empresas vencedoras. Extratos bancários revelaram transferências de R$ 10.000,00 e R$ 3.000,00 da EDIFIKKA para a conta de Palheta, dias após a construtora receber pagamentos da prefeitura. Investigações apontam que Palheta chegou a recrutar seu enteado, Fernando Frota Lima Neto, para atuar como “testa de ferro” representando as empresas de Linhares nas licitações.

Vantagens Indevidas para o Prefeito

A investigação aponta que o prefeito Daniel Santos teria recebido vantagens indevidas de diversas formas. Uma delas, segundo as investigações, envolvia o pagamento de Aeronave Empresas com contratos com a prefeitura, como a DSL Construtora, R. Souza & Cia, Martins Engenharia e Everest Empreendimentos. Elas teriam realizado pagamentos de parcelas de uma aeronave particular adquirida por Daniel Santos, por meio de sua empresa Agropecuária J D EIRELI. A DSL, de Danillo Linhares, transferiu mais de R$ 1,7 milhão para a empresa de aviação.

O prefeito teria ainda adquirido um complexo de fazendas em Tomé-Açu por R$ 16 milhões. Parte do pagamento foi realizada por meio de transferências de empresas de Danillo Linhares (EDIFIKKA) e Silvair Dias Ladeira Júnior (JR Investimentos), que também possui contratos com o município.

Um empresário declarou ao MP que, para receber pagamentos atrasados da prefeitura, foi coagido a pagar pelo fornecimento de combustível e pela compra de uma retroescavadeira para a fazenda do prefeito.

Risco à Investigação e Afastamento dos Cargos

A decisão de afastar os agentes públicos foi fundamentada no “nexo funcional” entre os crimes e os cargos ocupados, e no risco de interferência na investigação. Segundo os autos, o Secretário Paulo Macedo teria alertado uma diretora financeira sobre “uma grande operação” e a necessidade de “ajeitar” contratos com “pontas soltas”, mencionando especificamente as empresas DSL e EDIFIKKA.

Além disso, há indícios de tentativa de obstrução da justiça. O prefeito Daniel Santos é suspeito de tentar forjar documentos para criar dívidas fictícias e, assim, justificar os pagamentos feitos por Danillo Linhares a uma testemunha. Outro fato que chamou a atenção foi a mudança de depoimento do empresário Ronaldo de Souza, que, após denunciar o prefeito, alterou sua versão em uma ata notarial. A investigação constatou que, nesse ínterim, sua empresa recebeu mais de R$ 736 mil da prefeitura.

O desembargador concluiu que o afastamento é necessário para “evitar a reiteração delitiva” e impedir que os cargos sejam usados para dificultar a colheita de provas.