SAÚDE PRECÁRIA

Vídeo: Moradores de Ananindeua denunciam PSM fantasma e cobram prefeitura

A estrutura, que deveria funcionar como referência na rede de urgência e emergência do município, permanece de portas fechadas para o público.

Moradores ouvidos pelo repórter confirmaram o grande elefante branco que se tornou o PSM de Ananindeua.

Em teoria entregue à população no dia 4 de julho de 2024, o Pronto-Socorro Municipal de Ananindeua, localizado na Rodovia Mário Covas, simplesmente não oferece o principal: atendimento médico emergencial. A estrutura, que deveria funcionar como referência na rede de urgência e emergência do município, permanece de portas fechadas para o público. Moradores denunciam o abandono da unidade, que ganhou o apelido de “pronto-socorro fantasma”.

A reportagem da RBA TV esteve no local na manhã de domingo, 20 de julho. Durante uma hora de observação, nenhum paciente foi visto chegando. Questionados pelo repórter Paulo Cidadão, servidores demonstraram resistência e não forneceram informações. Um funcionário, sob anonimato, confirmou a ausência da diretora e a inexistência de atendimento ao público.

Além do PS, outras unidades importantes da rede municipal — como o Hospital Anita Gerosa e o Centro Especializado em Hemodiálise (CEHMO) — também tiveram parte dos serviços suspensos pela prefeitura de Ananindeua. O cenário agravou denúncias de supostos desvios milionários de recursos públicos envolvendo o prefeito Daniel Santos (PSB), atualmente investigado. As operações seguem em curso.

Moradores ouvidos pelo repórter confirmaram o grande elefante branco que se tornou o PSM de Ananindeua. “Se a gente precisar de uma urgência, um socorro, nós não somos atendidos. Não vemos enfermeiros, médicos, movimento de funcionários. Já vi ambulância chegando, talvez seja de outro município, mas se a minha família precisar, aí não tem”, relatou um entrevistado, que não quis se identificar.

Outra moradora que também pediu para ter a identidade mantida em sigilo contou que lá só há atendimento se for por encaminhamento de alguma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). “Não é portas abertas”, confirmou a entrevistada.

Crise institucional e denúncias públicas

A situação do pronto-socorro não é recente. No dia 26 de março deste ano, o vereador Flávio Nobre (MDB) divulgou um vídeo mostrando os corredores do hospital completamente vazios. A gravação, compartilhada nas redes sociais, mostrava um prédio recém-reformado, mas sem qualquer movimentação médica ou fluxo de pacientes.

O vereador relatou que recebeu denúncias de uma mulher que, ao buscar atendimento para o marido em crise convulsiva, foi orientada a procurar outro hospital. O casal só conseguiu atendimento em Belém, no Pronto-Socorro da Augusto Montenegro.

Pedido de intervenção estadual

Em 13 de março, o procurador-geral de Justiça, César Mattar Jr., ajuizou pedido no Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) para que o governo estadual intervenha imediatamente na gestão da saúde de Ananindeua. O Ministério Público (MPPA) alega “crise sem precedentes” no município, com prejuízos diretos à população local e à de municípios vizinhos.

Durante a sessão legislativa de 1º de abril da Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), deputados estaduais também repercutiram o caso, cobrando explicações do prefeito. Fábio Figueiras (PSB) enalteceu o pedido de intervenção estadual na saúde pública do município feito pelo Ministério Público do Pará (MPPA), enquanto Eliel Faustino (União Brasil) destacou a contradição entre o custo da obra — cerca de R$ 20 milhões — e sua ociosidade. Já Iran Lima (MDB), líder do governo no parlamento paraense, foi direto e declarou que é “uma vergonha” administrar dessa forma.

Justiça impõe mordaça a vereadores

A crise se agravou ainda mais quando, no dia 9 de abril, uma decisão judicial proibiu os vereadores Flávio Nobre e Pamela Wayne, ambos do MDB, de realizarem novas fiscalizações nas unidades de saúde de Ananindeua sem autorização prévia. A liminar foi concedida a pedido do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Estado do Pará (Sindsaúde-PA), sob alegação de coação a profissionais.

A decisão do juiz Adelino Arrais Gomes da Silva inclui ainda a proibição de filmagens e transmissões dentro das unidades, sob pena de multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento.

Expectativas x realidade

No momento da inauguração, em julho de 2024, a prefeitura de Ananindeua divulgou que o novo pronto-socorro contava com 75 leitos (sendo dez de Unidade de Terapia Intensiva), e poderia atender cerca de 2.250 pacientes por mês. A promessa incluía atendimento de urgência, retaguarda obstétrica e centro cirúrgico.

No entanto, como aponta o vereador Flávio Nobre, nem mesmo pacientes em trabalho de parto são atendidos na unidade. “Mais de 500 mil habitantes em Ananindeua e não vi nenhuma grávida sendo atendida. Parece um pronto-socorro fantasma”, criticou.

Em requerimento apresentado à Câmara Municipal, o parlamentar cobrou da Secretaria Municipal de Saúde explicações sobre a baixa utilização da unidade, questionando inclusive se há omissão ou falta de gestão por parte da administração municipal.