
Se estivesse vivo, Raul Seixas completaria 80 anos neste sábado (28). Com uma trajetória de apenas 26 anos, o cantor deixou um legado que vai muito além da música. Autor de 17 álbuns e considerado o pai do rock brasileiro, Raul ainda é reverenciado por gerações, inclusive por uma legião fiel de fãs paraenses que cultivam o “raulseixismo” como uma filosofia de vida.
Entre os episódios mais extraordinários de sua carreira, um se destaca pela audácia: a turnê pelos garimpos do Pará, em 1985. Raul se apresentou em locais inusitados como Itaituba, Serra Pelada e o Garimpo do Marupá — este último, localizado no sudoeste paraense, às margens do rio Marupá, hoje com cerca de 7 mil habitantes.
A aventura foi marcada por apresentações sem estrutura, sem segurança e em cenários de completa instabilidade. Geradores falhavam, tiroteios ocorriam nos arredores e o clima de tensão era constante. Em Serra Pelada, Raul subiu ao palco diante de militares, garimpeiros e curiosos, enfrentando condições extremas.
Mesmo com a saúde fragilizada, o Maluco Beleza não fugiu ao compromisso. No entanto, a turnê foi um verdadeiro caos nos bastidores. A insulina usada por Raul foi confundida com drogas por militares, gerando um mal-entendido com o Exército. Em um dos episódios, um produtor foi agredido e acabou coberto de lama. No final, Raul saiu sem receber cachê, e a equipe teve que deixar o local às pressas.
Quem acompanhou tudo de perto foi Sylvio Passos, fundador do fã-clube oficial de Raul Seixas e amigo pessoal do artista. “Foi a aventura mais perigosa que vivi com Raul. A gente correu risco de vida real. Ele subiu no palco e cantou diante dos militares, num cenário completamente surreal”, relembra.
A experiência foi tão intensa que inspirou versos da canção “Banquete de Lixo”, do disco A Panela do Diabo:
“E lá em Serra Pelada, ouro no meio do nada / dor de barriga desgraçada resolveu me atacar…”
A banda, os bastidores e quem viveu essa história
Raul foi acompanhado por músicos como Nenê (baixo), Pavão (bateria) e o argentino Tony Osanah (guitarra). Também estavam presentes sua última esposa Lena Coutinho, o jornalista Pepe Escobar, a fotógrafa Cristina Villar e o empresário Gato Felix, dos Novos Baianos.
A jornada, que começou como mais uma etapa da carreira do Maluco Beleza, virou parte da lenda que é Raul Seixas. Em pleno garimpo, cercado de ouro bruto e caos, ele fez o que sabia melhor: subiu ao palco, enfrentou os riscos e eternizou mais um capítulo da sua história — agora parte também da história do Pará.