A 2ª Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) decidiu, por unanimidade, aceitar a denúncia do Ministério Público do Estado (MPPA) contra o pastor Washington Luís Araújo Almeida, por discriminação de pessoa em razão de deficiência — especificamente, transtorno do espectro autista (TEA).
O caso se refere a declarações feitas por Washington durante pregação religiosa no dia 12 de junho de 2024, em evento comemorativo aos 90 anos da Igreja Assembleia de Deus, em Tucuruí (PA). Diante de um público estimado em 5 mil pessoas e com transmissão ao vivo pelo YouTube, o pastor afirmou que “o diabo estaria visitando o ventre das desprotegidas” e que “hoje, de cada 100 crianças, quase 30% são autistas em vários graus”, associando o aumento do diagnóstico a “ventres manipulados”.
As falas geraram forte reação de mães e familiares de pessoas autistas. A presidente do Instituto de Defesa, Desenvolvimento e Apoio à Pessoa com Autismo do Sudeste do Pará (Ideasp), Genilza Sousa da Silva, mãe de uma criança autista, registrou boletim de ocorrência denunciando o conteúdo como capacitista e ofensivo.
O MPPA apresentou denúncia, mas a Vara Criminal de Tucuruí inicialmente a rejeitou, argumentando que, embora as falas fossem moralmente reprováveis, estariam protegidas pela liberdade religiosa. O juiz entendeu que não haveria dolo — ou seja, intenção clara de cometer crime.
Contudo, o relator do recurso no TJPA, desembargador Leonam Gondim da Cruz Jr., discordou. Em seu voto, destacou que o conteúdo da pregação violou os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da igualdade, reforçando estigmas e preconceitos contra pessoas com autismo. Para o magistrado, ao vincular a neurodivergência a forças demoníacas, o pastor praticou discriminação.
A decisão do TJPA reverte a rejeição inicial da denúncia e permite o prosseguimento do processo penal contra o pastor Washington Luís.