
Dentre as várias maneiras possíveis de comunicação do ser humano, a arte é frequentemente o meio escolhido por aqueles que desenvolvem habilidades específicas na área. Essa relação não é diferente entre pessoas que estão no espectro autista. Para algumas delas, a melhor forma de se expressar para o mundo se dá por meio das diversas manifestações artísticas existentes.
O multi-instrumentista Alan Cauê Oliveira da Silva, 18 anos, não tem dúvidas de que o lugar onde ele se sente mais à vontade é no palco. A proximidade com a música surgiu na vida do universitário ainda na infância e, ao longo de toda a vida, a dedicação ao aprendizado de diferentes instrumentos o levou a desenvolver outras habilidades, além das musicais.
“A música representa muita coisa, melhorou muito as minhas reações cognitivas de bom humor, de mudança de foco, mudou também o jeito da minha comunicação e da minha interação social porque eu sempre fui uma pessoa meio tímida, ainda tenho algumas dificuldades com isso, e a música sempre me ajuda”, relaciona Alan Cauê. “Quando eu estou no palco, eu nunca fico nervoso, eu sempre me solto muito. O palco é onde eu me sinto mais à vontade. Em nenhum momento da minha vida de músico eu fiquei nervoso”.
Além da interação social, Cauê conta que a dedicação à aprendizagem dos instrumentos também contribuiu para o desenvolvimento da coordenação motora e até mesmo de sua caligrafia, especialmente no caso do teclado, da bateria e da sanfona. Além deles, o jovem também toca violão e saxofone, mas foi o canto que despertou, pela primeira vez, a atenção de seus familiares para as suas habilidades musicais.
MÚSICA
“Eu já tinha o costume de ouvir música desde pequeno, mas aí, também eu cantava em karaokês. Eu comecei a cantar em karaokê com 8 anos e num dia eu estava cantando sem olhar para a letra e todo mundo ficou surpreso que eu conseguia”, lembra. “Mas, naquela época, eu não me imaginava tocando. Mas anos depois eu já consigo me ver naquele meio da música”.
Hoje, Cauê divide o seu tempo entre as duas faculdades que cursa, de fonoaudiologia e de música, e as apresentações musicais. Dentre elas, ele pode participar mais de uma vez do TEAlentos, festival organizado pela Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) com o objetivo de valorizar os talentos artísticos de pessoas autistas.
“Foi muito bacana porque o objetivo do TEAlentos era demonstrar os talentos de pessoas autistas para mostrar que não só as pessoas típicas têm seus talentos, as pessoas atípicas também têm os seus dons. E talentos também superam as dificuldades”.
Atento a cada passo do desenvolvimento do filho desde a primeira infância, Nilton Magalhães da Silva conta que percebeu, muito cedo, a habilidade especial de Cauê para a música. Em decorrência disso, ele conta que sempre buscou estudar o assunto e aproveitar o potencial do filho.
Entre as pesquisas realizadas, foi possível identificar que Cauê possui ‘ouvido absoluto’, como é chamada a capacidade auditiva de identificar cada uma das notas musicais que chegam ao ouvido. Ele aponta que Cauê consegue identificar até sete notas musicais ao mesmo tempo.
Testemunha da importância da música na vida do filho, Nilton não tem dúvidas da importância da arte para o desenvolvimento de qualquer pessoa. “Recentemente, em um congresso internacional, uma especialista que falou que ‘a educação das pessoas autistas reflete muito mais uma deficiência dos educadores do que dos alunos autistas’, apesar da gente reconhecer que muitos professores têm muita boa vontade, mas às vezes falta o conhecimento técnico mesmo porque, normalmente, os educadores são preparados e formadas para ensinar apenas para os típicos”, considera.
“Então, na expectativa que se avance mais nesse campo da educação, eu estou junto com ele, sempre atento, sempre tentando achar um caminho novo e a gente vê que a arte, especificamente a música, é um uma tábua de salvação. É onde ele passa a ter uma maturidade muito acima da média, é onde ele se desenvolve também muito acima da média, então, temos que aproveitar o ponto forte dele”.