Quem tem formação e busca cargos em engenharia, medicina ou oceanografia está com uma boa vantagem: essas ocupações estão entre as dez que ofereceram os maiores salários médios de admissão do país em 2024. O ranking ainda traz cargos como diretor de espetáculos e geofísico. Os salários iniciais vão de R$ 9,4 mil a R$ 13,7 mil.
Os dados, que mostram a remuneração média de cargos de entrada nas empresas, são do estudo “Raios X do Salário de Admissão em 2024”, elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. A análise considera o salário real de admissão, descontado da inflação medida pelo INPC, do IBGE.
Do acordo com a pesquisa, o salário médio de admissão no Brasil aumentou 2% em 2024, chegando a R$ 2.178, com crescimento na maior parte das ocupações. Em 2023, houve alta de 1,2%. Com isso, foram revertidas as quedas de 2022 (2,5%) e 2021 (4,6%).
O gerente de Estudos Econômicos da Firjan, Jonathas Goulart, explica que o aquecimento da atividade econômica observado ao longo do ano passado e a consequente melhora no mercado de trabalho, com o desemprego em mínimas históricas, geram uma demanda maior por mão de obra, o que acaba influenciando os salários oferecidos pelas empresas.
– A gente passou por um período de crise pós-Covid, e agora está no final desse processo de recuperação mais forte – diz Goulart. – A falta de trabalhadores vem sendo um entrave para os empresários nos últimos meses, o que aumenta os salários de admissão.
Ele cita dados do Novo Caged, que mostram que o saldo de novas vagas no Brasil foi de 1.693.673 em 2024. Diante da demanda por trabalhadores, o percentual de demissões voluntárias atingiu 36% no ano passado, o maior patamar desde o início da série histórica, em 2020. Goulart lembra ainda que em profissões ligadas à tecnologia, que exigem maior capacidade técnica, já há uma escassez, o que leva as empresas a oferecerem salários maiores com a economia mais aquecida.
Entre os grandes setores da economia, todos tiveram ganhos reais nos salários de admissão no ano, mas a média mais alta foi do industrial: R$ 2.310. A maior remuneração média inicial no setor foi registrada em Extração de Petróleo e Gás Natural, com R$ 9.104.
Os serviços vêm logo atrás, com R$ 2.250, ambos acima da média nacional. Nesse setor, os destaques são Atividades de Exploração de Jogos de Azar e Apostas (R$ 9.301).
– O crescimento das bets nos últimos anos acabou também aparecendo nos dados. E os trabalhos nessas bets são muitas vezes ligados a tecnologia, porque elas são todas on-line, então exigem qualificação profissional – explica Goulart.
Por outro lado, agropecuária e comércio apresentam salários de admissão menores, com R$ 2.011 e R$ 1.926, respectivamente. No caso do comércio, dizem especialistas, exige-se menos especialização, o que resulta em uma oferta maior de mão de obra. Já a agropecuária é uma atividade sazonal, com muitos trabalhadores temporários, o que pressiona os salários para baixo.
No recorte por estados, os maiores salários médios de admissão foram registrados em São Paulo (R$ 2.473), Distrito Federal (R$ 2.284) e Rio de Janeiro (R$ 2.223). O eixo Rio-São Paulo, diz Goulart, concentra muitas atividades econômicas, e a capital federal tem salários mais altos por conta do funcionalismo:
– São Paulo é o centro financeiro do Brasil. Então, a maioria das pessoas que trabalham nos escritórios das principais empresas, que têm os maiores salários, está lá.
Das dez profissões com maiores salários de entrada, sete são ligadas à engenharia. Esse cenário não mudou muito em relação à última pesquisa lançada pela federação, com dados de 2022, em que oito das dez eram nessa área. A média dos salários, no entanto, aumentou.
Engenheiros de computação lideram o ranking, com remuneração inicial média de R$ 13.794. Depois vêm engenheiros de minas, com R$ 13.055. Fechando o top ten , estão os engenheiros eletroeletrônicos, com R$ 9.489. A perspectiva de ganho pesa na hora de escolher uma profissão.
É o caso de Millena Silva, de 33 anos. Depois de ingressar no mercado de trabalho com um curso técnico de administração, ela decidiu recalcular a rota e estudar engenharia. Hoje trainee em uma empresa de construção civil, ela admite que os salários influenciaram:
– Teve um peso, sim. Sou nascida e criada em comunidade e queria mudar de vida. Passei a ter mais autonomia, a ajudar os meus pais com algumas contas, viajar e pensar na minha especialização profissional.
Outra carreira que segue essa linha é a de médicos clínicos. Historicamente há forte demanda por esses profissionais no Brasil, o que puxa os salários para cima.
Segundo Fabiane Borges, especialista em RH, outro fator que contribui para a maior remuneração de ocupações como engenheiros e médicos, além da demanda, é a especialização. Se, em média, o tempo para repor uma vaga é de 15 dias, no último ano, ela viu essas ocupações mais especializadas levarem em torno de 62 dias para serem preenchidas.
– O recurso que as empresas têm é o de pagar mais. De fazer hunting , como a gente chama, que é caçar esse talento no concorrente, fazer uma oferta maior para atraí-lo – conta Fabiane, acrescentando que esses profissionais também ficaram mais exigentes, buscando outros benefícios, como home office.
Já no caso de diretores de espetáculos, profissão que surgiu no ranking no último estudo, Bruno Imaizuni, economista da LCA Consultores, acredita que como não há muitas pessoas com essa ocupação no país, a amostra é pequena. Se alguns têm salário alto, mesmo que sejam poucos, a média fica elevada, mas isso não significa que o setor de teatro necessariamente paga bem. Mas ele cita outro fator:
– Em um momento do mercado de trabalho aquecido, as pessoas têm mais renda e destinam um pouco mais a sua renda para lazer. Isso pode estar aumentando a demanda por espetáculos e elevando a média (salarial) desses diretores.
Já para geólogos, oceanógrafos, geofísicos e afins, Imaizuni acredita que os maiores salários estão ligados à demanda de empresas como Petrobras ou Vale.
O geólogo Gregório Patrocínio Pedro, de 33 anos, não se arrepende da escolha que fez no vestibular, em 2008. Ele diz que ganha o suficiente, com o mercado aquecido desde seu primeiro emprego, o que atribui ao fato de o Brasil abrigar grandes mineradoras:
– A oferta de vagas e a remuneração foram fatores de impacto ao definir o curso. E isso se manteve ao longo do tempo. Meus colegas não se queixam de falta de vagas, sobretudo no petróleo e na mineração.
Este ano, no entanto, especialistas projetam desaceleração no mercado de trabalho, o que pode abaixar um pouco o salário médio de entrada de algumas ocupações.
Texto de: Mayra Castro (AG)