Um grupo de engenheiros italianos revelou nesta quinta-feira em um estudo o segredo de como cozinhar um ovo de galinha com perfeição. No trabalho, publicado na revista técnica Communications Engineering (do prestigiado grupo Nature), os pesquisadores mostram como contornar um problema clássico da culinária mundial: a gema cozinha mais facilmente do que a clara.
Obter o ponto de cozimento ideal para as duas partes do ovo é algo que desafia a culinária, o que levou à criação, por exemplo, do método francês sous vide, que consiste em manter os ovos por uma hora em temperatura abaixo do ponto de fervura, resultando em ovos cremosos, não firmes.
Mas mesmo essa técnica sofisticada, que ganhou popularidade entre chefs de cozinha, deixa a clara um pouco crua. O problema é que enquanto a gema cozinha a 65°C, a clara cozinha a 85°C.
A dificuldade de cozinhar os dois componentes no ponto ideal é um problema que interfere não só no sabor mas também no conteúdo nutricional, porque ovos hipercozidos perdem os nutrientes mais frágeis.
No novo estudo, os cientistas liderados pela engenheira química Emilia Di Lorenzo, da Universidade de Nápoles, descrevem o método que desenvolveram com uma análise detalhada da composição química, física e geométrica dos ovos.
“Descobrimos que é possível cozinhar clara e gema sem separá-las, a duas temperaturas, usando condições de contorno periódicas no problema de transporte de energia”, escreveu a pesquisadora no artigo. “O método não apenas otimiza a textura e os nutrientes do ovo, mas também é promissor para aplicações culinárias inovadoras e tratamento de materiais.”
Para controlar a distribuição de temperatura dentro do ovo, os cientistas usaram um processo de alternância de temperatura externa em diferentes períodos. Em outras palavras, o segredo para fazer o calor chegar no lugar certo e na hora certa era trocar os ovos periodicamente entre duas panelas.
Para achar o processo ideal, porém, os pesquisadores fizeram uma simulação computacional de dinâmica de fluidos que ocorre durante o processo de cozimento. No estudo, que apresenta todos os cálculos e compara a nova técnica com outros métodos convencionais, os pesquisadores mostram como atingir a perfeição.
A nova técnica foi batizada de cozimento “periódico”, por causa da necessidade de intervalos diferentes em recipientes diferente. O processo consiste em alternar um ovo entre uma panela de água fervente mantida a 100°C e uma tigela a 30°C, transferindo o ovo de uma para a outra a cada dois minutos.
Em testes e comparações com outras técnicas de cozimento, os cientistas demonstraram que esse método foi o mais eficaz em obter o ponto ideal para os dois componentes do ovo. A desvantagem é o tempo de cozimento. O processo todo demora 32 minutos e requer termômetro para manter a água em temperatura precisa abaixo do ponto de fervura numa das panelas.
Segundo Di Lorenzo, a sofisticação e o aparato necessários para criar a técnica ajudam a mostrar por que mesmo chefs com bom conhecimento de ciência ainda não tinham conseguido um truque para cozinhar ovos perfeitos.
“O design do processo e a simulação subsequente provaram ser fundamentais para a compreensão da física por trás do cozimento de um ovo e nos permitiram ajustar finamente os parâmetros do processo”, disse a engenheira.
Cada ovo cozido no experimento que testou técnicas convencionais e comparou-as ao cozimento periódico foi avaliado em 14 parâmetros. Alguns eram relativos ao sabor (acidez, amargor etc.), alguns à aparência (brancura, brilho etc.) e outros à consistência física (densidade, umidade etc.).
A contribuição da ciência para a culinária prova que nem sempre a criação de novas técnicas funciona só por observação. A própria noção de que a gema cozinha mais rápido do que a clara não é evidente para todo mundo, porque em um ovo frito a clara está em contato direto com a frigideira, e endurece antes da gema. No ovo cozido, em que o processo ocorre todo no invólucro da casca, calor se distribui de modo mais uniforme, e a gema endurece antes.
“A análise da cor, textura e consistência de todos os produtos de ovo foi apenas a prova final de um experimento de cozimento bem-sucedido que pode inspirar novas receitas sofisticadas”, diz ela na conclusão do estudo.
Os italianos não são os únicos a se mostrarem obcecados em usar a ciência para melhorar o sabor dos ovos. Existe na literatura científica algumas dezenas de estudos recentes, particularmente de pesquisadores chineses, descrevendo diferentes técnicas para melhorar a textura e o sabor do produto.
Um grupo da Universidade Jiangnan, por exemplo, desenvolveu um tratamento especial para claras cozidas usando enzimas especiais para quebrar proteínas, adaptando a técnica para uso com microondas. Outra equipe, da Universidade de Hubei, em Wuhan, diz ter conseguido melhorar o sabor de gemas salgadas tratando-as com um choque de ultrassom.
A beleza do estudo dos italianos liderados por Di Lorenzo é que sua técnica não requer equipamento muito sofisticado, apenas um termômetro de cozinha e um pouco de dedicação para manter constante a temperatura na panela da fase fria do cozimento periódico, a 30°C. (A panela dos 100°C é controlada pela própria ebulição.)
“Isso prova que o conhecimento da ciência por trás de problemas simples pode melhorar até mesmo os menores detalhes da nossa vida diária, como o simples ato de comer um ovo”, diz a cientista.
Texto de: Rafael Garcia (AG)