“Bora lá embaixo?”. Esta pergunta é praticamente um bordão de todo belenense quando quer ir ao comércio, especialmente na Rua João Alfredo. Por uma incrível coincidência, no Porto também há a Rua de Santa Catarina, uma espécie de “irmã gêmea” da João Alfredo.
Não bastasse a arquitetura ser quase idêntica, com casarões centenários, ao lado de modernas lojas, nas laterais e uma pista no centro, com uma ladeira ao fundo, a portuguesa também fica “lá embaixo”, por estar localizada na Baixa do Porto.
Quem chega à Rua de Santa Catarina, que existe desde o século XVII, usando o metrô, ainda tem um bônus especial. Ao subir pelas escadas de concreto ou escada rolante, ao sair do túnel já depara com uma vista impactante: a lendária Capela das Almas com imagens que contam passagens das vidas de São Francisco de Assis e Santa Catarina, pintadas em azulejos azuis e brancos.
Após o primeiro impacto, cada passo é uma descoberta em 1,5 quilômetro de extensão da Rua de Santa Catarina, entre as Praças da Batalha e do Marquês de Pombal e freguesias de Santa Ildefonso e Bonfim.
Ali estão o Centro Comercial Via Catarina, representando a faceta moderna do comércio portuense, vários brechós frequentados por todos os tipos de pessoas (de executivos engravatados a mochileiros e it girls tatuadas e com cabelos verdes, azuis e amarelos) e points históricos como a casa onde morou o escritor Camilo Castelo Branco, autor de “Amor de Perdição”, e a própria Capela das Almas, construída em homenagem a Santa Catarina.
O passeio reserva ainda outras surpresas: na descida, em uma via paralela, na Rua da Formosa, há a Pérola do Bolhão, uma mercearia que ainda conserva a fachada tradicional, em estilo Art Noveau, de quando abriu suas portas em 1917, vendendo chás, cafés, queijos e vários outros tipos de especiarias.
Voltemos à “irmã gêmea da João Alfredo” que o rolê ainda tem pelo menos dois lances históricos: o também centenário Café Majestic, um dos pontos de encontro de escritores, intelectuais e políticos famosos nas últimas décadas. O ex-presidente brasileiro Juscelino Kubitschek, por exemplo, sempre que passava pelo Porto fazia questão de ir até lá apreciar a gastronomia portuguesa.
Chegamos ao Grande Hotel do Porto e a pelo menos duas outras personalidades. O imperador D. Pedro II e o escritor Eça de Queiroz, autor de “O Primo Basílio”, “Os Maias” e “O Crime do Padre Amaro”, costumavam se hospedar no local, cercados de outros ilustres nomes da política e das letras internacionais. Há, inclusive, uma placa para lembrar da última vez em que o monarca, nascido no Rio de Janeiro, esteve no Porto, em 1889.
A Rua de Santa Catarina, como podem perceber, tem centenas de anos e quilômetros e mais quilômetros de histórias e estórias. Agora me deem licença que vou ali tomar um café com nata e descobrir mais algumas delas, enquanto mato as saudades da Rua João Alfredo aqui de mãos dadas com a “mana” dela.
Sérgio Augusto do Nascimento é um jornalista paraense que vive em Portugal. Foi repórter, editor e hoje é correspondente do DIÁRIO na Europa.