A dubladora paraense Eliane Flexa venceu a terceira temporada de “Quero Ser Dublador”, o único reality show de dublagem do mundo. Esta edição contou apenas com a participação de profissionais da dublagem, que têm registro de trabalho (DRT) de ator.
“Sou a primeira pessoa do Pará a participar do reality, contando as três temporadas. Isso é bem significativo, mostra como as pessoas do Sul e Sudeste acabam saindo na frente em estrutura e em oportunidades na área da arte. Então, para mim é muito gratificante ter participado e ter vencido, como paraense e como mulher mais ainda. Afinal, sou a primeira mulher vencedora desse programa, seguida pelo segundo lugar que também é feminino, Mariana Carsi, que foi minha companheira na equipe Titans. Isso é inédito no programa”, disse Eliane. Ela destaca ainda que as estatísticas mostram o quanto o audiovisual é um lugar masculino, no Brasil e no mundo.
“Tenho muitas amigas que desistiram da arte por ser difícil e por ser, muitas vezes, um ambiente machista. Por nós, mulheres, estarmos envolvidas em muitos contextos que dificultam nossa permanência no meio artístico. Então, espero que eu possa contribuir e mostrar, no meu ambiente de trabalho e no meu fazer artístico, o quanto nós, mulheres, somos qualificadas e merecedoras de estar em destaque na arte, além de em todos os ambientes que quisermos”, falou ela.
A terceira temporada do reality contou com 20 participantes e 12 episódios, com várias horas de talento, dedicação, garra e emoção registrados. Cada participante mostrou sua particularidade: histórias, sonhos, inseguranças, virtudes, alegrias e memórias.
“Me testei bastante na dublagem, não só no programa, como também em casa, estudando para me preparar para cada episódio. Vi que dublar é incrível, como eu já imaginava. Conheci tantos profissionais maravilhosos da área. Quando os encontrava, não conhecia, mas ouvindo eles falarem, reconhecia as vozes, vozes que fizeram parte da minha infância”, contou a dubladora.
Por exemplo, Eliane destaca Luiz Antônio Lobue, que fez a voz do Pícollo, de “Dragon Ball”. “Ele e a Marcela Almeida me salvaram no terceiro episódio: me escolheram como o destaque do dia”, falou Eliane. Ela foi salva durante a atração, num desafio, pelo César Marchetti, um dos gigantes da voz original, além do programa ter permitido um bate-papo com Bruna Mascarenhas, de quem ela é fã.
“Quem fazia nossos depoimentos era o Victor Moreno, o Bond de ‘SpyxFamily’. Ele virou meu amigo. Estávamos outro dia jogando jogos de tabuleiro com outros amigos do programa. Saímos para confraternizar depois da final e eu estava na mesa com o Felipe Grinan, que me dirigiu no programa e faz várias vozes icônicas. Agora, o Bruno Sangregorio, voz do Levi, de ‘Attack On Titan’, me responde no no WhatsApp. Vocês imaginam a emoção de tudo isso?”, comemorou.
“Pude receber conselhos e aprender com cada uma dessas figuras, que estão muito adiante na mesma estrada que quero trilhar. Foram tantas experiências e aprendizados gratificantes. Eles me confirmaram que sim, a dublagem é para mim. Então, foi uma experiência surreal. Até hoje acho que ainda não processei direito a dimensão de tudo o que eu vivi, foi incrível”, contou ela.
A terceira edição de “Quero Ser Dublador” contou com a fase de inscrições, por vídeo. Nesta fase, passaram 40 pessoas. Depois veio a fase da entrevista presencial, onde passaram 20.
Disputa em grupos com muita troca
A partir da seleção desses 20 concorrentes, veio o primeiro episódio, no qual teve uma dinâmica de dublagem igual para todos. Daí em diante, 8 pessoas foram cortadas e sobraram 12.
Eliane foi para a final com a dubladora Mariana Carsi, saiu campeã e ganhou uma bolsa integral para realizar o curso de especialização em dublagem da Dubrasil, o qual conta com diversas formas de dublagem.
Como por exemplo, canto em dublagem, também locução, voz original, entre outras vertentes do trabalho como ator de voz. Ela ganhou também uma bolsa para um curso livre de edição de vídeo, uma mentoria com qualquer professor da Dubrasil, além do troféu de 1° lugar. Ainda levou para casa vários brindes geeks.
“Cada episódio tinha uma dinâmica de dublagem em grupo. Depois que foram saindo as equipes, foram as dinâmicas individuais. Os jurados salvavam uma pessoa e mandavam duas para eliminação. Até que só restaram as finalistas. Fomos eu e uma mulher sulista, foi Norte contra Sul”, contou ela, que se interessa por dublagem há bastante tempo. Em 2017, Eliane fez uma oficina de dublagem no Núcleo de Oficinas Curro Velho, com o ator e dublador AJ Takashi, paraense e ex-aluno da Dubrasil. Dessa oficina de duas semanas, teve a oportunidade de trabalhar com voz original.
Fiz o teste para a série [de animação] ‘Brinquedonautas’, do estúdio Iluminuras. Passei para um dos protagonistas, um menino chamado Zeca, além de algumas vozes secundárias, que fiz no processo. Fiz voz original para outro menino protagonista em uma série gravada em Belém, mas para um estúdio de São Paulo, a qual não posso dar mais detalhes, por não ter sido lançada ainda”, relembrou ela.
CONEXÃO PARÁ
Radicada em São Paulo há um ano, Eliane veio a Belém em 2024 para fazer parte da terceira série de animação como voz original da sua carreira, realizando um personagem da série “A Sensacional Vila da Barca”, também do Estúdio Iluminuras.
“A voz original foi uma grata surpresa na minha vida, mas lá em 2017 nem pensava nisso, pensava na dublagem. Mas a dublagem só deixou entrar nela agora, oito anos depois. De fato, dublar é incrível, como já imaginava”, destacou ela, que planejou mudar para São Paulo pelas oportunidades no meio artístico, que são mais abrangentes e valorizam financeiramente melhor.
“Sou uma atriz com 12 anos de carreira em Belém. Já fiz de tudo: teatro, teatro musical, voz original, audiovisual, já fiz minha própria obra audiovisual, ganhei prêmio de atuação pela minha primeira protagonista em um longa-metragem, protagonizei um curta-metragem exibido em Portugal, faço parte da história da animação paraense como a primeira diretora de animação 2D do Pará. E em praticamente todos estes trabalhos, não fui paga ou recebi bem pouco”, disse ela, emendando que na capital paraense era insustentável viver de arte, e que sempre teve que ter outros trabalhos para suprir suas necessidades financeiras.
“Vim para São Paulo na esperança de poder ser somente artista e construir uma carreira que pague o bastante para viver somente dela. Em um ano e meio aqui, já ganhei mais dinheiro com arte do que nos doze anos de arte em Belém. Esse recorte é muito triste para a nossa sociedade. Por isso, são tão necessários os editais, leis de incentivo, fomentos e projetos públicos e até privados que auxiliem a arte e os artistas a serem valorizados na nossa terra”, finalizou ela.