Belém - Belém completa 409 anos neste 12 de janeiro, carregando em suas ruas, praças e mercados o peso de uma história rica, repleta de cultura e tradição. Em meio ao cheiro do tucupi, o descascar das castanhas e ao colorido das frutas, o Complexo do Ver-o-Peso segue firme como o maior mercado a céu aberto da América Latina. Localizado às margens da baía do Guajará, o mercado é como um coração pulsante da capital paraense.
O local é um verdadeiro monumento de resistência e tradição, movido pelo trabalho direto e indireto de cinco mil pessoas que, diariamente, fazem dele um ponto de encontro entre o passado e o presente de Belém. E, a mais de quatro séculos da cidade, o Ver-o-Peso não é apenas um símbolo econômico e turístico, mas também uma celebração da identidade paraense.
No box 17, Davi Furtado Buriti, de 84 anos, trabalha há 58 anos vendendo farinha no Ver-o-Peso. Ele nasceu em Bujaru, nordeste do Pará, mas chegou ainda garoto em Belém, em busca de oportunidades. Antes de se estabelecer como feirante, foi militar.
“Quando saí do exército, fiquei sem rumo, mas conheci gente que trabalhava aqui. Comecei com farinha e nunca mais saí. Isso aqui representa tudo pra mim”, contou.
José Flávio da Silva, de 64 anos, também tem uma longa história com o Complexo. Ele chegou no mercado há 45 anos, vendendo hortifruti. Morador de Marituba, ele sai de casa às 5h da manhã para estar na banca cedo. “Parei de estudar para ajudar em casa. O Ver-o-Peso me acolheu e é onde construí minha vida”, relembra. Como presente para a cidade, ele destaca a importância de valorizar o mercado. “O Ver-o-Peso é um símbolo de Belém e merece mais atenção de todos. Sem ele, eu não teria chegado onde cheguei”, diz.
Para aqueles que carregam anos de Ver-o-Peso, o local se tornou um lar. É o caso de Maria Orlandina Corrêa, 72. Antes de trabalhar no mercado, há quase 50 anos, sua experiência profissional era como trabalhadora doméstica. Com o tempo, Maria encontrou no Ver-o-Peso espaço para ter uma condição financeira melhor. Inicialmente vendendo produtos hortifruti, como tomate e cebola, ela foi adaptando suas atividades até chegar ao comércio de molhos em geral, que hoje são sua marca registrada.
Trabalhando nos boxes 62 e 63, Roni Rocha, natural de Tocantins, chegou a Belém aos 18 anos de idade, trazendo consigo a experiência de trabalhar na roça. Com 48 anos, ele já acumula quase 30 anos de dedicação ao trabalho no Ver-o-Peso, onde iniciou sua trajetória com ervas e simpatias. “Tudo que sei aprendi aqui. Graças aqui pude formar minha esposa e filho, ter minha casa e tantos outros bens. O Ver-o-Peso é mais do que um mercado, é um lugar de aprendizado e encontros”.
E para o aniversário da cidade, entre as ervas que ele considera essenciais, o destaque vai para o “cheiro do Pará”, típica que, segundo ele, é a cara de Belém e representa a força e a energia local. Roni também sugere banhos e óleos para atrair boas energias, o “abrir caminhos” e o “prosperidade”. O óleo de prosperidade é uma forma de renovar as forças para um futuro mais próspero, tanto para o mercado como para os que nele trabalham.
Assim, aos 409 anos, o presente ideal para Belém é o reconhecimento ainda maior dos trabalhadores. “Somos a alma desse lugar e queremos mais apoio para continuar mantendo essa tradição viva”, ponderou Roni.
Gorete Sena, de 58 anos, está no mercado há 20 anos. Antes especializada em produtos de mercearia como feijão, arroz, macarrão e óleo, ela percebeu a crescente demanda por cachaça de jambu e castanhas, e decidiu focar nesses produtos. A cachaça de jambu, em particular, ganhou destaque em sua banca, se tornando um grande atrativo para os visitantes.
Para a autônoma, o Ver-o-Peso é mais do que um mercado, “é fonte de sustento e a base da minha estabilidade financeira. Através da banca, sustentei meus filhos, que já trabalharam aqui também, e pude contribuir na criação dos netos”, comenta. Ela sente que o Ver-o-Peso representa “tudo de bom” em sua vida, mas também faz um apelo por melhorias no espaço, especialmente no que diz respeito à segurança.