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Reunião de cúpula Celac em Buenos Aires

Foto: Ricardo Stuckert/PR
Foto: Ricardo Stuckert/PR

Félix Gerardo Ibarra Prieto*

Semana passada, os países latino-americanos se reuniram em Buenos Aires (Argentina) – Reunião de Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) – nos dias 23 e 24 de janeiro de 2023. Algumas novidades importantes puderam ser observadas nessa última reunião.

A rebelião dos pequenos, principalmente do Uruguai, por meio do seu presidente Luís Lacalle Pou, e respaldado no discurso, pelo presidente Mario Abdo Benítez do Paraguai: “Paremos com os discursos floridos e bonitos que não trazem resultados para ninguém” – falou Lacalle Pou. Todos ficaram de olhos arregalados, principalmente os dois grandes, Argentina e Brasil, que continuam querendo fazer dessas cúpulas um palco para defender ditaduras que eles enfatizam condenar desde que não sejam da sua ideologia (Cuba, Nicarágua e Venezuela).

Em primeiro lugar, Lacalle Pou foi muito claro, preciso, conciso, seguro e eficaz em seu discurso “integração em base a ideologias não funciona” e por que não funciona? Porque ideologias mudam com o governo e a integração se estanca. A ideia da integração deve levar em conta a soma de todas elas e ir trabalhar nela como Estado-Nação, acrescentou Lacalle Pou. Se a ideologia de turno comandar a integração, ela vai ser um negocio a curto prazo.

A integração é tudo, menos a curto prazo. UE começou quando? Tem seu embrião em Benelux (1945). Especificamente o MERCOSUL iniciou em 26 de marco de 1991 com o nome de Tratado de Asunción, justamente quando o Uruguai era comandado pelo pai de atual presidente, o Luís Alberto Lacalle. Eu me lembro até hoje do seu discurso, e é basicamente o mesmo do atual presidente, seu filho. “Não adianta discurso, as pessoas querem resultados concretos”, ou seja, vamos para o que interessa.

Cabe acrescentar que, neste momento, Uruguai quer negociar diretamente e de forma unilateral com a China, sem sair do bloco. Disse claramente que o modelo atual deve ser dinamizado e modernizado, porque está ultrapassado. Está contaminado por ideologias também ultrapassadas assim como de governantes ultrapassados. Brasil de Lula sempre deu mais importância para os vizinhos, sabe que, em termos de poder, isso é fundamental. Ninguém lidera sem ajudar, sem gastar, sem fazer o supermercado. Uma potencia regional tem essa obrigação política, contudo deve ser mais pragmático e menos ideológico.

Seguidamente, Brasil ficou tão preocupado com a rebelião charrua – uruguaia – que teve que ir a Montevideo para fazer uma reunião bilateral e oferecer alternativas. Uruguai deixou clara a teoria dos interesses não existe amigos nem inimigos eternos, existem interesses eternos.

Lula deu o que podia, falou fazer a aproximação e negociação com a China, depois de concluir a negociação MERCOSUL-UE, que está parada há muitos anos, por conta da negativa do governo brasileiro anterior em temas ambientais. Bolsonaro chegou a anunciar esse acordo como finalizado, porém a França logo percebeu que havia outras barreiras não superadas e arredou.

Por outra parte, Paraguai não tem acordo diplomático com a China e sim com Taiwan. Aquilo que no jargão diplomático chamam de diplomacia do talão de cheque, modernizando a expressão, seria diplomacia do Pix. Taipei faz esse tipo de acordo, outorgando créditos brandos e a longo prazo, quase uma doação, principalmente a países pequenos para poder lhe dar apoio nos fóruns internacionais. É uma questão de interesse.

Paraguai também tem interesses mútuos com Argentina e Brasil em matéria energética (Itaipú e Yacyreta), assim como de diásporas (paraguaios na Argentina e brasileiros no Paraguai). Enfim, a integração informal já existe há décadas, só precisa ser formalizada. A formalidade não pode ser cara, caso contrário, floresce o descaminho e o contrabando. Atualmente, há tantas coisas (produtos) na lista de exceções que é melhor desistir.

Para finalizar, a integração é uma decisão política de estado. O princípio da integração é a solidariedade, significa que os maiores ajudam os menores, assim como na Europa ajudaram Portugal, Espanha e Grécia para poder se desenvolver minimamente e caminhar com Alemanha e França. Daí a surpresa do grito de Uruguai, que percebeu que não está ganhando nada com isso e quer mais. Muito dos resultados entre os países do MERCOSUL é por sua mera aproximação geográfica e não pelo Tratado. Brasil e Argentina têm subido as tarifas externas comuns em quase 30%. Integração não rima com tributação.

Falar em democracia, direitos humanos e respeito às instituições é muito bonito, mas na turma tem muita gente que não faz isso, mas sai na foto, assina os 100 pontos e as 11 declarações especiais como se respeitasse esses valores convencionados e assinados. Falamos de Cuba, Nicarágua e Venezuela. Só o primeiro compareceu, os dois últimos não viajaram com medo de serem presos, justamente por não respeitar as instituições democráticas nem muito menos os direitos humanos.

Para concluir, Latinoamérica precisa abandonar os intentos de integração, precisa ultrapassar as fronteiras físicas e procurar resultados concretos que levem o que todos esperam, que é a finalidade de todos os processos: o bem-estar social e económico dos povos. Isso não se consegue com barreiras tarifarias, nem com barreiras de integração entre os blocos e países.  Por enquanto, a integração plena só existe para o crime organizado que não visa ideologia e trabalha a longo prazo.

A integrarão atual não vale nem para os estudantes de pós-graduação, que não conseguem superar sequer a barreira corporativa das associações de classe, principalmente do Brasil. Não conseguem convalidar seus diplomas, pese aos tratados existentes e assinados, porque, na hora da regulamentação, nada muda. Não há avance para quase nada, principalmente fora do campo econômico.

O atropelo às instituições que aconteceu no Brasil no dia 08/01/2023, muito criticado pelo atual governo brasileiro, deveria servir para abrir os olhos dos amigos que fazem isso todos os dias para se manter no poder.

Como falou o presidente do Paraguai: “A eleição da apenas origem ao regime democrático, depois deve continuar com o respeito às instituições, os direitos humanos e a separação dos poderes”. Em Cuba, não tem nem eleição, mas sai na foto, assina, dá tapa nas costas dos outros mandatários e, quando chega a La Havana, persegue e prende os que apenas reclamam. Hipocrisia.

 

Félix Gerardo Ibarra Prieto* é empresário e professor universitário. Mestre e doutor em Relações Internacionais (UAA). Professor titular da Unama (2006-2018) e coordenador do curso de RI da mesma universidade (2008-2012). É diretor e fundador da rede Castilla Idiomas do Brasil desde 1996.