Passados 36 anos da instituição da data de 1º de dezembro como o Dia Mundial de Luta Contra a Aids, muita coisa mudou na vida de quem convive com a síndrome. Com o avanço dos tratamentos, já é possível, há algum tempo, ter qualidade de vida e uma vida saudável independente do diagnóstico – e até mesmo um status indetectável da doença.
Todas essas mudanças positivas, no entanto, não alcançaram plenamente a parte que diz respeito ao estigma e ao preconceito, ainda extremamente prejudiciais em todo e qualquer aspecto do dia a dia de quem precisa conviver com uma condição crônica.
Assistente social e tesoureira da ONG Paravidda, que funciona no bairro do Jurunas desde 1992 prestando assistência a quem convive com HIV/Aids, é categórica: é perfeitamente possível conviver com a doença, mas não com o preconceito e a discriminação.
Ela aponta como outras mudanças palpáveis o acesso aos diversos métodos de prevenção e combate ao mal, tais como a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), a Profilaxia Pós-Exposição (PEP), além de vacinas, campanhas, oficinas.
Eliane garante que, com o avanço dos tratamentos antirretrovirais, a vida de quem tem acesso regular às medicações necessárias tem melhorado significativamente.
“O uso contínuo e correto desses medicamentos é crucial para manter a carga viral indetectável, o que reduz a transmissão do vírus, melhora a qualidade de vida. Além disso, o tratamento reduz o risco de complicações e infecções oportunistas, diminuindo a necessidade de internações hospitalares”, lista a assistente social. “O acesso regular ao tratamento antirretroviral transforma a vida das pessoas com HIV, permitindo que vivam vidas plenas e produtivas e felizes”, pontua.
No entanto, apesar das melhorias, os desafios ainda são muitos, visto que nem todo mundo consegue fazer uso dos medicamentos da forma ideal, especialmente em regiões com recursos limitados.
“Não vamos ter esquecer que a pandemia de COVID-19 agravou a situação, tornando mais difícil o acesso aos serviços de saúde e aumentando a vulnerabilidade das pessoas vivendo com HIV”, pondera. “E para além das
desigualdades sociais e econômicas ainda há barreiras relacionadas a informação e conscientização, o que pode levar a diagnósticos tardios e tratamentos inadequados”, explica.
Para Eliane, este 1º de dezembro precisa ser uma data de combate ao estigma envolvendo a doença. “Estudos mostram que uma grande parte dessas pessoas enfrenta discriminação em várias formas, como assédio moral, exclusão social, perda de emprego e até agressões físicas”, lamenta.
Há vida após o diagnóstico
Rui Guilherme*, 33 anos, convive com a Aids desde 2015, quando teve o diagnóstico. Ele não é paraense mas acabou achando na ONG Paravidda um local de acolhimento que se tornou fundamental para o entendimento sobre como lidar com a condição.
“Posso dizer que hoje eu considero viver bem, acho que até um pouco melhor, mais regrado, mais atento às questões de saúde. Quando eu tive o diagnóstico e comecei o tratamento o protocolo era diferenciado. Comecei [o tratamento] nove meses depois da confirmação, e em maio de 2017 a doença já era indetectável”, resume ele, que diz ter uma rotina normal: trabalha, viaja, se relaciona, e tem um dia a dia sem abstenções.
“Reconheço que isso é, sim, uma questão que afeta muito muitas pessoas. Hoje no Brasil tem mais de um milhão de pessoas vivendo com HIV e Aids, e eu sei que essa realidade não é igual para todos, mas no meu caso eu vivo bem”, relata.
Ele faz questão de reforçar que o preconceito ainda é muito real, e provavelmente o maior desafio na vida de quem tem HIV/Aids. “Em ambiente de trabalho, na família, na sociedade no geral, muitas vezes quando a gente vai buscar atendimento no serviço de saúde, o maior desafio é o preconceito com toda certeza, e eu costumo dizer o seguinte, é possível viver com HIV-AIDS, o que não é possível é viver com o estigma e preconceito”, confirma.
Para Rui Guilherme*, o futuro, com tratamentos mais avançados vai garantir qualidade de vida cada vez maior aos pacientes.
*O entrevistado pediu para usar o pseudônimo de Rui Guilherme em homenagem a um paciente assistido pela ONG Paravidda, já falecido, e que será homenageado em breve tendo um auditório no local em seu nome.