As praças do centro de Belém desempenharam um papel histórico na urbanização da capital paraense. Juntas, a praça Batista Campos e a Praça da República, marcam a expansão geográfica da cidade que, impulsionada pela economia da borracha, durante a Belle Époque, crescia rapidamente em direção contrária ao rio. É nesse cenário que surgem os passeios públicos com finalidade de gerar entretenimento para a alta sociedade da época. Com o tempo, o entorno desses espaços também alojaram outros meios de lazer, ocasionando o processo de pavimentação das principais vias do município.
Ambas as praças fazem parte do projeto arquitetônico do plano do então intendente Antônio Lemos , que ocupava um cargo equivalente ao de prefeito. O objetivo era criar áreas de convívio social que lembrassem praças, jardins e parques aos moldes europeus, que também viviam a “Idade de Ouro”, no intuito de transformar a cidade de Belém em uma “Paris na América”. Além da arquitetura francesa, a presença de árvores frondosas, lagos artificiais e o contato com animais da região amazônica garantiam um aspecto de higienização dessas áreas.
BATISTA CAMPOS
A história da praça Batista Campos inicia no século XIX, quando o grande terreno era propriedade privada de Maria Manoela Figueira de Salvaterra, a qual batizava o então “Largo de Salvaterra”. Nesse período, a praça era um descampado localizado na área mais afastada dos bairros centrais de Belém, Cidade Velha e Campina, e do Igarapé do Piri. Após a morte da proprietária, o local passou a ser administrado pela Câmara Municipal de Belém, que depois de alguns melhoramentos a nomeou de “Praça Sergipe”, em homenagem à recém-criada província brasileira, em 1820.
Foi apenas em 1897, durante o governo de Antônio Lemos, que a praça ganhou a estrutura arquitetônica que dura até hoje. Durante a reestruturação, a praça recebeu nova denominação, passando a ser chamada de “Batista Campos” em homenagem ao Cônego Batista Campos, líder intelectual do movimento da Cabanagem, ocorrida de 1835 a 1840, na antiga província do Grão-Pará.
“É interessante perceber o uso desse local quando era apenas um terreno: algumas partidas oficiais de futebol aconteceram ali. A política de urbanização de Antônio Lemos, no tempo da Belle Époque, vai fazer com que a praça se torne um jardim, um passeio público aos moldes europeus. Então, toda uma mobília foi importada para Belém para dar esse clima romântico, como os próprios coretos. Esse espaço também vai ser um jardim que foge dos tradicionais jardins com gradil, sendo um espaço democrático”, explica o historiador Márcio Neco.
Com a exploração acelerada do látex, durante o ciclo da borracha, Belém passou diversas transformações geográficas, econômicas e arquitetônicas por volta de 1880 a 1920, durante a chamada “Belle Époque”. Nesse período, a borracha financiou um modelo de urbanização europeia, com traços da arquitetura francesa, caracterizada pela ideia do sanitarismo. As praças seguem essa mesma finalidade: um espaço para passeios da sociedade burguesa, as famílias dos grandes barões da borracha.
Em 1904, a praça ganha estrutura mais robusta com influência de elementos arquitetônicos do estilo Art Nouveau, que valoriza os elementos naturais, como flores, plantas e linhas curvas. Isso se espelha no coreto central, com base de alvenaria, parte superior feita de ferro da Alemanha e ornamentação de cisnes, além das pontes, córregos e chafariz.
“A sociedade do século XIX dialoga com esse espaço como uma espécie de refúgio da cidade, que começava a crescer. A arquitetura da praça é convidativa para isso: os caminhos, as pontes sobre os lagos e os coretos trazem um clima romântico da época. A praça cumpre esse papel de espaço em que eles mostram o seu poder e o sucesso econômico”, revela o historiador.
Ao longo do tempo, a praça Batista Campos se consolidou como um dos principais cartões-postais de Belém. Em 1983, o espaço é tombado pelo município, enquanto em 2005, foi concedido o título de praça mais bonita do Brasil. Já em 2008, foi formada a Associação Amigos da Praça, com moradores do entorno, no intuito de fiscalizar, conservar e promover pequenas atividades. Atualmente, o espaço cumpre um papel importante de sociabilidade, preservação e arborização de um dos bairros mais verticalizados de Belém, na atual área central da cidade, a Batista Campos.
REPÚBLICA
A atual Praça da República foi um grande descampado desde a fundação de Belém, em 1616. Com o tempo e o crescimento urbano, aquela região, que hoje está centralizada entre os bairros da Campina, Nazaré e Reduto, passou a ser chamada de Largo da Campina. Posteriormente, entre os séculos 18 e 19, foi erguido um armazém no local para guardar munição e pólvora, o que lhe rendeu uma nova denominação: Largo da Pólvora. Com a Independência do Brasil, em 1822, o terreno sofreu intervenção e passou a homenagear Dom Pedro II.
Entretanto, as mudanças mais expressivas são datadas na Belle Époque, quando novamente Antônio Lemos interveio no local. Juntamente com a reestruturação da praça surgem outros imóveis no entorno, como o Theatro da Paz, Cine Olympia e o Grande Hotel. De um local de passagem, o terreno passa a formar um complexo sócio cultural, onde a população burguesa tinha acesso a momentos de entretenimento, com grandes espetáculos, exibição dos primeiros filmes e a degustação do café e sorvete oferecidos pelo hotel.
“Esta praça vai dialogar com o entorno, que também estava em construção, com a finalidade de criar um local de passeio para a sociedade da Belle Époque. Por isso, Antônio Lemos chega a decretar que a Praça da República fosse única e exclusivamente para isso, sem nenhum outro tipo de atividade e a determinação vai vigorar por bom tempo. Então, todo esse espaço se torna um local de convívio da sociedade da Belle Époque, que costuma se vestir bem, com as suas sombrinhas, para andar por esses espaços”, esclarece Márcio Neco.
Em 1889, com a Proclamação da República, a praça passa a homenagear a nova forma de governo, em um movimento político de apagamento das referências à monarquia. É nesse período que o espaço ganha um dos únicos monumentos do Brasil em alusão ao período republicano, com a presença da estátua Marianne, ao centro, representando a República. Em 1970 que a praça ganhou a disposição atual, com a venda dos mais diversos tipos de artesanato e apresentação aos domingos. Hoje, a atividade desenvolvida extrapola a esfera social e cultural, se fixando como uma importante fonte de renda para trabalhadores como artesãos, artistas e autônomos.