DIA DAS CRIANÇAS

Turma da Mônica: entre laços, lições e aventuras

A nova safra audiovisual da turminha carrega consigo uma nostalgia, ao mesmo tempo que revitaliza o gênero no cinema brasileiro.

"Laços", de 2019, inaugurou a nova fase da Turma da Mônica - Foto: Divulgação
"Laços", de 2019, inaugurou a nova fase da Turma da Mônica - Foto: Divulgação

O bairro do Limoeiro é um lugar mágico, perdido no tempo. É o céu das crianças. Onde elas são livres para brincar, crescer, fazer amizades e descobertas. Brigar também, chorar. Faz parte de um necessário processo de amadurecimento. Mas, claro, envoltas por uma cápsula de proteção – ou seria máquina do tempo? – que faz com que qualquer tipo de ameaça seja cartunesca. A essa cápsula também podemos dar o nome de nostalgia, memórias de uma infância vivida exatamente assim, na rua com os amigos, sem preocupações, numa completa aversão à modernidade de celulares, TVs ou videogames. Apenas bolando planos infalíveis, montando clubinhos com a nossa turma e explorando as redondezas, onde transitam figuras hoje idílicas, como o vendedor de balão, o tio da banca de jornal e o pipoqueiro.

Essa ambientação é o maior acerto da nova safra audiovisual da Turma da Mônica. Quando “Laços” foi lançado, em 2019, o pai da turminha, Maurício de Sousa, não chorou à toa, pois o diretor Daniel Rezende capturou com precisão o espírito das historinhas criadas por ele décadas atrás. E o fez tão bem que conquistou tanto o público infanto-juvenil quanto aqueles que cresceram na companhia desses personagens. Até mesmo quem, porventura, não teve uma infância feliz, há de esboçar sorrisos e olhares marejados com a ingenuidade e o coração deste filme. “Quando as crianças brincam / E eu as oiço brincar, / Qualquer coisa em minha alma / Começa a se alegrar”, já dizia o poeta Fernando Pessoa. Ele simplesmente nos faz bem.

Inspirada na graphic novel dos irmãos Lu e Vitor Caffagi, a trama é direta: alguém raptou o Floquinho, o cachorrinho do Cebolinha, e a turma toda parte em uma missão de resgate em que precisarão entender o verdadeiro significado de companheirismo e amizade. O roteiro é bem linear, afinal a complexidade aqui só atrapalharia. Ainda assim, a sensibilidade no tratamento dos temas propostos é tamanha que as entrelinhas do filme afloram e o destaca em meio a tantas produções do gênero. Essa sensibilidade está na direção, na trilha sonora, na direção de arte, na montagem. Cada detalhe foi trabalhado com um esmero impressionante.

Rodrigo Santoro como o Louco, em rápida, porém marcante aparição em “Laços” – Foto: Divulgação

Aliás, a cena com o Louco na floresta é, desde então, uma das minhas favoritas do cinema nacional. A atmosfera onírica e a interpretação de Rodrigo Santoro são definitivamente marcantes. Fora que Daniel Rezende dá uma aula de como fazer fan service, inserindo organicamente na trama elementos e personagens clássicos dos quadrinhos para nosso deleite, sem que jamais isso interfira no ritmo ou mesmo tire o foco da história principal – ao contrário, praticamente todos fazem a trama andar, como na distribuição de folhetos do Floquinho. Ali, ao reconhecer o universo da Turma da Mônica, não há como não se emocionar.

Bom, até teria como não se emocionar, mas só se a produção errasse em um aspecto fundamental: a escolha do elenco. Não foi o caso. Faço aqui um mea-culpa. Disse ali em cima que a ambientação foi o maior acerto da nova safra do “Mônicaverso”, mas certamente é preciso dividir o mérito com Giulia Benitte, Kevin Vechiatto, Gabriel Moreira e Laura Rauseo. Não é fácil assumir personagens amados por milhões de pessoas, que vivem no nosso imaginário por praticamente toda a nossa vida. Mas, sim, quando os vemos na tela, acreditamos que eles são Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali. E isso é um feito gigantesco. Não é à toa que o quarteto seguiu na ativa na continuação, “Lições”, de 2021, e em “Turma da Mônica – A série”, em oito episódios, de 2022.

“Lições” não só mantém a aura do filme original, como expande o universo da turminha – Foto: Divulgação

“Lições” também é baseado em uma graphic novel dos irmãos Caffagi. Ao contrário de “Laços”, que jogou em terreno seguro, aqui o filme expande o universo da turminha, traz mais conflitos e, sim, se afasta do clima infantil das HQs para apostar no amadurecimento que uma boa dose de dramaticidade/complexidade daria aos personagens. É uma ousadia? Sim, mas que dá muito certo. Parte disso pela conexão que já temos com eles. Seja pelo envolvimento em “Laços” ou pelo próprio background de anos como leitores de Mauricio de Sousa. Afinal, quem nunca imaginou histórias como aquela trazida por “Lições”? Assim, as jornadas de cada um dos personagens principais (que aqui têm mais espaço para brilhar individualmente e não fazem feio) nos pegam de jeito.

Claro que “Laços” precisou pavimentar esse caminho. Se o primeiro era um filme, ainda que excelente, muito mais de reverência à história da Turma da Mônica, “Lições” fez um trabalho bem mais difícil, que foi o de trazer um ar de novidade, mas sem descaracterizar a turminha. Mais uma vez, Daniel Rezende e sua equipe merecem aplausos. Todas as adições foram benéficas, seja de elenco ou mesmo de nuances dos personagens, enredados em uma história que os afastam, quando Mônica é forçada é mudar de colégio.

Adaptar Turma da Mônica é uma responsabilidade enorme, e a missão foi realizada com sucesso. Assim, não é espanto que Rezende e companhia tenham recebido salvo-conduto para simplesmente “brincar” em uma série original, uma trama detetivesca, corriqueira como os quadrinhos, leve e divertida, explorando toda a magia da turma e a interação entre eles. Até mesmo o nítido crescimento do elenco, já ficando mais velhos para os papeis, não é um problema. Inclusive, há uma referência direta a isso em um diálogo: “não somos mais crianças, mas também não somos adolescentes”. É uma dúvida bonitinha até, que pré-adolescente não passou por isso? Se virar adulto é inevitável, bom, que se aproveite cada momento. Afinal, mistérios como quem jogou um balde de lama na Carminha Frufru podem não ser tão interessantes de se resolver daqui a um tempo. O que, convenhamos, é uma pena. Um feliz dia das crianças pra vocês!

Denise e Carminha Frufru, adições no elenco na série da turma, que vê a adolescência chegando rápido… – Foto: Divulgação

ONDE ASSISTIR!

  • “Turma da Mônica: Laços” está disponível para streaming no Globoplay e para aluguel na Microsoft Store, Claro Video, Amazon Prime Video e Apple TV;
  • “Turma da Mônica: Lições” está disponível para streaming no Amazon Prime Video e para aluguel no Claro Video;
  • “Turma da Mônica – A série” está disponível para streaming no Globoplay.

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