FOLHAPRESS
Retomados há uma semana após uma trégua na virada do ano, atos a favor do presidente deposto Pedro Castillo não dão sinal de enfraquecimento no Peru. Nesta quinta-feira (12), bloqueios de estradas foram reportados em 10 das 25 regiões dos país, e milhares tomaram as ruas de Lima, insuflados pela violência dos confrontos entre manifestantes e forças de segurança -a Defensoria Pública peruana calcula que 49 pessoas tenham morrido nos protestos desde o seu início, há pouco mais de um mês.
Na capital, a multidão carregava retratos das vítimas e caixões de papelão, clamando por justiça pelos mortos e punição aos responsáveis enquanto chamava de assassina a atual presidente, Dina Boluarte. Ex-vice de Castillo, ela assumiu a Presidência quando ele foi deposto e é considerada uma traidora pelos seguidores do líder populista, que exigem sua renúncia e a antecipação das eleições.
Os manifestantes ainda pedem o fechamento do Congresso e a convocação de uma Assembleia Constituinte para substituir a atual Carta Magna, promulgada em 1993 pelo então ditador Alberto Fujimori e vista pelos correligionários de Castillo como um dos fatores responsáveis pela desigualdade socioeconômica no país.
A passeata, organizada por sindicatos e grupos camponeses dos Andes peruanos -epicentro dos protestos e região em que se concentrou o eleitorado de Castillo nas eleições passadas-, transcorreu sem incidentes. O mesmo não ocorreu na cidade de Cusco, que serve como base para visitas ao sítio arqueológico de Machu Picchu, principal destino turístico do país.
Um protesto na noite de quarta-feira (11) terminou com mais de 50 feridos, incluindo 19 agentes de segurança, e manifestantes lançaram pedras contra o hotel Marriott. O aeroporto internacional foi fechado para evitar que fosse tomado por manifestantes -o que tem ocorrido mesmo depois da instauração de um estado de emergência no país. E o serviço de trens entre a capital e Machu Picchu foi suspenso até segunda ordem.
Bloqueios ainda foram registrados nas regiões de Arequipa, Madre de Dios, Tacna e Puno. A última iniciou o enterro das 19 pessoas falecidas em decorrência dos confrontos na segunda-feira (9), quando foi registrado o recorde de mortes em atos até agora. Uma das vítimas tinha 16 anos, e outra, um policial, morreu calcinado após manifestantes atearem fogo à sua viatura.
O prolongamento da convulsão social levou mais um ministro de Dina a renunciar. À frente da pasta do Trabalho, Eduardo García se juntou aos colegas da Educação e da Cultura que haviam deixado seus cargos em meados de dezembro.
No início da semana, o Ministério Público peruano abriu uma investigação preliminar sobre diversas autoridades, incluindo a presidente Dina Boluarte e o primeiro-ministro Alberto Otárola, suspeitos de terem cometido os crimes de genocídio, homicídio qualificado e lesões graves na repressão aos protestos.
Mais cedo na quinta, Otárola afirmou que Dina não renunciará, “não por que ela não queira”, mas em razão de exigências constitucionais. “Deixar a Presidência abriria uma brecha muito perigosa para a anarquia e a desordem”, disse.
Sem fornecer provas, ele ainda acusou as manifestações desta quinta de fazerem parte de uma tentativa de golpe de Estado supostamente orquestrada por Castillo e financiada pelo narcotráfico. E afirmou que, em um eventual ensaio de tomada do poder, as forças de segurança defenderiam o atual governo.
O Peru está imerso em uma convulsão social desde 7 de dezembro, quando Castillo fracassou em uma tentativa de golpe após mandar dissolver o Parlamento, antecipar eleições e decretar estado de exceção. Acabou destituído pelo Congresso e sentenciado à prisão preventiva por 18 meses, acusado de rebelião e conspiração.