REVELAÇÃO

Viúva e filho de Gal têm herança minguada para dividir após acordo

Um levantamento feito pela reportagem em cartórios mostra que Gal deixou uma herança minguada

Um levantamento feito pela reportagem em cartórios mostra que Gal deixou uma herança minguada Foto: Divulgação
Um levantamento feito pela reportagem em cartórios mostra que Gal deixou uma herança minguada Foto: Divulgação

Quem acompanhou de longe a disputa pública pela herança de Gal Costa deve supor que seu filho, Gabriel Costa Penna Burgos, e sua companheira, Wilma Petrillo, travavam na Justiça uma luta por um patrimônio à altura da importância da cantora.

Mas o patrimônio que os dois chegaram a um acordo para dividir está longe disso. Um levantamento feito pela reportagem em cartórios mostra que Gal deixou uma herança minguada, e dívidas que, no processo de inventário, devem diminuir o total a que os herdeiros terão acesso.

Mais do que isso, o levantamento mostra um patrimônio que cresceu bastante nos anos 1980 e encolheu de forma drástica a partir dos anos 1990, com a venda paulatina de imóveis desde 1995, às vezes por um valor menor do que aquele pelo qual apartamentos e salas comerciais foram adquiridos.

Além disso, a cantora e empresas ligadas a ela têm dívidas que, somadas, são de pelo menos R$ 1,5 milhão.


“Vi pessoas dizendo que o patrimônio de Gal era de R$ 30 milhões. Isso não existe”, disse a advogada Vanessa Bispo, que representa Petrillo, em entrevista antes do acordo judicial.

Procurado, o filho da cantora disse em nota que não acompanhava a gestão do patrimônio nem as questões financeiras da mãe antes da morte dela —era Petrillo quem administrava a carreira da cantora desde 1995.

Em uma entrevista à Folha de S.Paulo em abril deste ano, a ex-empresária foi questionada se não seria papel dela zelar pelo patrimônio da cantora. Petrillo disse que “fez de tudo” para que Gal não falisse e atribuiu à artista um comportamento perdulário.

Na data da morte de Gal, o único imóvel que ela ainda possuía era a casa onde morava, no bairro dos Jardins, na capital paulista.

Pelo acordo firmado entre Wilma e Gabriel, esse imóvel deve ser vendido, e a renda vai ser dividida entre os dois. Enquanto isso não acontecer, Wilma pode continuar morando lá , Gabriel tinha deixado a casa para viver com uma namorada.

A artista comprou a propriedade em 2020, por R$ 5,2 milhões (R$ 6,7 milhões em valores atualizados). Se fosse vendida hoje, valeria entre R$ 8 milhões e R$ 9 milhões, o valor foi estimado pela base de dados da Pilar, rede de corretores de imóveis de alto padrão, a pedido da reportagem.

Antes de se mudar para São Paulo, Gal viveu por mais de 20 anos no Rio de Janeiro, onde chegou a viver no lendário Solar da Fossa, pensão de 85 apartamentos onde viveram grandes nomes da cultura brasileira.

Depois, mudou-se para a Estrada do Tambá, em São Conrado, atual avenida Presidente João Goulart. De acordo com os dados do apartamento, Gal comprou o imóvel em 1972 e o vendeu três anos depois, por cerca de R$ 820 mil, em valores corrigidos.

Essa é a época de alguns dos maiores sucessos comerciais da artista, como “Modinha para Gabriela”, que abria a novela da Globo inspirada em Jorge Amado. Além dos hits do álbum “Água Viva”, de 1978, como “Folhetim” e “Paula e Bebeto”.

Com o dinheiro que deve ter ganhado na esteira desses e outros sucessos, Gal adquiriu o maior número de imóveis nos anos 1980.

Nessa época, quando tinha Lea Millon como empresária, ela emplacou outros dois dos maiores sucessos de sua carreira: “Chuva de Prata” e “Um Dia de Domingo”, este ao lado de Tim Maia. Comprou quatro imóveis, todos no Rio de Janeiro.

Fim do patrimônio: como começou
Em 1995, começa a dissolução do patrimônio imobiliário de Gal. Em 1997, ela vende um dos imóveis para José Bonifácio Brasil de Oliveira, o Boninho, por R$ 450 mil (cerca de R$ 2 milhões, em valores atualizados).

Filho da cantora Gal Costa, Gabriel afirma que não sabia do câncer da mãe nem que ela havia extraído um tumor. Foto: Divulgação

Dois anos depois, Gal compra e vende um apartamento no intervalo de um mês, por um valor menor. A artista adquiriu o imóvel por R$ 770 mil, cerca de R$ 5 milhões em valores atualizados, e vendeu por R$ 651 mil, atuais R$ 3 milhões.

Ela também perdeu dinheiro investido em outra propriedade, um apartamento em São Paulo, adquirido em 2012 por R$ 7 milhões e vendido em 2020 por R$ 10 milhões. Em valores corrigidos até aquele ano, o valor de venda foi R$ 800 mil menor.

Além de Rio e São Paulo, Gal teve uma propriedade em Trancoso, na Bahia. A reportagem não localizou registros dessa residência, que foi vendida no fim dos anos 1990 e deu origem à pousada de luxo Estrela D’Água.

Pessoas próximas à artista mencionam que ela chegou a fazer empréstimos bancários, que podem ter gerado um certo desequilíbrio em suas finanças —advogados que a representaram no passado chegaram a renegociar algumas dessas dívidas.

Wilma Petrillo também parece não ter feito riqueza como gestora da carreira de Gal. Os únicos bens que a reportagem localizou no nome dela são um apartamento e uma vaga de garagem em São Paulo, que ela comprou em 1986 e vendeu em 1990.

Além de ter perdido seus bens, Gal também deixou dívidas de pelo menos R$ 1,5 milhão. Só as que estão no nome dela, como pessoa física, somam R$ 320 mil.
Mas o grosso desse passivo vem das empresas, como a GMC Produções Artísticas, ultrapassando R$ 1 milhão só em impostos federais e municipais não pagos. Ou seja, sem considerar eventuais débitos com instituições financeiras.

A empresa também responde a ações trabalhistas, uma delas de mais de R$ 500 mil.

Há ainda dívidas menores na Baraka Produções Artísticas (R$ 106 mil) e na Galco Produções (R$ 23 mil).
O levantamento feito pela reportagem se restringe a imóveis e dívidas. Nem toda forma de patrimônio aparece numa pesquisa assim, como a própria obra artística de Gal , um bem que vai continuar a render dividendos para seus herdeiros até 70 anos depois da morte dela, quando cairá em domínio público.

Pelo acordo firmado entre a viúva e o filho da cantora, os royalties que as gravadoras vão depositar numa conta judicial vão ser divididos igualmente —mas tudo o que for arrecadado depois da venda da casa ficará exclusivamente com Gabriel.
Além da obra musical, poderiam entrar na herança outros bens, como eventuais investimentos, joias, figurinos e obras de arte que a cantora tivesse em casa.

Não está clara se a cantora deixou algo do tipo. Não há notícias, até o momento, de obras de arte de vulto que a artista possuísse. Mas sabe-se que Gal tinha, por exemplo, alguns móveis de designer em sua casa nos Jardins.

Caso Wilma e Gabriel não tivessem chegado a um acordo e a Justiça desse razão a ela, a empresária teria direito a 75% de todo o patrimônio construído por Gal depois que elas começaram a viver juntas. Mas a viúva já vinha propondo, desde que o conflito entre os dois veio à tona, uma divisão meio a meio.


Ela também já falou que tem interesse em adotar Gabriel formalmente. Até agora, não há notícias se o filho de Gal vai topar.

MAURÍCIO MEIRELES E ISABELLA MENON/SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)