As Copas do Mundo atingem dimensões extraordinárias. Detalhes importantes e outros sem nenhuma importância são supervalorizados. Qualquer idiotice se torna uma grande notícia. É também um espetáculo, um teatro lúdico, um retrato dos sentimentos e das contradições humanas.
O Mundial é ainda uma afirmação do orgulho nacional. A derrota brasileira é tratada como tragédia, como se fosse mais grave que a violência, a miséria e o baixíssimo índice de desenvolvimento humano (IDH), flagelos que há muito assolam o país.
Perder, quando se tem condições de vencer, como foi o caso do Brasil, é como uma obra inacabada de um escritor, de um músico, de um pintor, embora algumas criações artísticas que não terminaram e algumas derrotas em Copas do Mundo sejam reverenciadas para sempre, como a da seleção húngara de 1954, a holandesa de 1974 e a brasileira de 1982. Não é o caso da atual seleção. O time é bom, melhor que a Croácia, mas não é para ser eternizado.
Uma grande equipe precisa unir o domínio da bola e do jogo no meio-campo, com muita troca de passes, símbolo do jogo coletivo, como faz a Croácia, com a agressividade e os dribles dos meias e atacantes brasileiros, símbolos do talento individual.
Por isso, por ter as duas qualidades em altíssimo nível, o Real Madrid é o campeão da Europa. Assim, era o Santos nos anos 1960, time que cadenciava no meio e acelerava no ataque, dentro das características da época. A principal razão do 7 a 1 foi o total domínio do meio pelos alemães.
O Brasil não tem, há décadas, um craque meio-campista, como Modric, que atua de uma intermediária à outra. Não tem, porque, nos últimos tempos, se preocupou em formar muito mais jogadores hábeis, velozes e de ataque do que construtores e pensadores do jogo. Vinícius Júnior disse que aprendeu a dar o passe e o chute de trivela, de curva, com a parte externa do pé, com Modric, que deve ter aprendido com alguém, que deve ter aprendido com Didi, na Copa de 1958.
Evidentemente, muitas coisas importantes aconteceram durante a partida contra a Croácia. Não gostei da substituição de Vinícius Júnior, que não se destacava porque o Brasil não tinha bola e porque ele não tinha a ajuda do lateral. Gostaram tanto dos pontas, que esqueceram do meio-campo e das jogadas ofensivas e das tabelas pelo centro, à exceção do belíssimo gol de Neymar, em tabela com Paquetá.
Casemiro ficou sozinho no meio-campo, contra três croatas bons de bola, já que Paquetá avançava, os pontas estavam sempre abertos e Neymar é um meia-atacante.
Tite não deveria ter abandonado a opção de colocar um meio-campista e adiantar Paquetá, para formar dupla com Neymar mais à frente.
Os jogadores e o técnico devem ser criticados, desde que não sejam transformados em vilões. É apenas mais um jogo de futebol, mesmo sendo em uma Copa. Se Casemiro tivesse feito falta em Modric ou se a bola chutada não tivesse desviado em Marquinhos, provavelmente, Alisson defenderia. Detalhes previsíveis e imprevisíveis e acasos ajudaram a eliminar o Brasil. Agora, “Inês é morta”.
Marrocos x França e Argentina x Croácia farão as semifinais. Messi passa todo o jogo à espera de receber uma bola entre o meio-campo e os zagueiros para decidir a partida, como tem feito.
A Copa continua, brilhante e com grandes emoções, como o jogaço na vitória da França sobre a Inglaterra, por 2 a 1, duas seleções claramente superiores ao Brasil.
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Tostão
Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina