ISABELLA MENON/FOLHAPRESS
Vídeos curtos nas redes sociais em que jovens aparecem acendendo cotonete com isqueiro e, em seguida, tragando como se fosse cigarro têm assustado médicos e profissionais da saúde. Para curiosos, a prática não dá nenhum barato nem tem nenhum efeito alucinógeno.
“É puramente pela sensação de pertencimento. Não é relacionado ao prazer”, diz a pneumologista pediátrica Talita Maier. Porém, o ato pode acarretar em problemas respiratórios, como pneumonia e asma, podendo levar à parada cardiorrespiratória e até a morte.
Maier explica que a queima do algodão e do plástico produz gases tóxicos extremamente irritativos para as vias aéreas –não só para o pulmão, como para os olhos, nariz e garganta.
“Ao fumar um cigarro, a pessoa tem uma sensação de prazer da nicotina. Agora, fumar o cotonete vai ser uma experiência extremamente desagradável na maior parte das vezes”, diz ela que após inalar o cotonete, o jovem pode ter tosses e sensação de aperto no peito.
Entre aqueles que têm doenças respiratórias, há um risco de desenvolverem sintomas e crises mais graves.
Além do perigo em relação às vias aéreas, a pediatra e professora da USP (Universidade de São Paulo) Ana Escobar diz que é preciso atenção para queimaduras, uma vez alguns jovens embebedam o cotonete com álcool para acendê-lo mais facilmente. “O primeiro perigo é queimar o lábio porque o cotonete e o algodão podem pegar fogo.”
Há, ainda, a presença de substâncias que têm potencial cancerígeno. Ao inalar o cotonete, a pessoa está levando diretamente ao pulmão essas substâncias, uma vez que o plástico contém cianeto, aldeído e hidrocarbonetos.
“A inalação dessas substâncias tóxicas pode fazer uma broncoconstrição, como se a pessoa entrasse em uma crise aguda de asma, que pode ser grave”, diz a médica. “É perigoso para a vida.”
Os vídeos viralizam, principalmente no TikTok, no formato de desafio. No site oficial, a plataforma afirma que não permite que usuários compartilhem conteúdo que apresente, promova, normalize ou exalte atos perigosos que possam “resultar em lesões graves ou morte”.
A plataforma define como ato perigoso atividades realizadas em um contexto não profissional ou sem as habilidades e precauções de segurança necessárias e que possam resultar em lesões graves ou morte do usuário ou do público, incluindo acrobacias amadoras ou desafios perigosos.
Também afirma que não é autorizado conteúdo que promova ou sancione a participação coletiva em atividades perigosas ou prejudiciais. Porém, segundo a coordenadora do Grupo de Trabalho em Saúde Digital da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), Evelyn Eisenstein, a rede não está sendo ágil o suficiente para conter esse conteúdo.
“Quando falamos de ‘trend’ e ‘viralizar nas redes’, esse tipo de vídeo faz parte do que nós chamamos de desafios perigosos. Precisamos de políticas de prevenção e proteção social. No mesmo minuto que esse tipo de vídeo é publicado, eles têm que ser deletados”, diz.
Eisenstein define que as principais características que definem os adolescentes são curiosidade, impulsividade, falta de capacidade de avaliar a possibilidade do risco. Além isso, a maioria se vê como invulnerável. “As redes sociais extrapolam e disseminam isso, mas temos que ter um controle.”
Ela calcula que ao menos 50 crianças e adolescentes já morreram no Brasil em decorrência desses tipos de desafios perigosos. Por isso, é preciso cuidado dentro de casa, nas escolas e pela rede social para evitar esse tipo de fatalidade.
“São jogos de provocação que atraem os adolescentes, como ‘baleia azul’, desafio do desodorante, brincadeira do quebra crânio. Mas isso não é engraçadinho, os pais precisam estar atentos e os adolescentes precisam ser alertados”, diz ela.