Texto: Aline Rodrigues
A novidade na programação do IV Festival Internacional do Filme Etnográfico do Pará, que começa nesta quinta-feira, 20, em Belém, com programação na Casa das Artes e no Cine Líbero Luxardo, do Centur, serão alguns momentos dedicados à troca do público com autores convidados para o evento.
Será uma oportunidade, por exemplo, de ter autografados livros como “Procurando Iracema”, de Jorge Bodanzky, “Filmar a Amazônia”, de Gustavo Soranz, e “Ideias para Adiar o Fim do Mundo”, com Ailton Krenak. Este último, ainda integra o time de personalidades entrevistadas no longa-metragem “Sociedade do Medo”, de Adriana L. Dutra, que será exibido também no festival.
A obra, que estreia nos cinemas do país nesta quinta-feira, 20, encerra a “Trilogia da Catarse”, composta por documentários desenvolvidos, roteirizados e dirigidos por Adriana, e faz uma reflexão sobre a epidemia do medo que assola a humanidade, potencializada por um sistema que, historicamente, manipula as massas a partir da propagação do pânico e da insegurança.
A cineasta compartilha com o espectador questões existenciais, com o objetivo de pensar assuntos sensíveis e universais que afetam o homem contemporâneo.
Krenak comentou sobre a importância de se ter outras visões de mundo nas telas e celebrou especialmente a evolução do cinema produzido por cineastas indígenas. “Cerca de 15 anos atrás, quando começamos a organizar mostras de cinema indígena, incluir obras de realizadores indígenas nos festivais, e um pouco depois, quando eu mesmo consegui organizar uma primeira mostra em Lisboa, em 2019/2020, eu disse que, além de uma longa jornada para reivindicar a demarcação dos nosso territórios, nós também estávamos começando a jornada de demarcação da tela, com essa expansão do imaginário e a instituição de outras narrativas para além daquela narrativa colonial sobre nós, nossos territórios e os nossos corpos”, lembra ele.
E destaca o registro de imagem identitário que isso permite. “Rapazes e moças dos nossos territórios, e também aqueles que estão vivendo desaldeados, com uma expressão muito coletiva seguem produzindo filmes que ficam gravados na retina daqueles que sentam numa sala de cinema, em uma praça, sob o céu no pátio da aldeia, vendo o mundo na perspectiva do olhar de realizadores indígenas”.
Cineastas indígenas têm “demarcado tela” com sua produção
Ele destaca a presença e homenagem no festival de nomes como Divino Tserewahú e Roberto Álvares, com seu cinema Guarani, “uma produção que decidiu mostrar para os não-indígenas que na pluralidade das culturas indígenas está presente também uma diversidade de narrativas, de cosmovisões, de histórias profundas”, diz Krenak.
“Você não vai ver na filmografia desses autores indígenas nenhuma perda de tempo, ninguém queima película a toa e eu fico muito feliz de ainda estar vivo vendo o resultado da colaboração com grandes amigos realizadores indígenas e não-indígenas que produziram isso que seria o catálogo da nossa mostra. Vamos para o nosso festival com essa alegria de compartilhar… Viva o cinema indígena, viva a demarcação das telas e que continue a luta pela demarcação das terras! Demarcação, já!”.
Alessandro Campos, um dos coordenadores do festival, também ressalta esse incentivo ao cinema plural. “Tudo é feito com muita paixão e pouquíssimo dinheiro. Mas o sentido de responsabilidade e de resistência que nos motiva é bem maior que essas limitações. Por isso o Festival Internacional do Filme Etnográfico do Pará será sempre uma fogueira, onde os apaixonados pelo audiovisual, tanto produtores como público, poderão se encontrar e compartilhar suas vivências e experiências, concordando com a definição de festival da querida amiga Amália Córdova [curadora digital e diretora do Festival de Língua Materna, em Nova York]”.