Cintia Magno
Quando se está diante da necessidade de conscientizar a população acerca dos impactos da atuação humana sobre o meio ambiente, é preciso buscar um caminho que possibilite mais do que a transmissão de informação pura e simples. A mudança de percepção sobre a forma como o homem se relaciona com as florestas, os rios e o ar precisa passar por ações educativas que podem encontrar um espaço aberto para se desenvolver nas escolas.
Docente da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), onde atua na área da educação ambiental a partir de uma disciplina chamada educomunicação socioambiental, a professora Lucineide Pinheiro destaca que ainda que as campanhas ambientais sejam interessantes, elas não são suficientes para enfrentar toda essa problemática atual em relação às questões de emergência climática. É preciso mais do que isso. “É preciso um processo de educação, de uma educação bem planejada, uma educação que possa empoderar nossas crianças, não é só dar uma informação. É o conhecimento que liberta, que faz com que você possa discernir entre o certo e o errado, então, é a educação que faz com que ele possa discernir, compreender e agir de forma coerente”.
Foi a partir deste entendimento que a professora, em conjunto com outros educadores, deu início a um projeto de educação ambiental para a formação de novas lideranças. O projeto social chamado Escola D’água teve início no ano de 2014, no município de Santarém, e foi voltado para a formação de professores e de crianças e jovens, estudantes das escolas municipais.
“Nós começamos a fazer esse trabalho nessas escolas, trabalhando com a formação de professores. E o nosso objetivo principal é a preservação das águas do planeta, a partir de nossas comunidades e territórios, sendo nossas escolas centros irradiadores de ideias e inovações nesse campo de formação ambiental e de lideranças”, explica ela, que também é coordenadora do projeto Escola D’água e formadora do Embaixadores das Águas. “Foi aí que nós começamos a perceber o interesse dos jovens nessa formação”.
Lucineide lembra que a formação dos professores demandava que cada educador das 45 escolas participantes levassem também um estudante representante da escola para as reuniões. Com isso, logo foi possível perceber o grande interesse desses estudantes. “Se juntavam, nessas reuniões, quase 50 meninos e meninas do ensino fundamental e nós começamos a perceber um grande interesse deles e como era bacana perceber o engajamento deles nas atividades porque eles voltavam para as escolas e socializavam tudo o que nós tínhamos discutido durante três dias de formação”, recorda.
“Nós fomos fazendo essas formações durante três anos, envolvendo essas escolas. Depois fomos ampliando para mais 25 escolas parceiras, incluímos escolas quilombolas, indígenas, ribeirinhas e aí nós começamos a organizar o coletivo de juventude que começou a fazer essa organização funcionar a partir do olhar deles. Foi quando surgiu o grupo de Embaixadores das Águas”.
A partir de então, cada escola passou a ter pelo menos cinco lideranças, além das escolas começarem a participar de diferentes campanhas, como campanhas de preservação do rio, levantamento dos cursos de água próximos da escola, qualidade da água de cada escola, de onde vem a água da escola, como é usada a água na comunidade, como está o igarapé da comunidade, etc.
“Eles foram ajudando a fazer toda essa pesquisa e esse levantamento e com isso eles foram se empoderando cada vez mais. Hoje, nós temos vários meninos e meninas que iniciaram no projeto em 2014 e que estão na universidade federal. Aqui em Santarém, alguns já concluindo o curso e a cada ano outros vão entrando”, conta Lucineide. “Eles procuram sempre os institutos voltados para as questões ambientais e hoje eles são formadores dentro do projeto Escola D’Água também, com o apoio da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) e do Instituto Mureru Eco Amazônia”.
Mais recentemente, a partir de 2022, a professora conta que o projeto começou a trabalhar também com escolas da rede estadual de ensino. Da mesma maneira, o processo inicia com a formação para os professores e para os estudantes. “Então, nós estamos agora com um grupo de novos embaixadores que são jovens da rede estadual. Esses jovens têm feito mobilizações nas escolas, debates públicos sobre temas como justiça climática, as questões de ordem ambiental, diversas temáticas atuais para nós da Amazônia e para todo o planeta”, explica Lucineide Pinheiro. “Usamos uma metodologia que foi criada com a primeira equipe do projeto e que busca discutir a água a partir do nosso corpo até a água do planeta. Então, nós falamos sobre a água no corpo, a água na família, a água na escola, a água na comunidade, a água no bioma amazônico, a água do Brasil e a água do planeta. Essa grande discussão sobre a questão da água, que é um elemento fundamental, hoje, devia estar em todas as discussões”.
Nesse sentido, não apenas a água, mas também a inter-relação que há entre água e floresta e temas como queimadas, desmatamento, fronteira agrícola, contaminação dos rios estão entre as temáticas de debate, discussão e ação do projeto. “Não é só passar uma informação, é fazer com que as nossas crianças possam ter o empoderamento epistemológico, que eles possam compreender a raiz das questões. Não é que eles apenas digam o que um adulto falou, mas que possam, por eles mesmos, refletir e compreender essa realidade”.