Pará

Quando a necessidade faz surgir um bom negócio

Dany Neves aprendeu a arte da saboaria a princípio para uso próprio, mas logo amigos e familiares a convenceram a abrir um negócio Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.
Dany Neves aprendeu a arte da saboaria a princípio para uso próprio, mas logo amigos e familiares a convenceram a abrir um negócio Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.

Trayce Melo

Nos últimos anos, o empreendedorismo feminino vem se destacando através do crescimento econômico e inovação no Brasil. O Brasil é o sétimo país com o maior número de mulheres empreendedoras, totalizando 30 milhões (48%) dos 52 milhões de empreendedores, segundo a pesquisa do GEM (2020), realizada pelo Sebrae em parceria com o IBQP. Esse fator impulsiona a economia e gera novas oportunidades de emprego e inovação.

Uma dessas empreendedoras é a fonoaudióloga Dany Neves. A linha de cosméticos naturais que criou, a Koa, foi e continua sendo uma virada de chave na vida dela. A marca nasceu há 7 anos, primeiro pela limitação em relação a produtos voltados aos cuidados pessoais e de higiene necessários por conta de uma dermatite atópica (doença autoimune), mas deu tão certo que depois alcançou outras pessoas.

Buscando uma solução para atender às suas necessidades, Dany achou um curso de saboaria artesanal. A princípio, a ideia não tinha um propósito financeiro e ficaria restrita para consumo próprio. Além de amenizar as lesões e inflamação em sua pele, Dany conseguiu criar uma linha que era do jeito que gostava. No entanto, os amigos e familiares incentivaram a jovem a comercializar o produto.

“Sempre gostei de cosméticos, mas nunca achava algo que eu gostasse, que me fizesse bem ou que desse certo para a minha pele. Os produtos para pessoas alérgicas são muito caros e pra mim não eram tão eficazes, então a alternativa que encontrei foi produzir. Quando iniciei meus estudos sobre saboaria natural e biocosmética, comecei a ter mais consciência sobre consumo. Eu decidi que não iria mais comprar produtos caros e cheios de compostos sintéticos”, explica.

A história do negócio teve início com a falta de qualidade de vida que Dany sentia. “Eu estava residindo em São Paulo, naquele período meu trabalho me consumia muito. Falei para mim mesma que queria fazer coisas mais prazerosas. Foi aí que resolvi fazer uma viagem para Nova York para visitar uma amiga. Passeando por lá avistei uma loja de saboaria natural. Quando entrei na loja me encantei por aquele universo”, recorda.

“Eu vim cheia de ideias da viagem, foi aí que encontrei algumas referências em uma feira criativa em São Paulo. Na internet achei um curso sobre saboaria natural, desde então fui me aperfeiçoando no assunto e criei a marca em 2017”, acrescenta.

“Em 2019 resolvi voltar para Belém, eu estava disposta a trazer algo novo para o mercado e que exaltasse a nossa matéria prima regional – estávamos no meio da Amazônia, mas nossa matéria prima local não era evidenciada”, disse.

“Toda a produção é feita em casa e uso somente matérias primas orgânicas. Mesmo com poucos recursos, montei a loja e acreditei no meu produto. Meu esposo me ajuda nas vendas e é meu principal motivador”, declarou.

A marca produz na região sabonetes e cosméticos naturais, veganos e multifuncionais, a partir de óleos e manteigas extraídos de forma sustentável por comunidades locais. “Existem muitos sabões no mercado geral que se dizem ser da Amazônia, porque tem 2,3% de um óleo que é daqui. Então posso dizer que não. Já o meu sabão é 97% de óleos e extratos daqui da região. Às vezes até mais do que isso, dependendo do sabão. Meu foco é pesquisa da matéria prima, desenvolver e criar coisas com o que a gente tem aqui na nossa região e território”, afirma.

Dany conta que também faz muita pesquisa dos conhecimentos tradicionais da região. “Tem esse olhar do conhecimento tradicional, que às vezes a gente esquece e fica perdido, uma coisa que é preciosa e a gente tem muito aqui, como no caso da andiroba. [Busco] entender de que forma essas comunidades usavam e continuam usando e fazendo pesquisas em cima disso”, esclarece.

Oficinas “devolvem” conhecimento

Para além da criação de produtos, a Koa também está envolvida em projetos dentro de comunidades amazônicas, ministrando oficinas de saboaria natural através de parcerias com ONGs e institutos.

. Foto: Irene Almeida/Diário do Pará.

Nessas oficinas para grupos de mulheres, a Dany, compartilha técnicas de saboaria natural aprendidas durante anos com mestres saboeiros do Brasil, Portugal e França, buscando estimular o resgate por parte das comunidades do uso das matérias primas do seu território e o desenvolvimento das habilidades necessárias para que as transformem em bens de consumo sustentáveis, apoiando assim o fomento da sociobioeconomia na Amazônia.

“Era um outro projeto que eu tinha, desde sempre quis trabalhar com comunidade, até desde a época que eu era fonoaudióloga, mas nunca soube muito bem por onde entrar, qual era o caminho. E dentro da saboaria, isso foi um processo muito natural. Eu comecei de fato a desenvolver as coisas aqui em 2020, e em 2021 fiz uma parceria com um instituto e a gente começou a pensar em cursos, em oficinas para mulheres de comunidades daqui da Amazônia”, conta.

“Então desde 2021 que eu ministro essas oficinas para esses grupos de mulheres de comunidades, para que a gente comece a também devolver conhecimentos que foram perdidos, a técnica de fazer o próprio sabão, de fazer o próprio cosmético, que são cosméticos de simples execução. É também a oportunidade de elas aprenderem, de terem um conhecimento, entrar no mercado de trabalho e ter uma fonte de renda”, conclui.