FERNANDO NARAZAKI
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A morte de uma pessoa não representa falta de obrigação de entregar a declaração do Imposto de Renda em 2024. Caso ela atenda uma das condições de obrigatoriedade em 2023 ou tenha bens a serem divididos que sejam superiores a R$ 5.000, é preciso enviar a prestação de contas dessa pessoa ao fisco.
O prazo para envio do IR vai até 31 de maio, exceto para os moradores das cidades em situação de calamidade pública no Rio Grande do Sul, que tiveram uma prorrogação até 31 de agosto. Quem atrasar, terá de pagar uma multa mínima de R$ 165,74, que pode chegar a 20% do imposto devido.
Neste ano, houve mudanças nas regras do Imposto de Renda. Os rendimentos tributáveis que obrigam a entrega da declaração, como salário, aposentadoria, pensão e recebimento de aluguel, subiram de R$ 28.559,70 para R$ 30.639,90.
Já os rendimentos isentos e não tributáveis (que é o caso dos bens herdados) ou tributados exclusivamente na fonte subiram de R$ 40 mil para R$ 200 mil. Os bens e direitos saltaram de R$ 300 mil para R$ 800 mil. Além disso, há outras exigências que levam o contribuinte a enviar o Imposto de Renda.
As regras também precisam ser observadas por quem herda bens. Por exemplo: se uma pessoa, que não foi obrigada a declarar em 2023, recebeu um imóvel de herança no ano passado e a somatória de seus bens superou R$ 800 mil com esse acréscimo, ela terá de enviar a declaração à Receita.
A divisão da herança só é comunicada ao fisco quando há uma escritura pública (feita em cartório com consenso entre os envolvidos e não há judicialização) ou uma decisão judicial com trânsito em julgado (quando não há mais recursos possíveis).
Ela é informada na declaração do ano seguinte ao acordo, e é chamada de declaração final de espólio. A Receita abre também a possibilidade de declarar a divisão que tenha sido firmada em 2024, caso ela tenha ocorrido por decisão judicial em janeiro ou fevereiro. Nos outros casos, a divisão só é informada no ano seguinte.
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COMO DECLARAR BENS HERDADOS
– Vá em Bens e Direitos e clique em Novo
– Em grupo, especifique o bem: 01 (casa, apartamento, prédio, terreno, galpão e outros imóveis), 02 (veículo, joia, obra de arte), 03 (ações), 04 (investimentos como poupança, CDB, Tesouro Direto, debêntures e ouro), 06 (dinheiro em espécie), 07 (fundos de investimento e imobiliários), 08 (bitcoin e outras criptomoedas) e 99 (outros bens)-
Em seguida, vá em código e selecione o que se adequa ao bem recebido
– Em alguns bens, será preciso preencher outros dados como IPTU, endereço do imóvel, CNPJ do banco ou da corretora
– Especifique se o bem é do titular ou do dependente, e se está no Brasil ou em outro país
– Em Discriminação, coloque as principais informações referentes ao bem, como modelo e placa do carro, endereço do imóvel, número de cotas de ações e escreva que o bem foi herdado, o percentual a que você teve direito, o nome e o CPF do contribuinte que morreu. Informe também os dados da escritura pública ou do processo judicial.-
Em “Situação em 31/12/2022”, deixe em branco. Já em “Situação em 31/12/2023”, coloque o valor do bem conforme descrito no inventário. Se você recebeu 50% de um imóvel, por exemplo, coloque 50% do valor total dele neste campo. Confira se os dados estão corretos e clique em Ok
– Em seguida, vá em Rendimentos Isentos e Não Tributáveis e clique em Novo
– Selecione o tipo de rendimento 14 (Transferências patrimoniais, doações e heranças), defina se é o titular ou o dependente e preencha o nome e CPF da pessoa falecida.
– No campo valor, é necessário somar os valores de todos os bens que foram herdados. Por exemplo, se a pessoa recebeu 50% de um imóvel de R$ 100 mil (a parte dele será R$ 50 mil), um carro de R$ 50 mil e ações com valor de R$ 100 mil, é preciso somar os três itens e declarar essa quantia, que no exemplo é R$ 200 mil.
Eduardo Marciano, especialista em Imposto de Renda da King Contabilidade, afirma que, no caso de imóveis e carros, é preciso usar os dados que estão no inventário para evitar a malha fina. “Coloque os valores discriminados, pois o tabelião costuma descrever o valor do bem e especificar o percentual de cada herdeiro”, diz.
Já nos investimentos e nas contas bancárias, o contribuinte deve seguir o informe de rendimento enviado pelo banco ou pela corretora, já que o inventário não terá os rendimentos que podem ter ocorrido após a partilha dos bens.
“Com bens no exterior, a declaração é feita da mesma forma. Em Bens e Direitos, é preciso converter o valor em real em 31 de dezembro de 2023 para colocar em Situação em 31/12/2023. Já no campo discriminação é preciso informar o valor na moeda local e a data da herança”, diz Marco Antonio Vasquez Rodriguez, advogado tributarista do VRL Advogados.
Segundo especialistas da IOB, os valores recebidos de herança de não residente no Brasil não são tributados pelo Imposto de Renda. Eles devem ser informado na linha “99 – Outros”, da ficha Rendimentos Isentos e Não Tributáveis”.
“No campo “Descrição”, informe o valor recebido em moeda estrangeira constante no documento de transmissão do país em que ocorreu a partilha.”
Caso o herdeiro já tenha uma conta-poupança, por exemplo, e acrescentou a quantia herdada nesta conta, não é necessário abrir uma nova ficha em Bens e Direitos. O contribuinte deve mencionar em “discriminação” que determinado valor foi herdado (informando os dados do inventário e também o nome e CPF da pessoa que morreu) e somar este valor em “Situação em 31/12/2023”.
HERDEI UM BEM EM 2023 E VENDI ELE NO MESMO ANO. COMO DECLARO?
O procedimento deve ser o mesmo, mas no campo de Discriminação, em “Bens e Direitos”, relate que houve a venda, coloque a data, o nome e CPF do comprador e também os dados referentes à transferência do bem, como número de escritura ou de transferência do veículo. Os campos de “Situação em 31/12/2022” e “Situação em 31/12/2023” devem ser deixados em branco.
Outro dever é verificar a necessidade do pagamento do ganho de capital, caso o valor de venda tenha sido maior que o de compra. O cálculo é feito pelo sistema GCAP (Ganho de Capital) da Receita Federal e o pagamento tem de ser feito até o último dia útil do mês seguinte à venda.
A quitação é realizada com a emissão de um Darf (Documento de Arrecadação de Receitas Federais), usando o sistema do e-CAC (Atendimento Virtual) da Receita, com o código 4600.
Se houver atraso, há cobrança de multa de 0,33% por dia, limitada a 20% no mês, mais 1% de juros pelo mês de pagamento e ainda o acréscimo referente à taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e Custódia). A Receita disponibiliza o Sicalc (Sistema de Cálculo de Acréscimos Legais), que faz automaticamente o cálculo.
Os dados enviados ao GCAP são importados para a declaração do IR, indo no item Ganhos de capital no menu do lado esquerdo, clicando em Importação GCAP 2022.
No caso de venda de imóvel, há algumas situações que permitem isenção na cobrança deste ganho de capital. Clique aqui para saber quais são. A Receita também concede isenção de 100% para imóveis adquiridos antes de 1969. Já no caso de imóveis entre 1969 e 1988, há um abatimento progressivo no ganho de capital que vai de 95% (1969) a 5% (1988).
PAGAMENTO DE OUTROS IMPOSTOS
No caso de herança, é preciso pagar o imposto estadual, que tem nome e regras diferentes para cada local. Em São Paulo, este tributo é o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos).
Em São Paulo, há isenção do ITCMD quando o valor total for menor que 2.500 Ufesps (Unidade Fiscal do Estado de São Paulo), o equivalente a R$ 85.650 em 2023, que é ano-base da declaração. Caso este limite seja ultrapassado, é calculada uma alíquota de 4% sobre o valor de mercado do bem ou direito herdado, resultando na quantia do imposto a ser recolhida.
É preciso somar os valores recebidos de herança de imóvel, dinheiro ou carro e quem recebe a herança é responsável por quitar o imposto. Para o cálculo, o herdeiro deve somar o valor de tudo que foi repassado para ele.
Normalmente, as secretarias de Fazenda disponibilizam em seus sites uma opção para a emissão do boleto para pagar o imposto. Em São Paulo, este documento é o Dare (Documentação de Arrecadação de Receitas Estaduais) e pode ser emitido no site da Fazenda.
No estado, há um desconto de 5% se o pagamento for feito até 90 dias após a data de falecimento, e o valor pode ser parcelado em 12 vezes. O bem só é transferido ao herdeiro depois de o ITCMD ser pago integralmente.
A HERANÇA AINDA NÃO FOI DIVIDIDA. COMO FAÇO?
Quando a divisão da herança ainda está sendo debatida, a declaração de quem morreu tem de ser entregue, caso a pessoa se enquadre nas regras de obrigatoriedade. O documento para a Receita terá de ser encaminhado pela viúva ou viúvo (legalmente chamado de meeiro), por um dos herdeiros ou por um procurador legal.
Se houver bens a dividir, o responsável por prestar as contas é o inventariante, que é a pessoa designada por meio de acordo judicial ou escritura pública. Caso a pessoa que morreu não deixou bens a serem partilhados, não é preciso fazer a declaração de espólio.
É preciso abrir um espólio inicial se a pessoa morreu no ano-calendário da declaração, que no caso é 2023. Se a morte ocorreu em 1º de janeiro de 2024, a declaração de quem morreu seguirá uma declaração de ajuste normal, informando todas as movimentações financeiras feitas, incluindo possíveis deduções para reduzir o tributo a ser pago.
“Se houver restituição, o recomendado é que a conta bancária (para receber a quantia) seja da pessoa falecida. Essa conta deve permanecer ativa até a definição do espólio. Se houver imposto a pagar, o inventariante é quem ficará responsável pelo pagamento. Ele pode pedir ao juiz que seja retirado o valor da conta bancária ativa da pessoa falecida para o pagamento”, afirma Rodriguez.
Enquanto não há uma definição sobre a herança, é preciso continuar declarando o IR da pessoa morta, caso ela atenda às regras de obrigatoriedade, por soma de bens, por exemplo. Essa manutenção de declaração é chamada de espólio intermediário, que deve ser feito anualmente até a definição da partilha. Quando isso ocorre, muda-se para o espólio final, mas ele é feito no IR do ano seguinte ao término do processo.
ESPÓLIO INICIAL
No caso das pessoas que morreram em 2023, o responsável por reportar o caso à Receita deve abrir a declaração do contribuinte morto e entrar em “Identificação do Contribuinte”. Em “Ocupação principal”, mude a natureza da ocupação para o código 81 (Espólio) e deixe o campo logo abaixo (Ocupação principal) em branco.
Outra medida a ser feita é abrir a ficha “Espólio” que está no menu do lado esquerdo do programa e colocar o nome e CPF da pessoa que morreu.
Depois disso, faça a declaração normalmente, tendo informes de rendimentos e bancários, notas fiscais, recibos e comprovantes para justificar as movimentações financeiras à Receita, caso seja necessário. Se houver deduções, como gastos com médicos e educação, devem ser informados.
Se houver declarações pendentes de anos anteriores de quem morreu, a pessoa responsável pela declaração deve enviar uma declaração retificadora para cada ano. Para isso, é preciso entrar no sistema do e-CAC da Receita.
ESPÓLIO INTERMEDIÁRIO
A declaração do ano seguinte ao da abertura do espólio inicial é denominada de espólio intermediário. O preenchimento dela segue como uma declaração de ajuste normal com a atualização dos dados informados no ano anterior.
O espólio intermediário deve ser declarado até o ano-calendário da decisão final sobre a partilha. No caso de processos judiciais, essa definição só ocorre no trânsito em julgado.
ESPÓLIO FINAL
No ano seguinte à divisão da herança, é preciso informar como ficou a partilha à Receita e é feito o espólio final, que só pode entregue no modelo com dedução legal. Nos casos de decisão judicial em janeiro e fevereiro de 2024, é possível fazer o espólio final já neste ano.
A pessoa responsável pela declaração deve abrir o programa da Receita, selecionar o item “Nova” e escolher “Declaração Final de Espólio” em tipo. Na ficha “Herdeiros/Meeiro”, preencha os dados de cada um que recebeu a herança. Em “Espólio”, informe os dados da sentença judicial ou da escritura pública, coloque o ano da morte, especifique que é espólio final e acrescente as informações dos herdeiros.
Nas fichas de “Bens e Direitos”, deve ser informado no campo “Discriminação” de cada bem como foi feita a divisão. No campo “Situação na Data da Partilha”, deve ser relatado o valor que consta na última declaração apresentada pelo contribuinte que deixou a herança. Ao lado, há um ícone com o símbolo de percentual, clique nele e preencha nome, CPF e percentual de cada pessoa que herdou este bem.
Por fim, no campo “Valor de Transferência”, a quantia informada é do valor de aquisição ou do valor de mercado, caso tenha sido feita a atualização.
NÃO TENHO SENHA GOV.BR DE QUEM MORREU. COMO FAÇO?
A ausência do cadastro no gov.br impede o uso da declaração pré-preenchida no Imposto de Renda, já que é preciso ter conta prata ou ouro para usar o recurso. De acordo com a Receita, é possível pedir para o fisco a criação de uma procuração eletrônica no nome do inventariante. Com este documento, é possível ter acesso aos dados e fazer a declaração da pessoa que morreu.
Veja passo a passo como pedir a procuração
– Entre neste link da Receita Federal http://servicos.receita.fazenda.gov.br/Servicos/procuracoesrfb/controlador/controlePrincipal.asp?acao=telaInicial
– Selecione Cadastro e clique na captcha “Não sou um robô”
– Em seguida preencha os dados solicitados da pessoa que morreu e do inventariante
– Crie uma palavra-chave e determine o tempo de vigência, que tem prazo máximo de cinco anos
– Selecione o serviço que quer ter acesso. Por exemplo, a declaração pré-preenchida é Declaração DIRPF Pré-Preenchida
– Clique em Cadastrar Procuração
– É preciso enviar também os documentos de identidade da pessoa falecida e do inventariante, além da decisão judicial ou da escritura pública com a nomeação do inventariante
– Posteriormente é possível acompanhar o processo pelo mesmo site ou pelo e-CAC
Outra possibilidade é solicitar a procuração em uma agência da Previdência. “O inventariante precisa agendar a visita e fazer o pedido para liberação. Ele tem de levar os documentos para provar que é o inventariante. Normalmente, a Receita fornece as declarações anteriores, mas não o acesso à pré-preenchida. Não existe um prazo para a Receita prestar essas informações”, afirma Rodriguez.