Carol Menezes
Mesmo a prefeitura de Ananindeua recebendo cerca de R$ 8 milhões mensais do governo federal via Sistema Único de Saúde (SUS), o Hospital de Clínicas da cidade (HCA), o que mais recebe casos de alta complexidade no município – cerca de 350 procedimentos cirúrgicos e 150 internações por mês – está há quase uma semana com atendimento suspenso para a população por falta de pagamento. De acordo com a direção do hospital, a dívida de quase R$ 7 milhões segue em aberto e o prefeito Daniel Santos (PSB) não informou um prazo para a regularização da dívida.
Diretor clínico da entidade hospitalar, o cirurgião geral e cancerologista Ronaldo Sefer está no cargo desde o início do funcionamento do HCA, fundado no ano 2000, e assinou o ofício endereçado na última segunda-feira, 6, à Secretaria de Saúde de Ananindeua comunicando a suspensão do atendimento. O complexo possui 12 leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e cerca de 100 outros leitos de internação hospitalar.
Ele explica que a relação do hospital com a gestão municipal se tornou muito difícil desde que Daniel Santos assumiu a prefeitura, em janeiro de 2021, e que inclusive a primeira medida do gestor foi cortar em 25% o valor repassado ao HCA, sob a justificativa de dificuldades financeiras do município.
“Somos o maior hospital de Ananindeua em atendimento via SUS, os maiores prestadores de serviço em saúde do município. Após o corte, tentamos conversar, ouvimos as justificativas de problemas financeiros e continuamos, apesar das enormes dificuldades financeiras que o HCA vem passando há três anos. Fizemos questão de não fechar as portas, de não prejudicar o povo. O Daniel vinha pagando com alguma dificuldade, a gente ficava em cima para poder receber. Aí pagava um mês, no outro não pagava, e voltava a pagar no mês seguinte”, relata.
Metade da dívida pendente é de 2021 e se refere aos serviços de é da hemodinâmica – diagnóstico e tratamento de disfunções neurológicas, endovasculares e cardiológicas, como obstruções, aneurismas e tromboses -, e que segundo Ronaldo, só passou a funcionar de forma efetiva quando passou para a gestão estadual. “Para se ter uma ideia da nossa importância, somos retaguarda da Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna, mas isso hoje, porque enquanto a hemodinâmica esteve nas mãos do município não funcionou”, lamenta.
O médico diz ainda que quer ser chamado ao Ministério Público para comprovar que os pagamentos estão pendentes. “O prefeito diz que pagou, e isso tem me indignado. Quero saber como diz que pagou se não pagou. Sempre tivemos uma excelente relação de médicos, de profissionais, até ele ser prefeito. Foi quando começaram os atritos, estritamente relacionados a assuntos da administração hospitalar”, confirma, informando ainda que o HCA não passou por problemas de falta de pagamento durante as gestões de prefeitos anteriores – Manoel Pioneiro (PSDB) e Helder Barbalho (MDB).
Entenda o caso
- O Hospital de Clínicas de Ananindeua (HCA) é da iniciativa privada, porém possui convênio com a prefeitura. O DIÁRIO obteve com exclusividade acesso ao ofício enviado à prefeitura de Ananindeua que comunica a suspensão dos atendimentos. A falta de pagamento no Hospital de Clínicas de Ananindeua se refere a serviços de hemodinâmica, no valor de R$ 3.183.920,04 milhões, prestados em setembro, outubro, novembro e dezembro de 2021 e ainda janeiro de 2022.
- Também abrange dívidas relacionadas a atendimentos hospitalares (R$ 1.265.567,28 milhão), ambulatoriais (R$ 1.086.078,90 milhão) e Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE – R$ 2.934.432,72 milhões) realizados entre novembro de 2023 a abril de 2024, totalizando então um rombo por parte da prefeitura de Ananindeua de R$ 6.612.712,25 milhões
- Na apresentação do site do HCA é dito que o hospital “é hoje seguramente o maior serviço de Assistência Médica ao SUS do Município de Ananindeua” (…) “preparado para atender diversas especialidades médicas, e contam com Centro-cirúrgicos, Unidades de Terapia Intensiva, Leitos Particulares e de Enfermaria, Usina de Oxigênio e um Centro de Cardiologia Completo”.
- Vale lembrar que a gestão municipal tem como prefeito o médico Daniel Santos, conhecido como Dr. Daniel, que chegou a ser um dos proprietários do Hospital Santa Maria de Ananindeua (HSMA), considerado um dos mais modernos da cidade. Este mesmo hospital na semana passada foi alvo de operação por parte do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), por suposto envolvimento em esquema criado dentro do Instituto de Assistência do Servidor Público do Estado do Pará (Iasep), autarquia do governo estadual, de desvio de verbas públicas do plano de saúde estatal em favor do HSMA. Esta situação já teria causado um rombo de cerca de R$ 261 milhões aos cofres públicos.