Dr. Responde

Malária: Amazônia é área endêmica para a doença

Tânia Chaves, médica infectologista. Foto: arquivo pessoal
Tânia Chaves, médica infectologista. Foto: arquivo pessoal

Cintia Magno

Característica de regiões tropicais, a malária é uma doença infecciosa febril aguda, transmitida por mosquitos e que representa um importante desafio em saúde pública nas áreas endêmicas. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que, apenas em 2021, cerca de 247 milhões de casos e 619 mil óbitos em decorrência da malária foram registrados em todo o mundo, sobretudo em países localizados no continente africano. Nas Américas, a Venezuela, a Colômbia e o Brasil representam, juntos, 80% dos casos registrados no continente sul-americano no mesmo ano.

No que se refere especificamente ao Brasil, o último boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde aponta que 131.224 casos de malária foram notificados no país em 2022, o que representa uma redução de 6,6% em comparação a 2021, quando foram notificados 140.488 casos. Ainda segundo o Ministério da Saúde, no Brasil, a região amazônica é considerada área endêmica para a malária no país, sendo responsável por cerca de 99,9% dos casos notificados em 2021. Apenas 33 municípios concentram mais de 80% do total de casos do país.

Em todo o país, as áreas onde se observa o maior risco de contrair malária são os garimpos, assentamentos, terras indígenas, áreas rurais e áreas urbanas. No caso de alguns estados da região amazônica, segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, a maior parte da transmissão de malária se dá em áreas rurais. É o caso do Estado do Maranhão (76,1%), do Acre (70,4%), de Rondônia (52,3%) e do Pará (40,5%).

No Estado do Pará, depois das áreas rurais (que concentraram 40,5% das transmissões dos casos de malária notificados em 2022), as áreas de garimpo concentraram 29,2% das transmissões do Estado e as áreas indígenas concentraram 25,4%. A área urbana acumulou apenas 4,8% das transmissões de malária no Pará em 2022.

DOENÇA

A médica infectologista, docente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Pará (FAMED/UFPA) e membro e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, dra Tânia Chaves, explica que a malária é uma doença febril aguda tratável e curável, transmitida pela picada da fêmea do mosquito Anopheles, infectada pelo protozoário Plasmodium. Sendo que as principais espécies causadoras da malária no homem são P. vivax, P. falciparum, P. malariae, P. ovale (comum nos países africanos) e P. knowlesi (comum nos países asiáticos).

“A malária se manifesta com febre alta, calafrios e dor de cabeça, sintomas reconhecidos como a tríade malárica. Outros sintomas podem estar presentes, como dores musculares, perda do apetite, náuseas, vômitos, suores, fraqueza, dores articulares, diarreia e taquicardia”.

Evolução pode ser grave e mortal

A médica Tânia Chaves explica que a malária pode evoluir para formas mais graves e complicadas, ocasiões em que podem ser apresentados sintomas como falta de ar, olhos amarelados (icterícia), sangramentos, importante comprometimento renal, com redução até a parada do fluxo urinário, confusão, sonolência, delírios, convulsões (que caracteriza a malária cerebral) e até morte.

“O tipo de tratamento dependerá de alguns fatores como a espécie do protozoário infectante, a idade do paciente e condições associadas, como crianças pequenas e gestantes”, pontua Tânia. “Quanto mais oportuno é o início do tratamento, melhor será a resposta clínica e a sobrevida do paciente”.

Fornecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o tratamento contra a malária varia de 3 a 7 dias, a depender da espécie do Plasmodium. A dra. Tânia Chaves aponta que, atualmente, um novo antimalárico, a Tafenoquina, foi incluído no arsenal terapêutico do programa Nacional de Controle de Malária do Ministério da Saúde. “Este medicamento está sendo utilizado para o tratamento da malária dos povos Yanomami, pelo Ministério da Saúde, por sua eficácia e dose única, indicado para populações que vivem em áreas remotas de regiões endêmicas”, esclarece. “No Brasil, 99,7% dos casos de malária ocorrem na Amazônia brasileira, onde o P. vivax é a espécie mais prevalente. Importante destacar que na extra-Amazônia, são reportados casos de malária em diferentes estados, sendo a maioria considerada como casos importados da Amazônia ou de outros países”.

A professora destaca, ainda, que a transmissão local na extra-Amazônia também é registrada. “Nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, por exemplo, a malária autóctone é conhecida como malária da Mata Atlântica, isso ocorre porque o mosquito transmissor da malária, conhecido como carapanã, está presente em todo o território nacional, da espécie Anopheles”, pontua. “Hoje, o Brasil está em campanha nacional que visa a eliminação da malária até 2035 em todo o território brasileiro. A principal estratégia de controle da malária é a associação do diagnóstico e tratamento realizados de forma correta e oportuna”.

Além dessa estratégia, outras ações como o combate ao vetor, a manutenção de políticas públicas e o incentivo às pesquisas são apontadas pela infectologista como fundamentais para o alcance da eliminação da malária. “O combate ao mosquito da malária (Anopheles/vetor) integra as medidas de prevenção da doença, que vai desde a borrifação com inseticidas no interior das casas nas áreas endêmicas, incluindo o uso de mosquiteiro impregnado com inseticida adequado”.

VACINA

Outro fator importante de prevenção é a vacina. Tânia Chaves aponta que após mais de 50 anos de estudos para o desenvolvimento de uma vacina contra malária, hoje existem duas vacinas contra a doença aprovadas pela Organização Mundial de Saúde em alguns países africanos, onde prevalece a forma mais grave da doença, causada pelo P. falciparum. “Essas vacinas não são indicadas para no Brasil, onde a malária vivax é mais prevalente no país e nas Américas, e para esta espécie estudos estão em andamento para desenvolvimento de uma vacina específica contra o P. vivax”, atenta.

“Gostaria de alertar a todos os profissionais de saúde que a malária no Brasil ocorre na área rural, e surtos esporádicos ocorrem na área urbana, como já tivemos na cidade de Belém. Na presença de febre em viajantes que retornam de áreas endêmicas, e que não precisa ser só da África, a investigação da malária é obrigatória. Hoje um dos maiores problemas do manejo clínico da malária é o esquecimento da investigação desta doença que pode evoluir para morte. Assim, em viajantes internos e externos provenientes de áreas malarígenas, a febre pode ser malária”.