Carol Menezes
Com o cancelamento do alvará que permitia a construção e funcionamento do edifício Fort Litoranium, em Salinópolis e a poucos metros da praia do Atalaia, proprietários que investiram em imóveis do empreendimento poderão solicitar de volta o valor pago, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O embargo ocorre em função de um documento datado do dia 18 de março, assinado pelo secretário de obras do município, Weslen Crristian Aviz da Costa, e enviado diretamente à Estrutura Engenharia, responsável por erguer o prédio.
De acordo com o professor universitário e advogado da área do Direito do Consumidor, Gustavo Amaral, cabe à construtora a devolução do que foi pago pelos compradores, porém sem previsão de pagamento de danos morais, visto que o cancelamento do alvará se dá após uma decisão judicial que suspende a validade de uma legislação municipal que autorizava construções de até 65 metros de altura especificamente na área onde estava em construção o Fort Litoranium.
“O que foi desautorizado na verdade foi a legislação que permitiu a construção, e retirado o alvará, a empresa tem que devolver o dinheiro devidamente corrigido, mas sem direito a indenização por dano moral. Em tese, trata-se de uma tramitação tranquila junto à construtora, que é responsável pelo ressarcimento direto, então não haveria necessidade de judicialização”, avalia o especialista, que inclusive vê possibilidade de devolução de 100% dos valores pagos pelos proprietários.
O advogado explica que, em casos como este, previsto no artigo 18 do CDC, em que “os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor (…)”, cabe o entendimento do item II do mesmo artigo, que prevê “restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos”.
Gustavo Amaral pondera, no entanto, que cabe busca por assessoria jurídica caso a construtora tente dificultar esta devolução, seja alegando investimentos, perdas ou culpa de terceiros. “Mas o consumidor segue no seu direito porque este tipo de ocorrência faz parte do risco da atividade econômica desenvolvida pela empresa, qualquer risco é da empresa, se ela conseguiu alvará e depois cancelaram isso não pode recair sobre o consumidor”, justifica.
Entenda o caso – Uma legislação aprovada em maio de 2023 pela Câmara de Vereadores de Salinópolis e logo sancionada pelo prefeito Kaká Sena (PL) que aumenta de nove metros para 65 metros de altura o limite para construção habitacional em uma única quadra em frente à praia do Atalaia motivou o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), em documento assinado pelo procurador-geral de Justiça, Cesar Mattar Jr., a entrar com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin – 0812427-29.2023.8.14.0000) em agosto do mesmo ano contra a prefeitura e o parlamento da cidade no intento de suspender a aplicação da lei.
O processo, com mais de 200 páginas, não corre em segredo de justiça e cita como justificativas principais a ausência de estudos de impactos ambientais prévios à análise e aprovação do texto, de realização de audiências públicas e ainda o fato de que a matéria, aprovada como foi, beneficia no momento única e exclusivamente a Estrutura Engenharia, anunciante de um empreendimento imobiliário – justamente em maio – de 22 andares, de finalidade habitacional somente, e que seria o mais alto de Salinas até hoje – o Fort Litoranium.
Aprovado no dia 2 de maio de 2023 com maioria de votos dos 13 vereadores que compõem o parlamento municipal, presidido pelo vereador João Erivaldo da Silva (PDT), o projeto 02/2023 apresentado pela Mesa Diretora da casa ainda em março foi sancionado exatos 16 dias depois da aprovação, no dia 18, como lei municipal 2.949/2023, que “altera o Anexo II, do Parágrafo único do art. 10 da lei municipal n°2.896/2017, reclassificando a altura do gabarito de construções para fins habitacionais do Plano Diretor do Município, do loteamento Balneário Ilha do Atalaia II, quadra 38, lotes de 01 a 14”.
Vale lembrar que uma das justificativas para aprovação do projeto de lei informava que “a altura dos empreendimentos (…) vem impedindo o crescimento turístico e geração de empregos no município” – no entanto o empreendimento da Estrutura Engenharia é exclusivamente habitacional, e encerrada a construção e todos os impactos ambientais em andamento, segundo previsão do próprio MPPA, o empreendimento não geraria nada além de 30 empregos diretos.
Em fevereiro deste ano de 2024, por 24 votos a 3, o pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) concedeu liminar ao pedido formulado pelo MPPA para suspender a legislação municipal.