Wal Sarges
As palavras conduzem a Ocupação Maria Bethânia, aberta ontem, em São Paulo, em dois andares do Itaú Cultural. A instalação mostra a relação da artista com a literatura em um novo olhar sobre a carreira da cantora. Além da visita presencial, a ocupação pode ser acessada pela internet, em link aberto ao mesmo tempo da abertura da mostra.
No final do ano passado, Maria Bethânia, que completa 77 anos de idade em 2024, começou a celebração em torno dos 60 anos de carreira. Esse marco da trajetória dela contempla apresentações musicais, uma turnê com o irmão Caetano Veloso – que chegará a Belém em 29 de setembro, no Hangar Centro de Convenções – e esta Ocupação Maria Bethânia. Esta é a primeira mostra da série Ocupação em 2024, e a 62ª do projeto iniciado em 2009. Com curadoria do Núcleo de Curadorias e Programação Artística do IC e da diretora Bia Lessa, tem pesquisa audiovisual de Antônio Venâncio .
A coordenadora do Núcleo de Curadorias e Programação Artística do IC, Andreia Schinasi, diz que a proposta da exposição é apresentar a artista a partir de outra esfera de sua intimidade que o público ainda não conhece. “Maria Bethânia é uma artista imensa, uma das maiores intérpretes do país, fundamental para a história da música brasileira. Mas quando a gente pensou na ocupação, buscamos fugir de uma mostra cronológica e, por outro lado, revelar para o público outras camadas da Bethânia, apresentar aquilo que é desconhecido. Então essa exposição foi muito calcada, principalmente, na palavra, que é algo que tem muita força e muita importância para a Bethânia. A exposição trata a palavra, na literatura, e relaciona elementos da natureza, elementos do sagrado, da espiritualidade, da fé, que são as coisas que compõem algumas das camadas da cantora. A gente quis propiciar ao público um olhar dentro dessa intimidade da Bethânia”, explica.
Cantora, compositora, produtora, atriz e poeta nascida em Santo Amaro, na Bahia, uma dos oito filhos de Dona Canô, esse aspecto da literatura e do saber na formação de Maria Bethânia está presente nas obras reunidas na instalação. “É uma exposição que tem curadoria da Bia Lessa e da equipe Itaú Cultural também. A gente tem dois andares que são bastante sensoriais e que a gente pode chamar de instalações. No térreo, a gente tem uma composição com 96 fotos da Bethânia em backlights pendurados – que são monitores em LCD -, que traduzem um pouco da vivência dela em diversos momentos, em Santo Amaro, com a família, e da vivência dela com a espiritualidade”, descreve Andreia Schinasi.
A coordenadora acrescenta que a cada backlight foi adicionada uma frase de um autor que tem muita relação com a artista. “A gente está falando de Ferreira Gullar, Clarice Lispector, por exemplo. Na parte de cima tem as fotos e para baixo, as frases sendo refletidas. Tem uma paisagem sonora para dar uma ideia de movimento, uma ideia de mar, da presença muito forte da água, formando um diálogo com os elementos da natureza”, acrescenta.
Já no espaço do primeiro andar, segundo Andreia Schinasi, há uma composição de 46 telas grandes e um material audiovisual que dura em torno de uma hora e meia. “A composição digital retrata a vida e a obra de Bethânia em suas várias facetas e etapas, com participações de pessoas ligadas a ela. Tem imagens com algumas participações dela em documentário, outras de apresentações musicais e ainda dela conversando com Caetano, por exemplo. É uma grande paisagem audiovisual. No percurso entre um andar e outro, o público terá uma experiência sensorial. Traz uma sensação de vento muito ligado ao orixá Iansã, que remete à espiritualidade da artista”, detalha.
PROGRAMAÇÃO DETALHADA
Um dos desdobramentos da ocupação é o hotsite que traz todas as ocupações já realizadas pelo Itaú Cultural (entre elas, uma em homenagem à paraense Dona Onete) e um material complementar a esta exposição. O site, que será alimentado ao longo da ocupação, terá, por exemplo, vídeos com depoimentos sobre Maria Bethânia, como os dos irmãos Roberto e Rodrigo Velloso, e a amiga de infância Nau Lima, falando sobre a família, a infância e juventude na Bahia, sobre traços da personalidade da cantora, e momentos íntimos.
“A gente também tem programações paralelas. Por exemplo, esta semana, além da abertura da exposição, no dia seguinte [hoje, 14], a gente traz uma apresentação musical do bloco Explode Coração, que é um bloco carnavalesco, que tem o repertório todo voltado para o da Bethânia. Na sexta e no sábado, às 20 horas, a gente tem Moreno Veloso, sobrinho dela. E domingo, fechando essa primeira leva de programação, a gente tem Roberto Mendes, que é um importante compositor, importante parceiro da Betânia, às 19 horas”, detalha.
O projeto das ocupações artísticas, segundo Andreia Schinasi, é trazer um olhar diferenciado sobre os homenageados, que são importantes para a história da cultura brasileira, em suas diferentes áreas de atuação. “Essa ocupação sempre tem esse desafio de mostrar um olhar além daquilo que o público já conhece do artista, refletir sobre quais são as outras camadas delas que as pessoas não estão tão acostumadas a desbravar. Acho que isso é o grande destaque, além de trazer importância do artista”, reitera.