MARIANNA HOLANDA E GABRIELA BILÓ
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Jair Bolsonaro (PL) aposta mais uma vez numa manifestação na avenida Paulista, em São Paulo, para tentar demonstrar seu capital político. Neste domingo (25), o ex-presidente tem como principal objetivo apresentar um retrato de que mantém apoio popular e, dessa forma, reagir ao avanço das investigações sobre ele.
Os preparativos do ato deste domingo, no entanto, são marcados pelo medo, uma vez que o ex-presidente e aliados estão acuados pelas apurações da Polícia Federal.
Não foram poucos os conselheiros que orientaram Bolsonaro a ter cautela nas palavras. Além do mais, há no entorno dele quem tema que algo fuja do controle durante a manifestação ou mesmo que haja baixa adesão do público, o que aumentaria a percepção de isolamento do ex-mandatário.
Aliados apontam que eventuais gritos de ordem de cunho golpista poderiam trazer ainda mais prejuízos a processos jurídicos que miram Bolsonaro.
O conselho de aliados a Bolsonaro é que ele evite em seu discurso ofensas a membros do Judiciário (o que já foi uma constante durante seu período na Presidência), sobretudo ao ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).
Alguns chegaram a alertá-lo de que declarações com margem de serem interpretadas como crimes poderiam até mesmo resultar na prisão do ex-presidente. De acordo com pessoas próximas, Bolsonaro demonstrou estar alinhado a essas orientações.
Nesse sentido, o ex-presidente estará acompanhado na Paulista pelos advogados Fabio Wajngarten e Paulo Cunha Bueno.
Bolsonaro disse à Folha querer um “retrato” da situação e que haverá um impacto político.
“Convidei pessoal para comparecer [no ato] para termos um retrato e eu poder me defender. Não existe nenhum problema mais a ser tratado lá”, disse, antes de prestar depoimento à PF no caso que investiga uma trama golpista para reverter a derrota eleitoral para Lula (PT). Bolsonaro ficou em silêncio na oitiva.
Questionado se o ato poderia impactar na investigação, ele disse: “Tem a questão técnica e a questão política. Politicamente, sempre tem impacto, técnico é outra história”.
A mesma metáfora foi usada para a manifestação de 7 de setembro de 2021, quando ele, também na avenida Paulista e em discurso em Brasília, chamou Moraes de canalha, afirmou que não cumpriria decisão judicial e que só sairia da Presidência preso, morto ou com vitória.
“Dizer aos canalhas que eu nunca serei preso”, disse a uma multidão inflamada. Em outro trecho daquele discurso, Bolsonaro afirmou: “Dizer a esse ministro que ele tem tempo ainda para se redimir. Tem tempo ainda de arquivar seus inquéritos. Sai Alexandre de Moraes, deixa de ser canalha, deixa de oprimir o povo brasileiro”.
Nenhuma das alternativas aconteceu e Bolsonaro deixou o Palácio do Planalto no final de 2022. Horas antes da posse, ele viajou aos Estados Unidos e não cumpriu com o rito democrático de passar a faixa presidencial a seu sucessor.
Agora Bolsonaro pede uma manifestação pacífica e sem faixas. O principal temor é o de que ele seja responsabilizado por palavras ou mensagens golpistas de manifestantes ou de quem estiver no carro de som. Afinal, foi o próprio ex-presidente que chamou seus apoiadores ao ato.
Para tentar blindar o ex-presidente, os organizadores garantiram que haverá apenas um microfone e que a lista de oradores será controlada.
Serão seis torres de som e dois trios elétricos. Um terá capacidade para cerca de cem pessoas e levará parlamentares e outros aliados. O outro será o de Bolsonaro e terá capacidade um pouco menor, de no máximo 70 pessoas.
O ato será inaugurado pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que fará uma oração. Em seguida, falarão os parlamentares Gustavo Gayer (PL-GO), Nikolas Ferreira (PL-MG) e Rogério Marinho (PL-RN), além de governadores que porventura queiram se manifestar.
Estão confirmados no ato os governadores Jorginho Mello (Santa Catarina), Ronaldo Caiado (Goiás) e Tarcísio de Freitas (São Paulo), todos aliados que disputam o espólio eleitoral de Bolsonaro.
Por último, devem discursar o pastor Silas Malafaia, que organizou o evento, e o próprio Bolsonaro.
“Falei para o presidente: se prenderem o senhor e o senhor não se comunicar com esse povo, como vai querer que esse povo saia em sua defesa? O senhor tem que explicar, se defender, tem que fazer isso através do povo. Aí ele aceitou [fazer o ato]”, disse Malafaia.
“Não vou chamar [Alexandre de Moraes] de ditador, nem pedir sua prisão, mas vou mostrar [fatos] e desafiar quem estiver ouvindo a contraditar. Fatos, não estou acusando, nem atacando instituição”, prosseguiu.
Malafaia contou ainda que o ato não tem como objetivo defender Israel, mas que fará uma fala dura contra a declaração recente em que Lula comparou a ofensiva na Faixa de Gaza ao Holocausto nazista.
Apesar de não ser o foco da manifestação, o petista deve ser alvo da maioria dos discursos. Segundo aliados, a estratégia de mirar em Lula também pode ser uma forma de desviar o foco da manifestação de possíveis ataques ao Judiciário.
Malafaia reforça que não serão permitidos cartazes e faixas, para evitar qualquer frase mais “maldosa”, como pedidos de fechamento do STF. O pastor afirma que qualquer faixa nesse sentido será obra de “infiltrado da esquerda”.
O líder evangélico evita qualquer estimativa de público, apesar do entusiasmo de outros bolsonaristas com o ato.
Em caso de baixa adesão, bolsonaristas já têm uma vacina. Devem argumentar que existe um temor generalizado entre simpatizantes de Bolsonaro em se expressar, diante dos processos em andamento.
Além de aliados que não pretendem comparecer por receio de se indispor ainda mais com o Judiciário, outros faltarão por impedimento legal. Um dos casos é o do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, também investigado pela PF na apuração sobre tentativa de golpe.
Apesar de a maioria dos parlamentares e dirigentes do PL estar confirmada para o ato, o partido não fez nenhuma convocação para a manifestação.