Leonardo Vieceli/Folhapress
A inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), desacelerou a 0,42% em janeiro, após marcar 0,56% em dezembro, segundo dados divulgados nesta quinta-feira (8) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Apesar de perder força, o IPCA voltou a sofrer pressão da alta dos alimentos e ficou acima da mediana das projeções do mercado financeiro. A expectativa de analistas consultados pela agência Bloomberg era de uma variação menor, de 0,34%, no primeiro mês deste ano.
No acumulado de 12 meses, a inflação desacelerou a 4,51% até janeiro, após registrar taxa de 4,62% na divulgação anterior. Analistas esperavam que o IPCA atingisse 4,42%.
ALIMENTOS SOBEM COM EL NIÑO
Dos 9 grupos de produtos e serviços pesquisados, 7 tiveram alta de preços em janeiro. O destaque veio do grupo alimentação e bebidas, cuja inflação acelerou a 1,38%, após registrar 1,11% no mês anterior.
Com o novo resultado, o segmento teve impacto de 0,29 ponto percentual no IPCA o principal da pesquisa. A alta de 1,38% é a maior para alimentação e bebidas, em meses de janeiro, desde 2016 (2,28%).
André Almeida, gerente da pesquisa do IPCA, disse que o aumento reflete os efeitos das temperaturas altas e das chuvas intensas em regiões produtoras.
Esses eventos dificultam o cultivo no campo e reduzem a oferta de parte das mercadorias, especialmente de itens mais voláteis, como hortaliças e frutas. Neste início de ano, o Brasil vive os reflexos do fenômeno climático El Niño.
“Historicamente observamos alta dos preços dos alimentos nos meses de verão, por conta da temperatura mais alta e das chuvas. Neste ano, isso é intensificado pelo fenômeno El Niño”, disse Almeida.
A carestia de alimentação e bebidas foi puxada pela alimentação no domicílio. Os preços dos produtos consumidos em casa aceleraram a 1,81% em janeiro, após taxa de 1,34% em dezembro.
O IBGE destacou os avanços da cenoura (43,85%), da batata-inglesa (29,45%), do feijão-carioca (9,70%), do arroz (6,39%) e das frutas (5,07%).
A batata-inglesa, aliás, teve o maior impacto individual no IPCA do primeiro mês de 2024 (0,07 ponto percentual). O arroz registrou o segundo (0,05 ponto percentual).
Já a alimentação fora do domicílio perdeu força em janeiro (0,25%) na comparação com o mês anterior (0,53%).
PASSAGEM AÉREA ALIVIA IPCA
Ao contrário de alimentação e bebidas, o grupo dos transportes ajudou o IPCA a desacelerar no início de 2024.
Esse segmento registrou queda de 0,65% em janeiro, após alta de 0,48% em dezembro. O impacto no índice foi de -0,14 ponto percentual.
A deflação (baixa) dos transportes foi puxada pela passagem aérea. Os preços do bilhete de avião caíram 15,22% em janeiro, depois da alta de 8,87% em dezembro.
Individualmente, a passagem teve o principal impacto do lado das quedas no IPCA (-0,15 ponto percentual). Almeida associou a redução a uma base de comparação elevada.
Segundo o pesquisador do IBGE, a queda dos preços do querosene de aviação, o QAV, também pode ter contribuído para aliviar as tarifas. A passagem, contudo, ainda acumula alta de 25,48% em 12 meses.
Ainda nos transportes, o IBGE apontou recuo em janeiro nos preços do etanol (-1,55%), do óleo diesel (-1%) e da gasolina (-0,31%). O gás veicular, por outro lado, registrou alta (5,86%).
ANALISTAS VEEM PIORA
Analistas apontam piora na composição do IPCA. Isso, segundo eles, pode dificultar uma aceleração no ritmo de cortes da taxa básica de juros (Selic) pelo BC (Banco Central).
A inflação de serviços, um dos componentes observados pela autoridade monetária, até desacelerou de 0,60% em dezembro para 0,02% em janeiro, sob impacto da queda das passagens aéreas.
Porém, desconsiderando os bilhetes de avião, esse índice teria ficado perto de 0,45% no mês passado, conforme o IBGE.
“A composição do IPCA de janeiro não foi benigna”, diz a economista Claudia Moreno, do C6 Bank.
Para ela, sem o impacto das passagens aéreas, ainda não está claro que a inflação de serviços está, de fato, desacelerando na ponta.
“No final das contas, quem esperava que esse IPCA de janeiro chancelasse uma eventual aceleração do corte de juro para a próxima reunião [do Comitê de Política Monetária do BC] acabou se frustrando”, afirma Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos.
CENTRO DA META E PROJEÇÕES PARA 2024
O centro da meta de inflação perseguida pelo BC é de 3% para o acumulado de 2024. A tolerância é de 1,5 ponto percentual para menos ou para mais. Assim, a meta será cumprida se o IPCA ficar no intervalo de 1,5% (piso) a 4,5% (teto).
Na mediana, projeções do mercado financeiro apontam que o IPCA fechará 2024 em 3,81%, conforme a edição mais recente do boletim Focus, divulgada pelo BC na terça (6). A previsão está abaixo do teto da meta (4,5%).
Segundo analistas, os impactos do El Niño tendem a pressionar os preços dos alimentos ao longo de 2024, o que afetaria principalmente o bolso dos consumidores mais pobres.
Os brasileiros com renda menor destinam uma fatia maior do orçamento, em termos proporcionais, para a compra de comida.
Um sinal disso pode ser observado no INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), que mede a variação dos preços que mais impactam as famílias com rendimento de um a cinco salários-mínimos.
Nesta quinta, o IBGE informou que a inflação medida pelo indicador acelerou a 0,57% em janeiro. Ou seja, a taxa ficou acima do IPCA (0,42%).
Segundo o instituto, os alimentos pesam mais na cesta do INPC do que no cálculo do IPCA, que abrange o consumo de famílias com rendimento maior, de 1 a 40 salários-mínimos.