Alunos que estudam em escolas públicas que tiveram apoio para a gestão administrativa e pedagógica na pandemia, assim como aqueles dos municípios que mais investiram em ações contra a Covid-19 no ambiente escolar, tiveram uma perda acumulada de aprendizado menor do que a média de toda a rede paulista de ensino.
A conclusão é de uma nova pesquisa da Universidade de Zurique (Suíça) feita com dados da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.
O estudo englobou alunos do fundamental 2 (6º ao 9º ano) e do ensino médio, a partir dos boletins escolares e de provas específicas de português e de matemática. O objetivo foi mapear as consequências, em médio prazo, do fechamento escolar tanto para o aprendizado quanto para o risco da evasão.
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Para avaliar o impacto de apoio à gestão administrativa e pedagógicas nas escolas, os pesquisadores fizeram um recorte com dados de alunos que estão nos bairros das diretorias de ensino Sul 1 e Sul 2. Ambas estão localizadas na cidade de São Paulo, em regiões socioeconomicamente vulneráveis, como Capão Redondo, Paraisópolis e Jardim ngela.
As duas diretorias de ensino contaram, desde o início da pandemia, com o apoio dos Parceiros da Educação, uma Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), parceira de instituições como Todos pela Educação, Itaú Social, Fundação Lemann e Instituto Península.
O programa de apoio consistiu no apoio à implementação de um plano para a gestão das escolas e para a formação pedagógica, além de ações pontuais, como doação de tablets e melhoria na conectividade das escolas.
Os estudantes dessas regiões tiveram, ao final de 2021, uma perda acumulada de aprendizado de 45%, contra 55% da média de toda a rede paulista de ensino. Em português, especificamente, a perda acumulada dos alunos das diretorias Sul 1 e Sul 2 foi de 33%, contra 42% da média geral.
A pesquisa também detectou um melhor resultado dos estudantes dos municípios paulistas que mais investiram em ações contra a contaminação de Covid-19 nas escolas, de acordo com dados registrados no Censo Escolar de 2021. As iniciativas consideradas pelo estudo são, entre outras, reforma do prédio, treinamento de professores, uso de equipamentos de segurança (como máscara e álcool gel), aprimoramento da limpeza dos ambientes, entre outras.
Os estudantes dos municípios que mais implementaram ações contra a contaminação no ambiente escolar registraram, ao final de 2021, uma perda acumulada de aprendizado de 48%, contra 55% da média dos alunos da rede paulista de ensino. Já os das escolas de cidades que menos investiram nessas iniciativas tiveram perda de 60%, maior, portanto, do que a média do estado.
As perdas mensuradas pela pesquisa não representam um retrocesso, mas a diferença entre o aprendizado esperado para o período, em uma situação normal, e aquilo que de fato os estudantes aprenderam na pandemia. Os dados consideram os resultados de provas diagnósticas (que medem se a aprendizagem está ou não avançando), aplicadas na rede paulista pelo Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora.
As ações das escolas contra a Covid-19 também reduziram significativamente o risco de evasão. Enquanto, na média, no final de 2021, 31% dos estudantes da rede pública paulista corriam um alto risco de abandono escolar, dentre aqueles de municípios que mais investiram em ações contra a Covid-19 nas escolas o número caiu para 18%. Em contraposição, subiu para 37% dentre os das cidades que menos investiram na prevenção no ambiente escolar.
“Os resultados deixam claro que as políticas nas escolas fazem diferença significativa para a recuperação das perdas de aprendizado acumuladas na pandemia,” afirma Guilherme Lichand, professor da cátedra Unicef de economia do desenvolvimento e bem-estar infantil da Universidade de Zurique e doutor em política econômica e de governo pela Universidade Harvard, responsável pelo estudo, em coautoria com Carlos Alberto Doria.
Como em 2021 as aulas foram retomadas parcialmente, com revezamento de alunos, e eram suspensas quando havia casos de contaminação, as políticas de prevenção podem ter colaborado para que as escolas tenham tido mais tempo de atividades presenciais e, dessa forma, para que o desempenho dos alunos tenha sido melhor.
Além disso, as cidades que investiram mais em ações contra a Covid-19 nas escolas tendem a ter melhor estrutura de educação.
Na pesquisa, o risco de abandono escolar é medido pela quantidade de alunos que estão sem notas de português e da matemática nos boletins. Os pesquisadores observaram, em anos anteriores, qual era o número de estudantes sem essas notas e qual foi a evasão.
Historicamente, a evasão no Brasil gira em torno de 10%, e, com o fechamento escolar, o risco mais do que triplicou, batendo em 35% em 2020 e em 31% em 2021. Como base de comparação, em 2019, antes, portanto, da pandemia, 1,7% dos alunos do Estado de São Paulo não tinham notas de português e de matemática no boletim. Em 2020, o número saltou para 7,9% e em 2021, baixou pouco, mas era ainda 7,5%.
Esse estudo é o terceiro de uma série conduzida pelos pesquisadores brasileiros na Universidade de Zurique, com base em dados oficiais de São Paulo.
Sobre os resultados da pesquisa, o secretário estadual de educação de São Paulo, Hubert Alquéres, afirmou que “foram adotadas diferentes medidas e efetivadas parcerias com o objetivo de incentivar a recuperação e combater a evasão escolar”.
Segundo o secretário, o Centro de Mídias, criado na pandemia para o ensino a distância, está sendo utilizado, desde o retorno presencial, para “mitigar o impacto” do fechamento das escolas, com atividades de recuperação dos alunos e também para a formação dos professores. “A própria pesquisa da Universidade de Zurique aponta avanços em 2021. Entendemos que o processo de recuperação dessas perdas deva ser permanente e estamos trabalhando para garantir aos estudantes condições para recompor as perdas e avançar na aprendizagem.”